A política é uma área propícia ao nascimento ou à fabricação de “heróis”, mas nunca se sabe quanto tempo esse estatuto poderá durar. A memória dos homens é curta e muitos desses “heróis” são engolidos, mais ou menos injustamente, pelas voltas e reviravoltas da História. Entre essas perdas de memória de um povo está, por exemplo, o caso da Polónia em relação a Lech Walesa, mas é o caso do Brasil que gostaríamos lembrar.
Não foi sem razão que os analistas económicos internacionais colocaram o Brasil, há poucos anos atrás, na lista das grandes potências emergentes, algumas das quais formam o grupo conhecido pela sigla BRICS ( Brasil, Rússia, India, China e África do Sul). No entanto, bastou apenas algum tempo para que o país deixasse de merecer esse estatuto de quase grande potência. E tudo por causa de uma doença aparentemente incurável que dá pelo nome de corrupção, uma doença que se estende pala maior parte do o Brasil e que é transversal a todas as classes sociais, a começar pelos políticos.
Fernando Color de Melo, presidente entre os anos de 1990 e 1992, tinha sido, até agora, o nome mais sonante de uma lista de políticos brasileiros acusados judicialmente de corrupção. Foi um processo que levaria à sua destituição, ele que havia ganho, por voto directo do povo, as primeiras eleições presidenciais realizadas após o fim do regime militar que governara o país durante mais de duas décadas. Collor chegou à presidência com apenas 42 anos, envolto num clima de enorme popularidade e esperança, mas não chegou a cumprir metade do seu mandato. As denúncias de corrupção, feitas por um familiar, interromperam a sua carreira que se anunciava brilhante, embora tenha conseguido voltar à política mais tarde, depois da revisão do seu processo judicial.
As acusações de corrupção no Brasil atingiriam agora dois presidentes, cada um deles com uma história política e pessoal envolta numa auréola de messianismo ou de heroísmo. Falamos de Lula da Silva, um operário sindicalista, no primeiro caso, e de Dilma Roussef, uma resistente à ditadura militar, no segundo. Por alturas da campanha eleitoral para o seu segundo mandato presidencial, escrevemos que nenhum político, em qualquer outro lugar do mundo poderia ter saído incólume do lodaçal de corrupção em que ele se envolvera ou fora envolvido pelos seus companheiros de partido, o PT. Mas, nessa altura, Lula ainda era um mito, uma espécie de Messias, um herói, para muitos milhões de brasileiros, sobretudo os mais pobres, embora não apenas destes … e venceu.
Hoje, os tempos são outros. É certo que Dilma Roussef, sua sucessora, juntou a sua história pessoal de resistente à ditadura à herança mítica de Lula, mas isso foi insuficiente para evitar que um e outro já tenham caído do pedestal em que foram colocados.
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