A Plataforma de Apoio aos Refugiados (PAR) nasceu há cerca de um mês, com dois grandes objetivos: acolher e integrar famílias de refugiados em Portugal (PAR Famílias) e apoiar refugiados que ainda estão na Síria ou em países vizinhos (PAR Linha-da-Frente).
Relativamente ao PAR Famílias, a iniciativa conta já com 125 instituições anfitriãs, entre IPSS, paróquias, associações cívicas, escolas e até empresas, numa demonstração de “generosidade que está espalhada por todo o País”, que se ofereceram para acolher uma família de refugiados durante dois anos. A PAR vai constituir um Secretariado Técnico que acompanhará todas as instituições do PAR Famílias, durante todo o período de acolhimento.
Dia 14 de Outubro serão assinados os primeiros protocolos com as primeiras instituições anfitriãs que acolherão o primeiro grupo de famílias que chegará até final do mês.
O SOLIDARIEDADE falou com Rui Marques, presidente do Instituto Padre António Vieira e mentor e grande impulsionador da PAR, no sentido de melhor perceber o processo de acolhimento e integração dos refugiados.
Já quanto ao PAR Linha-da-Frente, a iniciativa foi para o terreno nos últimos dias de Setembro e pretende a angariação de fundos para entregar à Cáritas Internacional e ao Serviço Jesuíta aos Refugiados que trabalham diretamente com os refugiados na Síria e nos países vizinhos onde muitos estão deslocados.
Rui Marques recorda que a melhor forma de ajudar é através do Multibanco (Transferências>Ser Solidário>PAR Linha-da-Frente), mas haverá vários espetáculos (por exemplo, dia 18 de Outubro, «Música por uma Causa», na Fundação Calouste Gulbenkian e outros meios) e também linhas de valor acrescentado, entre outras medidas.
SOLIDARIEDADE – A Plataforma de Apoio aos Refugiados foi constituída há cerca de um mês que balanço é possível fazer neste momento?
RUI MARQUES – Creio que é um balanço muito positivo. Em um mês foi possível a sociedade civil, através das suas organizações, montar uma rede colaborativa que permite dar resposta, com um modelo concreto, ao acolhimento e integração dos refugiados, que é o PAR Famílias, fazendo a associação entre uma família de refugiados que é acolhida durante dois anos por uma instituição anfitriã, que, por sua vez, mobiliza na comunidade os recursos necessários para acolher essa família. Por outro lado, através da iniciativa PAR Linha-da-frente, em que se está a desenvolver uma campanha de recolha de fundos para os refugiados que estão na linha-da-frente, no Líbano, na Jordânia, na Turquia e na própria Síria. Além disso, uma terceira dimensão do trabalho da Plataforma, e que tem sido muito relevante, é a mobilização da opinião pública para uma atitude de acolhimento e integração dos refugiados. Creio que o balanço é francamente positivo e mostra, com as 160 organizações aderentes, há um mês eram 30, como a sociedade portuguesa está mobilizada. Há muito caminho ainda a percorrer, mas o balanço é para já muito positivo.
Referiu 160 organizações que já aderiram à PAR, que tipo de entidades são?
Há um peso importante, que quero saudar, das Instituições Particulares de Solidariedade Social, não é por acaso que a CNIS é um dos principais parceiros da Plataforma, mas também outras tipologias, desde escolas a empresas a paróquias, instituições muito diversas que representam realidades muito distintas da sociedade portuguesa. O que é verdade é que há um movimento muito generoso de instituições de base comunitária que querem assumir esta responsabilidade de cuidar com hospitalidade de uma família de refugiados, durante dois anos, ajudando-os a recomeçar a vida. É um gesto muito generoso de muitas comunidades espalhadas pelo País e na primeira linha dessa resposta estão, sem dúvida, as IPSS.
Deste modelo exclui-se a iniciativa, digamos, individual?
Desde o início a PAR exclui o modelo de alojamento doméstico, de coabitação com uma família portuguesa, porque nos parece que o período de tempo de dois anos é muito exigente. As seis dimensões de que falamos, aprendizagem do Português, apoio no acesso à Saúde, à Educação, ao Trabalho, para além, do alojamento e da alimentação, é um caderno de encargos muito pesado para uma família portuguesa. Em contrapartida, o que propusemos é que essas famílias de refugiados possam ter um alojamento autónomo para viverem enquanto família e que possam ter o apoio de famílias e de pessoas da comunidade, bem como de instituições. O presidente da Cáritas, Eugénio Fonseca, inventou o conceito de Família GPS, famílias próximas que apoiam aquela família de refugiados a integrar-se na comunidade.
E que competências serão atribuídas a cada uma das instituições?
As famílias de refugiados acolhidas terão o estatuto legal devido e a autorização de residência respetiva e terão acesso, em igualdade de circunstâncias a qualquer cidadão português, ao Sistema Nacional de Saúde ou à Escola Pública ou a outros apoios públicos que existam. Nesse sentido, por exemplo, as questões de saúde não é à instituição anfitriã que competirá resolver, mas o SNS. Agora, o que as instituições anfitriãs, as famílias GPS, a comunidade podem e devem fazer é ajudar aquela família a fazer essa ponte até aos serviços de Saúde, de Educação ou outros. À instituição anfitriã compete resolver a questão do alojamento autónomo, mobilizando até outros recursos que existem na comunidade… Por exemplo, há muitas famílias que têm uma segunda casa e que decidem emprestar a casa, por dois anos, até que a família de refugiados seja autónoma. Nesse sentido, uma IPSS pode reunir os recursos disponíveis na comunidade para dar as condições de alojamento, alimentação e de vestuário, mas também no apoio à integração, como o acesso à Saúde, ao trabalho ou à aprendizagem do Português. E só irá para uma instituição anfitriã do PAR Famílias uma família de refugiados que queira, que aceite esse convite e assinar um acordo de acolhimento com essa instituição anfitriã, através do qual ambas as partes estabelecem direitos e deveres e quais as responsabilidades de cada parte
Como será feita a seleção das famílias refugiadas e quais os critérios?
Há dois níveis de seleção, o dos refugiados que virão para Portugal, que serão selecionados de dois pontos de origem, Itália e Grécia, e sê-lo-ão por instituições europeias, que são responsáveis pela identificação de cada grupo de refugiados para cada um dos 28 países da União Europeia, ou pelo menos, pelos 24 que se disponibilizaram a receber essas pessoas. Nesse domínio, Portugal, como os demais países, não tem palavra a dar sobre que refugiados virão para o País, responsabilidade da União Europeia e da própria Itália e Grécia. Em relação ao PAR Famílias, é necessário que, quando estiver identificada a lista dos que virão para Portugal, se possa fazer o encontro entre as ofertas disponíveis e as necessidades de famílias, que seja um encontro ajustado o melhor possível. Por exemplo, que uma determinada família que tenha uma determinada dimensão possa ir para uma instituição que tenha uma casa com dimensão ajustada ao número de membros da família, ou se uma família tiver um filho em fase de iniciar a sua vida académica no ensino superior é bom colocá-la numa cidade onde tenha acesso a uma universidade, ou se os membros adultos trabalhavam na agricultura é bom que encontremos uma instituição do mundo rural para que a integração profissional possa correr melhor. É preciso tentar este ajustamento o melhor possível, mas não haverá nenhuma família elegível para o PAR Famílias e que queira que deixe de ser acolhida havendo ajustamentos mais exatos ou menos exatos, mas sempre com o pensamento humanista e sentido de hospitalidade para quem chega.
Que apoios existem para ajudar as instituições e entidades que vão acolher essas famílias?
Uma das coisas bonitas deste processo do PAR Famílias é que lançámos um desafio que tem sido aceite pelas instituições e que é cada comunidade organizar-se para reunir os recursos necessários para cuidar de uma família durante dois anos, sem estar à espera que dinheiro vem de Bruxelas ou do Governo. Vezes de mais, no passado recente, estivemos sempre condicionados à espera de quando vem dinheiro para fazer alguma coisa. A Plataforma de Apoio aos Refugiados foi ao contrário, nasceu e está a desenvolver-se sem estar à espera de quando é que vem dinheiro e que dinheiro há, porque achamos que qualquer comunidade, mesmo de mais baixos recursos, é capaz de se organizar para cuidar de uma família. A resposta que tivemos foi espantosa, temos já 125 instituições confirmadas, com capacidade de alojamento de mais de 600 pessoas. Dito isto, sem prejuízo de no futuro vir a haver algum apoio financeiro para instituições que acolham refugiados, as do PAR Famílias serão beneficiadas como qualquer outra. Mas sublinho, este é um processo generoso, solidário, onde ninguém ficou à espera do apoio financeiro para dizer presente.
Uma mensagem para as instituições do País.
As IPSS percebem como ninguém o desafio que está em cima da mesa, ser solidário com quem perdeu tudo, pessoas em pior circunstâncias do que muitos dos nossos concidadãos que são apoiados pelas IPSS por todo o País, e tem sido fácil para qualquer pessoa perceber que a ideia é façamos aos outros aquilo que gostávamos que nos fosse feito a nós e à nossa família. Ora, as IPSS são líderes e mestres em ser solidárias e, nesse sentido, creio que Portugal deve muito às IPSS e, neste momento, voltará a ficar devedor da resposta que as IPSS souberem dar, liderando este processo de solidariedade. Não tenho dúvidas que a CNIS e as instituições que dela fazem parte são um pilar absolutamente fundamental do PAR Famílias.
Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)
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