INFORMAÇÃO/FORMAÇÃO

Fiscalidade e Contratação Pública nas IPSS

«Fiscalidade e Contratação Pública» foi o tema em debate na sessão de divulgação, informação/formação promovida pela CNIS, em Fátima, e teve como principal propósito, como referiu na abertura Eleutério Alves, tesoureiro da CNIS, “partilhar conhecimentos importantes” para a vida das IPSS.
O objetivo era claro e, pela adesão maciça e forte participação no debate dos representantes de IPSS de todo o País presentes, foi plenamente cumprido, apesar de nem todas as dúvidas terem sido cabalmente esclarecidas. Não por falta de qualidade dos palestrantes, bem pelo contrário, mas simplesmente porque as matérias em discussão proporcionam difusas interpretações.
Por isso mesmo, como referiu João Dias, diretor-executivo da CNIS, “a intenção é dar informação para que as instituições possam fazer escolhas esclarecidas, principalmente quando há diferentes interpretações dos documentos legais”.
As «IPSS e o Código de Contratação Pública (CCP)» foi o tema abordado por Simões de Almeida, que começou logo por avisar que apenas iria expressar a sua opinião, o que “não será consensual”.
E perante a questão se “o CCP se aplica às IPSS?”, Simões de Almeida demonstrou, desde logo, como esta é uma matéria em que não há consenso.
Para o palestrante convidado pela CNIS a resposta àquela pergunta é afirmativa, mas alertou que há quem defenda o contrário. Para justificar a sua opinião, Simões de Almeida socorreu-se do nº 2 do artigo 2º do CCP, que sustenta que “há sujeição ao Código de Contratos Públicos nas IPSS em que haja um financiamento maioritário pelo Estado (+50%) e satisfação de necessidades de interesse geral (ou seja, que estejam excluídas de mercado)”.
Já quem defende que o CCP não se aplica às instituições sociais baseia a sua opinião na exceção criada pelo Artigo 23 do Estatuto das IPSS, que lhes permite não o fazerem, desde que sejam “obras realizadas por administração direta até um máximo de 25 mil euros”.
De seguida, Simões de Almeida indicou a “grande vantagem” de as instituições optarem pela Contratação Pública, que é a “poupança”, para além da “transparência e concorrência” que gera.
“A redução de custos de fornecimentos, aliada aos mecanismos da contratação pública, é a grande mais-valia para a poupança, leia-se sustentabilidade”, especialmente quando “muitas pessoas olham para a contratação pública como mais uma chatice”, pois implica “burocracia, custos e exigência de rigor”, sustentou.

AJUSTE DIRETO

Após enunciar os modelos de contratação (internalização, externalização e misto), Simões de Almeida enumerou os procedimentos possíveis: ajuste direto; concurso público; concurso limitado por prévia qualificação; procedimento de negociação; e diálogo concorrencial.
Na sua opinião, o ajuste direto é a melhor opção para as IPSS, pois é “mais simples, mais célere e permite o convite a apenas uma entidade”, enunciando, de seguida, os critérios a observar: Critério de valor ou Critérios materiais.
Explicados à plateia os limites à contratação por ajuste direto, Simões de Almeida avançou para os procedimentos, que, consoante os casos deve conter um Caderno de Encargos ou um Convite a apresentação de propostas.
Neste particular, o causídico lembrou que no Convite, em termos de critérios de adjudicação, deve constar um de dois: “O da proposta economicamente mais vantajosa para a entidade adjudicante ou o do mais baixo preço”. Já no Caderno de Encargos tem que ser “fixado o preço-base”.
Já na ponta final da sua alocução, o jurista lembrou aos presentes que todo este procedimento “tem que ser feito em plataforma eletrónica”, que não pode ser o simples site da instituição, mas “uma plataforma certificada e com interligação à plataforma dos Contratos Públicos”.
Em resumo, tudo começa com uma decisão da Direção da IPSS, lavrada em ata, e o envio de convites à apresentação de propostas, segue-se a negociação e a marcha do procedimento (Cadernos de Encargos, Apresentação de Propostas, Esclarecimentos, Relatório Preliminar e Relatório Final) e, por fim, a decisão da adjudicação e a celebração do contrato.
A terminar, Simões de Almeida lembrou os presentes que “o que deve consubstanciar a opção pela Contratação Pública não deve ser só o cumprimento da lei, mas principalmente o que é vantajoso para a IPSS, ou seja, a poupança/sustentabilidade”, que, no entanto, “não deve ser conseguida a qualquer custo”, acrescentando ainda: “O Estado não está, neste momento, a exigir o que o CCP exige. E das duas uma, ou o Estado acha que a Contratação Pública não é aplicável às IPSS ou, então, ainda não viu que é”.

IRC E IVA

Depois de uma manhã dedicada à Contratação Pública, a parte da tarde teve inteiro enfoque na Fiscalidade, sendo preletor o consultor e antigo quadro superior da Autoridade Tributária e Aduaneira (ATA) Abílio Sousa.
A intervenção do contabilista certificado convidado pela CNIS versou essencialmente questões em torno do IRC e do IVA. Durante a exposição intitulada «Direitos e Deveres Fiscais no Setor Solidário», Abílio Sousa abordou temas como o enquadramento em IRC das entidades que não exercem a título principal atividades de natureza comercial, industrial ou agrícola, o enquadramento em IVA, as isenções subjetivas e as isenções objetivas no âmbito do IRC, as regras de determinação do lucro tributável em IRC (rendimento global) e ainda as obrigações declarativas (modelo 22 e IES).
O preletor convidado começou por lembrar que “nos últimos quatro anos as obrigações declarativas cresceram desmesuradamente” e que “todas as pessoas coletivas são sujeitos passivos de IRC”, o que ficou plasmado na “alteração das obrigações declarativas de 2012”, e que se reflete no Modelo 22.
Abílio Sousa recordou ainda aos presentes que rendimento não sujeito a imposto é diferente de ser isento, pelo que “uma isenção fiscal é sempre um benefício fiscal e, por isso, tem que ser declarado através do Anexo D”.
Já relativamente ao IVA, o preletor lembrou que o regime simplificado de faturação (o chamado regime de caixa) pode ser uma opção para as IPSS, desde que “não ultrapasse os 150 mil euros de rendimentos acessórios, ou seja, aqueles provenientes de atividades lucrativas”, sendo que “o IVA é um imposto real pelo que não contempla isenções de carácter pessoal, mas sim isenções em função da natureza das operações (isenções que não conferem direito à dedução)”.
De seguida, Abílio Sousa recordou que “para efeitos de isenção, apenas são considerados como organismos sem finalidade lucrativa os que, simultaneamente”, ou seja, de forma cumulativa, “em caso algum distribuam lucros e os seus corpos gerentes não tenham, por si ou interposta pessoa, algum interesse direto ou indireto nos resultados da exploração; disponham de escrituração que abranja todas as suas atividades e a ponham à disposição dos serviços fiscais, designadamente para comprovação do referido na alínea anterior; pratiquem preços homologados pelas autoridades públicas ou, para as operações não suscetíveis de homologação, preços inferiores aos exigidos para análogas operações pelas empresas comerciais sujeitas de imposto; não entrem em concorrência direta com sujeitos passivos do imposto”.
Servindo-se do Artigo 9º do Código do IVA, o consultor enunciou as operações em que as Entidades do Setor Não Lucrativo estão isentas de imposto, a saber: As prestações de serviços efetuadas por organismos sem finalidade lucrativa que explorem estabelecimentos ou instalações destinados à prática de atividades artísticas, desportivas, recreativas e de educação física a pessoas que pratiquem essas atividades; as prestações de serviços que tenham por objeto o ensino, bem como as transmissões de bens e prestações de serviços conexas, como sejam o fornecimento de alojamento e alimentação, efetuadas por estabelecimentos integrados no Sistema Nacional de Educação ou reconhecidos como tendo fins análogos pelos ministérios competentes; as prestações de serviços que consistam em proporcionar a visita, guiada ou não, a bibliotecas, arquivos, museus, galerias de arte, castelos, palácios, monumentos, parques, perímetros florestais, jardins botânicos, zoológicos e semelhantes, pertencentes ao Estado, outras pessoas coletivas de direito público ou organismos sem finalidade lucrativa, desde que efetuadas única e exclusivamente por intermédio dos seus próprios agentes. A presente isenção abrange também as transmissões de bens estreitamente conexas com as prestações de serviços referidas; as prestações de serviços fornecidas aos seus membros por grupos autónomos de pessoas que exerçam uma atividade isenta, desde que tais serviços sejam diretamente necessários ao exercício da atividade e os grupos se limitem a exigir dos seus membros o reembolso exato da parte que lhes incumbe nas despesas comuns, desde que, porém, esta isenção não seja suscetível de provocar distorções de concorrência.

FATURAÇÃO

Após alertar para algumas informações vinculativas dos Serviços do IVA, Abílio Sousa abordou a questão da faturação, começando por sublinhar que “os sujeitos passivos que pratiquem exclusivamente operações isentas de imposto estão dispensados de emitir faturas”. Por outro lado, “a obrigação de emissão de fatura pode ser cumprida mediante a emissão de outros documentos pelas pessoas coletivas de direito público, organismos sem finalidade lucrativa IPSS, relativamente às transmissões de bens e prestações de serviços isentas ao abrigo do artigo 9.º”.
Relativamente às isenções subjetivas e isenções objetivas no âmbito do IRC, Abílio Sousa explicou um pouco sobre os artigos 10º (pessoas) e 11º (rendimentos) do CIRC, abordando depois as regras de apuramento do lucro tributável em IRC, ou seja, o rendimento global, que “correspondente à soma algébrica dos rendimentos das diversas categorias consideradas para efeitos de IRS e, bem assim, dos incrementos patrimoniais obtidos a título gratuito, das pessoas coletivas e outras entidades que não exercem a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola”.
Quanto a exceções, os rendimentos não sujeitos a IRC são as “quotas pagas pelos associados em conformidade com os estatutos” e os “subsídios destinados a financiar a realização dos fins estatutários”, ao passo que estão isentos de IRC os rendimentos provenientes de “incrementos patrimoniais (donativos) obtidos a título gratuito destinados à direta e imediata realização dos fins estatutários”.
Ainda antes de terminar a sua intervenção com as obrigações declarativas, Abílio Sousa recordou a nova regra, introduzida na última reforma do IRC (n.º 7 do artigo 53.º do CIRC), sublinhando que “ao rendimento global apurado nos termos dos números anteriores são dedutíveis, até à respetiva concorrência, os gastos comprovadamente relacionados com a realização dos fins de natureza social, cultural, ambiental, desportiva ou educacional prosseguidos por essas pessoas coletivas ou entidades, desde que não exista qualquer interesse direto ou indireto dos membros de órgãos estatutários, por si mesmos ou por interposta pessoa, nos resultados da exploração das atividades económicas por elas prosseguidas”.
A fechar, sobre as obrigações declarativas, o consultor avisou que, “com exceção das entidades isentas ao abrigo do artigo 9.º do CIRC, todas as outras estão obrigadas a organizar o processo de documentação fiscal”.
O dia de trabalho, que decorreu na última sexta-feira de fevereiro, no Hotel Cinquentenário, em Fátima, terminou com mais um período de debate, no qual Abílio Sousa deixou um conselho a todos os presentes: “Perante um indeferimento da Autoridade Tributária e Aduaneira (ATA), a primeira coisa a fazer é pedir a fundamentação legal para tal ato, pois é algo obrigatório pela legislação fiscal, tendo a ATA cinco dias para responder”.
Foi um dia preenchido por questões bastante técnicas, mas muito útil, pelo manancial de informação fornecido, para os cerca de 200 dirigentes e técnicos de IPSS presentes.

P.V.O.

 

Data de introdução: 2016-03-01



















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