O poder, seja este de que tipo for, exerce sempre algum fascínio sobre a maior parte dos homens, e entre os diversos tipos de poder que exercem maior fascínio, está certamente o poder político. Não faltará quem coloque o poder económico no topo das ambições pessoais, mas atingir os mais elevados cargos políticos de um país será, na grande maioria dos casos, a ambição suprema de quem se deixa entusiasmar pelo sonho do poder.
Deve dizer-se que não é sempre e só a ambição do poder que justifica o empenhamento dos cidadãos na sua entrega à luta política. Muitos, é justo reconhecê-lo, fazem-no por idealismo, convencidos de que o seu empenho será útil à causa pública. Uma grande parte, no entanto, junta essa a outras justificações, sobretudo aquela que poderíamos chamar a paixão pelo poder. Aliás, quem não der provas desta paixão tem poucas possibilidades de ter êxito. Acrescente-se, finalmente, que esta paixão, só por si, não é condenável, desde que não ultrapasse os princípios básicos do respeito pela lei, pela verdade e pelos adversários. Em alguns casos, no entanto, o fascínio do poder é tão grande que chega para justificar a alteração das leis constitucionais que regulam as eleições, como aconteceu na Venezuela e pode acontecer também na Bolívia.
Evo Morales, actual presidente boliviano, ficou famoso em todo o mundo, quando venceu as eleições presidenciais daquele país, em 2005. A razão da surpresa geral que se seguiu ao seu triunfo deve-se ao facto de se tratar de um índio, oriundo da etnia dos aimara, e de ser, na altura, dirigente de uma associação ou sindicato de produtores de coca, os chamados cocaleros. O certo é que a eleição de Morales pôs fim a uma longa história de revoluções militares que marcaram de maneira profunda a imagem de um país, aparentemente incapaz de viver num regime democrático estável. Só que o chefe de estado boliviano já eleito pela segunda vez, não poderá cumprir outro mandato, conforme estipula a Constituição.
No entanto, apesar das dificuldades que experimentou no exercício das suas funções, e não obstante a lua de mel com a maioria dos bolivianos já ter acabado, o presidente dá sinais de apego ao lugar, o que não constitui propriamente uma surpresa já que é tradicional na história da América Latina: à direita e à esquerda. Morales não pode concorrer a um novo mandato, mas o seu partido está empenhado na liderança de um movimento pela reforma do texto constitucional, de modo a permitir que ele possa concorrer. É realmente difícil resistir ao fascínio do poder.
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