O TECTO, VILA DO CONDE

Na primeira linha para resolver problemas

A génese de O Tecto – Associação de Solidariedade Social, sediada em Fajozes, Vila do Conde, está num grupo de reflexão bíblica formado ainda antes da Revolução de 1974, sob a égide do padre Torres Maia. No entanto, é com o 25 de Abril e todo aquele espírito voluntarista de mudar o País que nasce a instituição, inicialmente designada Promoção – Cooperativa de Desenvolvimento Cultural e Social.
“É, de facto, um filho daquela vontade imensa que invadiu as pessoas por altura do 25 de Abril de 1974”, recorda Conceição Costa, directora de Acção Social e co-fundadora da instituição.
Apesar do início de actividade da, então, cooperativa ter sido pela vertente cultural, “já pressupunha a vertente social”, refere Amorim Costa, presidente e também co-fundador d’O Tecto.
“Quando nasceu O Tecto não existia nada em Vila do Conde, a não ser um pequeno asilo no monte, que hoje é uma grande instituição, a Ordem Terceira de S. Francisco. Nascemos precisamente por isso. Os pais não tinham onde colocar os filhos e não havia nada relacionado com a acção social no concelho. O Tecto nasceu do nada porque também não havia nada”, explica Amorim Costa.
O arranque do trabalho social acontece com um jardim-de-infância, a grande necessidade da altura, até porque a sociedade portuguesa estava em plena mudança e era preciso dar resposta às necessidades emergentes, como refere a directora de Acção Social: “É um novo contexto em que as mulheres começam a trabalhar, deixam de ser domésticas, por todas as razões, fossem económicas ou outras, mas também por uma questão de libertação do doméstico como única forma de vida”.
Foi numa escola desactivada e cedida à instituição que o infantário funcionou inicialmente, mas os obstáculos que surgiram acabaram por ditar o futuro da cooperativa.
“Após um incêndio no antigo edifício da escola que nos tinha sido cedido, a Cooperativa quase se extinguiu, permanecendo apenas o infantário. Entretanto, foi-nos cedida, por uma agricultor da terra, uma casa velhinha, onde passou a funcionar o jardim-de-infância, e onde estivemos durante mais alguns anos”, recorda Amorim Costa, que lembra ainda que “a Câmara de Vila do Conde já havia, entretanto, cedido um pequeno terreno”.

ALARGAMENTO AOS IDOSOS

É nesta altura que a ambição de crescer e servir mais pessoas começa a fervilhar entre os dirigentes d’O Tecto.
“Pedimos mais terreno à autarquia e foi quando a Associação passou a sonhar em ter todas as valências. Embora durante muito tempo nos tenhamos dedicado mais à área da infância”, sustenta o presidente.
Mas a abertura de valências que cobrissem também a área da terceira idade foi uma vontade que cedo se começou a manifestar.
“Como o País, de uma forma em geral, O Tecto foi tentando encontrar respostas mais sólidas e viu-se que as respostas sociais que tinham uma grande premência eram as da infância, daí a nossa primeira valência ter sido a de jardim-de-infância”, recorda Conceição Costa, acrescentando: “Foi um jardim-de-infância que pusemos a funcionar, como na altura se faziam as coisas, com muito boa vontade… Mas isto ou acabava ou entrava num caminho de estruturar coisas sólidas… Entretanto, fizemos acordo com a Segurança Social e nesse pequeno terreno que tínhamos construímos um equipamento, onde instalámos o jardim-de-infância e o ATL, que depois cresceu ao mesmo tempo que a Câmara nos cedeu mais terreno. Foi, então, que construímos o edifício que hoje aqui temos, corria o ano de 1991”.
Com o jardim-de-infância em funcionamento no novo edifício, a casa onde antes este funcionava serviu para dar corpo a outro anseio da instituição, prestar serviço na área da terceira idade.
“Nessa altura já tínhamos outros interesses e vontade de criar respostas ao nível da terceira idade. E não tendo forma nenhuma para avançar, tínhamos apenas uma casa pequenina que não respondia às necessidades, pelo que começámos por ter aqui numa parte do edifício o Centro de Dia e a colocámos também em funcionamento o Apoio Domiciliário. Passado um tempo, criámos um Clube Sénior, que hoje tem grande expressão, e que desde essa altura tem vindo a crescer de uma forma enorme e que hoje é já uma Universidade Sénior”, conta Conceição Costa.
A esta altura já O Tecto era um exemplo para muitos, segundo os seus dirigentes, com Amorim Costa a sublinhar: “Quando aparecemos não havia nada, mas depois surgiram outras instituições, de certa forma, a tentar imitar O Tecto. Até havia muitos presidentes de Junta que colocavam nas suas promessas eleitorais fazer um Tecto na sua freguesia”.

AVALIAR AS NECESSIDADES

Importante para esta visibilidade e para que outros olhassem O Tecto como uma referência foi, segundo Conceição Costa, a forma como a instituição sempre abordou a comunidade e as suas necessidades: “O Tecto, porque teve sempre alguém com formação na área social, nunca viu este trabalho como o eu quero e eu gosto, mas sempre em resultado de avaliar o que existia na comunidade e quais as necessidades. Desde o princípio, a instituição fez uma abordagem da comunidade a fim de saber o que em determinado momento é importante e o que depois deixa de o ser. Lembro um presidente de Junta que, em sede da Rede Social, dizia querer desesperadamente uma creche na freguesia dele, mas onde não existia nenhuma criança em idade de creche”.
A este propósito, o presidente da instituição é peremptório: “Em minha opinião, a CNIS deve ter um papel pedagógico, porque muitas vezes, dentro da Confederação, incentiva-se e apoia-se o aparecimento de instituições que depois vão ter problemas. Tal como o padre Lino Maia disse na Feira Social de Vila do Conde, «há instituições que têm muros que precisam de ser derrubados para se abrirem aos outros». O que neste momento acontece é que, em vez de haver cooperação, está a haver muita competição por uma questão de sobrevivência. Quando O Tecto nasceu não havia nada, mas hoje acontece muito surgirem instituições ao lado umas das outras o que faz com que estejam a pescar nas águas umas das outras. É bom que haja liberdade de as pessoas escolherem, mas no momento que vivemos, com esta crise profunda, o que acontece é que há instituições a fechar”.
Em Março do ano passado, O Tecto inaugurou um novo edifício, sonho antigo, onde congregou todas as respostas para a terceira idade, incluindo uma Estrutura Residencial para Idosos, onde actualmente vivem 42 utentes, apesar de o Acordo de Cooperação contemplar apenas 10.
“Temos apenas Acordo para 10, porque era o que já tínhamos na antiga residência”, explica Conceição Costa, que no entanto se mostra esperançada em conseguir a qualquer momento alargar esse Acordo: “Temos expectativas em celebrá-lo, porque demos a volta à situação e não abrimos a casa com um funcionamento privado, mas tivemos que fazer contas. O diferencial entre a pensão do idosos e o custo real é pago pelas famílias e temos a casa cheia. Não estamos a explorar ninguém, porque estamos a cobrar praticamente o mesmo que as instituições aqui do meio e que têm Acordo de Cooperação. Algumas até cobravam mais e desceram os preços quando nós abrimos a Casa dos Girassóis”.
A abertura do lar era um desejo antigo, como refere o presidente da instituição: “Já sentíamos esta necessidade de criar um equipamento para a terceira idade de raiz há mais de 15 anos. Nessa altura já tínhamos um projecto na Segurança Social com o qual concorríamos permanentemente, mas cuja resposta era sempre a de que não havia dinheiro”.
Actualmente, na área da terceira idade, para além dos 42 utentes em lar, a instituição recebe mais 35 em Centro de Dia, presta ajuda a 38 através do Serviço de Apoio Domiciliário e no âmbito do Clube Sénior tem um universo de 600 idosos integrados. A nível de infância, 47 bebés frequentam a creche, 80 meninos o pré-escolar e 39 crianças o ATL. Para além disto, O Tecto presta apoio a 50 famílias ao abrigo do CAFAP, apoia 180 pessoas ao nível do RSI e tem cinco pessoas integradas na empresa de inserção criada em 1999, mas que actualmente está em fase de extinção. O apoio a todo este universo de utentes é prestado por uma equipa de 90 colaboradores.

HORTA MULTI-SENSORIAL

Numa fase em que não é possível fazer grandes investimentos em novos projectos, O Tecto, fruto de um prémio ganho no universo EDP e com alguns dos fundos angariados numa iniciativa recente, quer criar uma sala e uma horta multi-sensorial, “algo muito importante para as pessoas que sofrem de doença de Alzheimer e outras demências”, explica Amorim Costa, que revela ainda que “cerca de 70% das pessoas em lar já sofrem de demências”.
Para além disto, “há um outro projecto que ainda não está bem estruturado, mas é um sonho antigo, que é o de criar um espaço privado em Vila do Conde, no âmbito da Universidade Sénior, que terá também uma área de luxo, para quem pode pagar”, refere o presidente, pormenorizando: “Isto tem também o intuito de conseguir receitas para esta parte social”.
Para Conceição Costa a missão d’O Tecto é simples: “Costumo dizer que somos um movimento social, muito mais do que uma instituição de solidariedade social. O que queremos dizer é que somos a primeira linha de uma comunidade que quer organizar-se para resolver problemas”.

Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)

 

Data de introdução: 2014-06-26



















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