Portugal atravessa um momento de grande dificuldade económica e social. Todos os economistas, grupos sociais e patronais são unânimes em relação à gravidade da situação. O país "bateu no fundo" e ninguém pode ficar indiferente. O desemprego, a pobreza, a exclusão social aí estão, alastrando assustadoramente.
De um momento para o outro, milhares de trabalhadores vêem-se sem emprego, assistindo, sem qualquer poder de decisão ou de intervenção, ao encerramento ou falência das empresas, perdendo o seu posto de trabalho, não antevendo no horizonte a hipótese de outro emprego. Por isso, não é para admirar que o desespero, o medo pelo dia de amanhã se apodere, especialmente, dos mais fracos e desprotegidos, não sabendo como ganhar o pão de cada dia para as suas famílias ou satisfazer os seus próprios compromissos.
O fosso entre ricos e pobres é cada vez maior. Nós próprios, nas nossas instituições de solidariedade, damo-nos conta, diariamente, e de que maneira, do momento difícil que as famílias vivem. Constantemente somos abordados por aqueles que vêm pedir a nossa ajuda, compreensão e solidariedade. Vários são os nossos utentes que se deixam atrasar nas suas comparticipações ou que nos dizem não poder contribuir com o que foi previamente estabelecido por não terem condições económicas para o fazer. Como foi possível que o país chegasse a este estado?!
Todos estamos conscientes que, para sairmos desta situação, é preciso enfrentar e resolver os grandes e graves problemas da justiça, da saúde, da educação, da reforma da administração pública, do desemprego, da pobreza e exclusão social, da agricultura, do défice das contas públicas, etc., etc.. E já que se fala de reformas públicas coloque-se na linha de partida a redução ou eliminação de muita burocracia, com os seus excessos de exigências, formalismos e requisitos, esse cancro nacional que destrói grande parte das iniciativas, empreendimentos e impede a criação de novos projectos e empresas. Vivemos no reino dos papéis e no santuário das "quintas".
Para muita gente, que tem de decidir, parece que o objectivo principal e único é criar dificuldades e levantar problemas. Sem esta alteração fundamental na mentalidade e comportamento das pessoas e serviços públicos não há reforma possível que se possa concretizar.
Portugal acaba de tomar conhecimento do défice orçamental de 6,83 por cento previsto para o ano de 2005, esse "número maldito", como alguém lhe chamou, e das medidas excepcionais apresentadas pelo primeiro- -ministro, José Sócrates, ao Parlamento, destinadas a reduzi-lo. Estejamos de acordo ou não, estas medidas revelam grande coragem do primeiro-ministro e, não sendo de modo algum agradáveis, elas são necessárias. A continuarmos este plano inclinado das contas públicas, o país cairia no caos económico e social e no descrédito internacional. Todos vamos ser sujeitos a grandes sacrifícios, mas esperamos que, nesta emergência, os pobres e os excluídos não sejam esquecidos ou abandonados à sua sorte.
A fome vem estendendo progressivamente os seus tentáculos e a pobreza envergonhada já se faz sentir e vai aumentar. É preciso que estejamos atentos ao que se passa em nossa volta. É nestes momentos que se revela a nossa real solidariedade, em que mais nos sentimos "próximos" do nosso "próximo". São necessárias, sem dúvida, reformas sociais e que a luta contra a pobreza e exclusão social estejam no centro da preocupação e das políticas deste Governo.
Este vai ser um período muito difícil para as instituições de solidariedade, em que, mais do que nunca, vamos ser chamados e procurados pelas populações. É necessário estarmos juntos como membros da CNIS. Se é verdade que "a união faz a força" é chegada a hora de, independentemente da autonomia de cada instituição, juntarmos esforços e colaborarmos em defesa dos princípios da solidariedade, da justiça social e dos direitos dos cidadãos, sobretudo, dos pobres, dos excluídos e dos sem voz.
* Membro do Conselho Directivo da CNIS
Data de introdução: 2005-06-23