Sandra Semedo conquistou uma medalha de ouro e outra prata no Campeonato do Mundo de Tricicleta, que se disputou, no mês de julho, na Dinamarca. A triciclista da Associação de Paralisia Cerebral de Coimbra (APCC) é agora campeã mundial da categoria RR2 nos 400 metros e vice-campeã nos 200, tendo ainda obtido um ótimo quarto lugar nos 100 metros, tendo ficado a escassos centésimos de segundo do pódio.
A atleta Sandra Semedo, de 29 anos, junta, assim, estas duas medalhas às três já conquistadas no ano passado na Taça do Mundo de Tricicleta (designação anterior da competição), confirmando-se como um dos grandes nomes desta modalidade a nível mundial. A atleta da APCC é ainda a atual campeã de Portugal de todas as distâncias da sua categoria e detentora de sete recordes portugueses nas classes RR2 e RR3.
Na opinião de Ana Nunes, treinadora de todos os triciclistas da APCC e selecionadora nacional da modalidade, Sandra Semedo “é um caso de exceção” e explica: “Nós vamos lá fora e competimos com atletas extraordinários, mas são atletas que têm as condições todas e têm tricicletas topo de gama. Nós treinamos com tricicletas do primeiro modelo que surgiu no mercado. Aliás, no ano passado ficou toda a gente espantada porque ainda competíamos com tricicletas daquelas. Mesmo não tendo aquelas condições, mesmo com uma tricicleta das antigas, ela consegue resultados. As pessoas diziam-me lá na Dinamarca que se com aquela tricicleta ela tem os resultados que tem, com uma atual ganhava tudo”.
O objetivo de Sandra é “chegar mais longe e continuar a trazer medalhas para Portugal e para a APCC”, recordando que, mais esta ida à Dinamarca “foi uma experiência boa” e que “algumas das adversárias eram muito fortes”.
Foi em 2012 que a relação de Sandra Semedo com a tricicleta começou, algo que até ali ela desconhecia.
“Foi em 2012 que me perguntaram se eu queria experimentar a tricicleta e eu disse que sim. Comecei por fazer uns treinos e depois participei em uma prova em Lisboa”, recorda, acrescentando: “Nunca tinha visto uma tricicleta e quando me perguntaram se eu queria experimentar eu disse que sim”.
Apesar de ter começado a praticar a modalidade em 2012, a atleta apenas em 2015 conseguiu a nacionalidade portuguesa.
“Por causa disso é que só no ano passado fomos a primeira vez à Dinamarca e, a partir de agora, em princípio, será sempre a somar”, sustenta Ana Nunes, que recorda o percurso da atleta da APCC: “A Sandra quando começou fê-lo pela classe RR3 (Race Runner 3) e não havia em Portugal mais ninguém nessa classe, ou seja, ela tinha que correr com os da classe RR2, quando havia provas, por ser a única da classe RR3”.
Para se poder participar nas competições internacionais há uma classificação médica e, em 2016, Sandra Semedo desceu de classe, passando para RR2, ou seja, passou para a classe em que estão todos os demais atletas portugueses.
“Para nós é bom, porque é uma classe mais baixa, o que para ela é melhor, porque as atletas da RR3 são muito mais rápidas do que a ela e, como este ano foi novamente classificada em RR2, passa a ficar nesta classe de forma definitiva”, revela a treinadora, satisfeita ainda por assim a sua atleta, a nível interno, passar a disputar provas na mesma classe dos demais atletas.
A Taça do Mundo passou a Campeonato do Mundo, mas a competição é a mesma e tem periodicidade anual. Em 2018 haverá também os Jogos Mundiais, em Barcelona, e uma dúvida paira no ar: “Ainda não sabemos se vamos participar nas duas competições, porque em termos financeiros ainda não sabemos qual é a situação, mas à partida, se nos deixarem, vamos às duas”.
A dúvida subsiste, até porque quem suporta todos os custos é a PCAND – Paralisia Cerebral Associação Nacional de Desporto.
Em termos de preparação, Ana Nunes deixa grandes elogios a Sandra Semedo, que treina três vezes por semana, aproximadamente uma hora e meia por dia. No entanto, sempre que a treinadora acha necessário, o treino é complementado com trabalho de ginásio e reforço muscular.
Mas nem tudo são rosas no dia-a-dia desportivo desta atleta que só sabe ganhar.
“Ela treina comigo, mas eu não sou treinadora exclusiva da tricicleta, portanto tenho que dar resposta a outras modalidades que temos na casa”, explica Ana Nunes, que indica ainda um outro grande obstáculo à preparação da campeã do Mundo: “O que se passa é que na APCC só temos duas tricicletas, o que limita muito, pois só posso treinar, em simultâneo, dois atletas. Isso reduz o tempo de treino de alguns, embora nem todos tenham as capacidades da Sandra. Para ela, em termos competitivos, é mais complicado, porque nunca tem alguém no treino que lhe faça frente. Sempre que temos uma prova em Lisboa, que é uma vez por ano, ou em Coimbra, que agora realizamos sempre uma em Novembro, são as alturas em que consigo compará-la com outros atletas e ver um pouco como estamos na modalidade aqui em Portugal”.
A selecionadora nacional constata que “a Dinamarca é um mundo à parte”, porque “eles têm tricicletas fantásticas e depois usam a tricicleta como meio de transporte diário, o que facilita a preparação, pois estão sempre a treinar”.
Pouco faladora, Sandra Semedo sempre vai dizendo que “competir é muito bom” e que na pista tem “sensações boas”.
Já para a treinadora, “a competição é fundamental, porque andar a treinar é ótimo, mas correr ao lado de pessoas que correm tanto ou mais do que nós é fundamental, pois só assim se consegue avaliar onde se consegue melhorar”.
E a verdade é que após este último Campeonato do Mundo, Sandra vai experimentar outras distâncias, que Ana Nunes considera serem mais apropriadas para a atleta.
“Depois destas competições, apercebemo-nos que devemos apostar noutro tipo de provas, porque estávamos a apostar em provas curtas e já reparámos que não dá, porque as adversárias são muito mais rápidas do que a Sandra”, sustenta, revelando: “Deu para ver que temos que apostar nas provas longas, porque em termos de resistência a Sandra é muito forte. Ela é capaz de estar meia-hora a rolar na pista, mas em termos de velocidade e de arranque as outras ganham-lhe facilmente”.
Em tricicleta as distâncias de competição são os 100, 200, 400, 800, 1.500 e 5.000 metros e, apesar de em Portugal, até à data, só haver provas até aos 800 metros, “a partir de Setembro, a Sandra vai começar a treinar para os 800, 1.500 e 5.000 metros e logo se vê”.
Esta aposta é ainda consubstanciada no que a treinadora observou na Dinamarca: “Nas provas de 1.500 e 5.000 metros da classe da Sandra só estavam duas atletas e até houve um recorde do Mundo nos 1.500 metros. Penso que é um tempo alcançável por ela. Vamos treinar e vamos ver como corre”.
Incansável no treino e senhora de uma capacidade fora do comum, Sandra “nunca se sente cansada”, diz a treinadora: “Quando por vezes treinamos 800 metros e acho que o tempo foi mau, ela quer repetir. Ou seja, ela faz as vezes que eu quiser até gostar do resultado. E isto não é para todos, porque há atletas que fazem 200 metros e, de seguida, não conseguem correr outra vez e melhorar o tempo. No caso da Sandra é rara a vez em que ela me diz que está cansada, mesmo no final dos treinos”.
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