UNICEF

Crianças portugueses reconhecem dificuldades dos pais em comprar bens essenciais

Crianças portugueses inquiridas num estudo da Unicef reconhecem as dificuldades dos pais em comprar carne, peixe e iogurtes e em pagar as contas da casa devido à crise económica que o país atravessa.

O estudo, que foi realizado entre março e maio de 2013, e envolveu 77 crianças e adolescentes com idades entre os oito e os 17 anos, pretendeu analisar o modo como as crianças observam a atual crise e sentem o seu impacto no dia-a-dia. "As crianças consideram que os adultos estão pressionados pelo trabalho ou pela falta dele e falam das dificuldades em assegurar o consumo de bens essenciais", refere o estudo, que integra o primeiro relatório publicado do Comité Português para a Unicef "As Crianças e a Crise em Portugal -- Vozes de Crianças, Políticas Públicas e Indicadores Sociais, 2013", que analisa a realidade desta população em Portugal num contexto de crise.

Segundo o estudo, as crianças de famílias menos afetadas pela crise apontam estratégias de racionalização de gastos, como não comprar a mais, comprar marcas brancas, ir menos a restaurantes ou reduzir os presentes no Natal, e têm maior consciência sobre a necessidade de contenção relativamente e de poupança.

Já as crianças de famílias em situação de vulnerabilidade económica referem cortes significativos no consumo de alguns alimentos essenciais como carne, peixe e iogurtes, cortes em vestuário e calçado, assim como mudanças de casa, cortes nas atividades extracurriculares e mais dificuldades para pagar as contas.

Quando questionadas sobre o que desejam para si ou para a sua família no futuro um número significativo de crianças e adolescentes referem um emprego estável e "um rendimento que lhes permita viver mais desafogados e ter saúde e bem-estar".

Salientam também o papel dos avós, que algumas vezes ajudam os pais financeiramente. Contudo, o estudo observa que "a geração dos avós está a ter mais dificuldade em assegurar o apoio às gerações mais novas devido a problemas económicos".

O relatório sublinha que "o aumento das desigualdades sociais e diminuição da qualidade de vida tem tido consequências muito significativas no bem-estar e no gozo efetivo dos direitos das crianças que vivem em Portugal".

"As crianças e adolescentes que deram o seu contributo para este estudo consideram que Portugal é hoje um Estado pobre, desigual e injusto e partilham descrédito pela política e pelos políticos", salienta.

A Unicef afirma que é "neste clima de incerteza e instabilidade que as crianças constroem valores sociais, como solidariedade e respeito, e criam perceções sobre o país, o Estado e o mundo".

As crianças manifestaram-se "claramente sensíveis" às questões da igualdade e justiça sociais e sugerem que "para vencer a crise é preciso mudança".

Para a Unicef, é preciso ouvir a voz das crianças e a suas opiniões sobre os problemas que as afetam. "Além de ser um direito, e como tal uma obrigação da sociedade e de todos os seus agentes, constitui um elemento indispensável quando analisamos a sua situação e o contexto em que vivem. Se, de facto, queremos conhecer as crianças que vivem em Portugal, não podemos prescindir de ouvir as suas opiniões", defende no documento.

Alguns dos dados mais relevantes:

• O risco de pobreza é mais elevado em famílias com filhos, nomeadamente, em famílias numerosas (31%) e em famílias monoparentais (41,2%).

• Entre Outubro de 2010 e Junho de 2013, o número de casais desempregados inscritos no Centro de Emprego aumentou de 1.530 para 12.065 (cerca de 688%).

• Em 2012, cerca de uma em cada quarto crianças em Portugal (24%) vivia em agregados com privação material (i.e. famílias com dificuldade ou incapacidade de pagar um empréstimo, renda de casa, contas no prazo previsto; ter uma refeição de carne ou peixe a cada dois dias; fazer face a despesas imprevistas).

• 546.354 crianças perderam o direito ao Abono de Família entre 2009 e 2012. O acesso a esta prestação tornou-se mais restrito e os montantes atribuídos por criança diminuíram.

• Entre 2010 e 2013, registou-se uma redução no apoio económico do Estado às famílias, que em 2009 era já inferior à média dos países da OCDE (1.71% e 2.61% do PIB respectivamente), e um aumento dos impostos. 

 

Data de introdução: 2014-11-06



















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