JUNHO DE 2016

Cooperação por concurso

1. No decurso da história da Pátria, antes do mais, a solidariedade social sempre foi a expressão de um dever e de uma vocação da sociedade e das suas organizações. Uma prática multissecular que lhes conferiu uma competência e uma ciência que não têm concorrentes e que se consolidou numa proteção social direta assegurada por uma rede de entidades e instituições de natureza particular, fora do perímetro do Estado ou de outras entidades públicas e concretizada pela entidade mais próxima, numa escala territorial, e pelos corpos intermédios, antes da esfera pública, no que respeita à natureza das organizações.

Quando o Estado "despertou" para a proteção social direta já ela vinha sendo assumida pela comunidade que, fazendo como sua aventura a sorte do seu próximo, no exercício da cidadania, se foi organizando na proximidade e na subsidiariedade, ancorando caridade, gratuitidade e solidariedade, com inovação, envolvência e opção preferencial pelos mais carenciados.

Ao acordar para a proteção social direta, o Estado poderia nacionalizar as muitas expressões e equipamentos já então existentes mas não o fez porque tal seria frustrar uma das caraterísticas de excelência da comunidade nacional. Preferiu valorizar a expressão e a vocação da sociedade e das suas organizações e, com os meios ao seu dispor, assumiu as suas competências de apoiar, regular, suprir e universalizar.

Nesse sentido, por sua iniciativa ou correspondendo ao que lhe era solicitado, confiou algo do pouco que desenvolvia ao Sector Solidário, multiplicou acordos de cooperação, típicos e atípicos, promoveu concursos para novas respostas sociais e para o alargamento e a beneficiação da rede de equipamentos sociais e celebrou um Pacto de Cooperação para a Solidariedade Social.

Hoje, por direito próprio, em colaboração com os serviços públicos, essa rede integra o sistema nacional de proteção social, constituindo uma componente essencial do Estado Social.

2. O Setor Social Solidário não só foi crescendo exponencialmente em número de Instituições constituídas (em atividade são perto de 5.000), como, pela sua distribuição por todo o território e junto das comunidades em que estão inseridas, passou a assumir uma importância social e económica de elevado relevo. Prestando serviço público, as Instituições atuam à maneira de empresas sociais em que o lucro é o crescimento integral das pessoas que são os seus utentes. O Sector está implantado, organizado e solidificado. E é responsável por 67% dos equipamentos com respostas sociais.

São associações, cooperativas, fundações ou mutualidades de solidariedade social, centros sociais paroquiais, institutos de organização religiosa ou misericórdias, com respostas para acolhimento institucional para crianças e jovens em perigo, de alojamento social de emergência, cantinas sociais, casas abrigo, centros (de acolhimento, de convívio, de dia e de noite para pessoas idosas, de apoio à vida e a toxicodependentes, de apoio familiar e aconselhamento parental, comunitários e protocolares, de atividades ocupacionais e de tempos livres), creches, cuidados continuados integrados, jardins de infância, lares (de infância, juventude ou pessoas idosas), serviços de apoio domiciliário... Na área da deficiência, por exemplo, quase tudo o que se faz entre nós, que é muito e é muito bom, é da responsabilidade direta destas Instituições.

São organizações de uma comunidade que se envolve e não se desmobiliza e que, nos momentos de crise, se comporta de uma forma expansionista e em contraciclo, se comparada com os outros sectores tradicionais da economia e com outras sociedades. São economia das pessoas e para as pessoas, com abordagem mais humanista, mais próxima e mais benéfica para os cidadãos, sobretudo, os que vivem situações de maior fragilidade social. Também muito menos dispendiosa para o Estado.

3. Sustentar políticas que visem o combate à pobreza e um melhor futuro para todos e a promoção da igualdade de oportunidades e da plena cidadania é competência inalienável de um Estado que se quer Social.

Seria suicidária a inversão do caminho percorrido na Cooperação. Nem isso é tão-pouco equacionado.

Mas, hoje e sempre, haverá possibilidades de aplanar caminhos e endireitar veredas. O presente exige estabilidade e previsibilidade pelo que, na promoção do bem comum, os acordos já celebrados entre o Estado e as Instituições, eventualmente reajustados, jamais poderão ser postos em causa. E porque o futuro da pessoa toda e de todas as pessoas desafia sempre respostas inovadoras certamente novos acordos típicos e atípicos serão celebrados correspondendo ao engenho e à arte das Instituições e dos inovadores.

Mas nunca o Estado se poderá demitir da sua função de sustentar políticas sociais e de universalizar direitos para que ninguém se conforme a ficar para trás. Pelo que, na fidelidade ao Pacto de Cooperação, o Estado deverá assumir a tarefa de promover concursos para requalificar o que urge ser requalificado, para implementar novos serviços ou novas medidas ou para alargar territorialmente respostas sociais. Ultrapassando conjunturas de afetos, ideologias ou concentrações. E acautelando e respeitando sempre a capilaridade, a proximidade, a sustentabilidade e os recursos das Instituições de Solidariedade.

Lino Maia, presidente da CNIS

 

 

Data de introdução: 2016-06-12



















editorial

O COMPROMISSO DE COOPERAÇÃO: SAÚDE

De acordo com o previsto no Compromisso de Cooperação para o Setor Social e Solidário, o Ministério da Saúde “garante que os profissionais de saúde dos agrupamentos de centros de saúde asseguram a...

Não há inqueritos válidos.

opinião

EUGÉNIO FONSECA

Imigração e desenvolvimento
As migrações não são um fenómeno novo na história global, assim como na do nosso país, desde os seus primórdios. Nem sequer se trata de uma realidade...

opinião

PAULO PEDROSO, SOCIÓLOGO, EX-MINISTRO DO TRABALHO E SOLIDARIEDADE

Portugal está sem Estratégia para a Integração da Comunidade Cigana
No mês de junho Portugal foi visitado por uma delegação da Comissão Europeia contra o Racismo e a Intolerância do Conselho da Europa, que se debruçou, sobre a...