D. Manuel Martins, bispo de Setúbal entre 1975 e 1998, morreu, aos 90 anos, “acompanhado dos seus familiares e após receber a Santa Unção” de um pároco local, informou a Diocese de Setúbal. As exéquias do bispo emérito de Setúbal realizam-se terça-feira (dia 26), pelas 15h00, no Mosteiro de Leça do Balio, em Matosinhos, onde decorre o velório.
A missa de sétimo dia realiza-se no próximo domingo (dia 1 de outubro), na Sé de Setúbal, antiga igreja de Santa Maria da Graça.
Nascido em 20 de janeiro de 1927, em Leça do Balio, Matosinhos, Manuel da Silva Martins estudou no seminário do Porto e, mais tarde, na Universidade Gregoriana, em Roma.
Foi pároco de Cedofeita, nos nove anos de exílio do bispo do Porto António Ferreira Gomes (1960-1969), durante o Estado Novo, e foi vigário geral após o regresso do prelado.
Em 1975, um após o 25 de Abril de 1974, foi nomeado bispo da diocese de Setúbal, de onde só saiu 23 anos depois, em 1998.
Manuel Martins foi presidente da Comissão Episcopal da Ação Social e Caritativa e da Comissão Episcopal das Migrações e Turismo, e da secção portuguesa da Pax Christi.
Após a resignação, continuou a fazer conferências e palestras, sendo objeto de vários livros, como “História de uma Crise - Grito do Bispo de Setúbal”, do jornalista Alcídio Torres, e o próprio também escreveu “Pregões de Esperança”, editado em 2014 e apresentado pelo ex-Presidente Ramalho Eanes.
D. Manuel Martins ficou conhecido por «bispo vermelho», na crise dos anos 80 do século passado, pelas denúncias de pobreza e de fome na região.
“Nasci bispo em Setúbal, agora sou de Setúbal”, disse no dia da ordenação episcopal aquele que foi o primeiro bispo da diocese – criada a 16 de julho de 1975, em pleno «Verão Quente» do Processo Revolucionário Em Curso (PREC) – e que acabou por se tornar uma voz incómoda para o poder político da época.
Para D. Manuel Martins, desses primeiros anos da sua passagem por Setúbal ficou um sentimento de dever cumprido e a convicção de que deu o seu melhor na luta pelas causas dos mais desfavorecidos.
“Quando cheguei a Setúbal, levava uma recomendação muito importante do bispo de Porto, António Ferreira Gomes, que me disse para tentar não aparecer como colonizador, para procurar mergulhar em Setúbal, ser de Setúbal, ser Setúbal. E, felizmente, isso aconteceu-me”, recordou o Bispo Emérito de Setúbal, em conversa com a Lusa, em 2016.
Nessa entrevista, recordou um episódio de troca de palavras com o então primeiro-ministro, Mário Soares.
“O Governo de Mário Soares dizia publicamente que em Setúbal não havia fome, que o bispo de Setúbal é que fazia fome. A Comunicação Social não me largava e um dia eu respondi dizendo que ‘se a fome era Nafarros e Belém, podíamos dar graças a Deus porque em Portugal não havia fome’”, lembrou.
Existia mesmo “fome em Setúbal”, assegurou o «bispo vermelho», que é considerado um dos principais responsáveis pela ação que a igreja católica continua a ter na região de Setúbal, designadamente no apoio social aos mais pobres e excluídos.
Em 2011, D. Manuel Martins deu a sua última entrevista ao jornal Solidariedade, onde uma vez mais não se coibiu de levantar questões polémicas.
Entre as muitas afirmações registadas, o Bispo Emérito do Porto disse: “Estamos num Estado sem território. O grande Deus é o dinheiro. Estamos pendurados na economia”.
Pode ler ou reler aqui essa conversa com o Solidariedade.
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