MARÇO 2018

Desconcentração. Descentralização. Cooperação

1. Na linguagem das ciências sociais, nomeadamente na política, geografia e economia, desconcentração e descentralização são termos que têm vindo a ganhar um significado qualitativo bastante diferenciado. Assim, quando se fala em "descentralização política", por exemplo, refere-se a um processo de transferência de poderes e funções de alto nível para outros locais, instituições ou pessoas, nomeadamente de transferência do poder central para regiões ou autarquias. A "desconcentração", por outro lado, é um processo de dispersão em que se retiram características ao centro, dispersando serviços mas mantendo o cuidado de não permitir a transferência de funções qualificadas para as chamadas periferias. Esta diferenciação de sentido tem uma grande afinidade com as teorias do "centro/periferia" preconizadas pelos economistas e estudiosos do desenvolvimento desde os finais dos anos 60.
Agora, e entre nós, desconcentração e descentralização estão a ser temas repetidamente abordados pelos vários Partidos com assento parlamentar. Não apenas por aquele que aí tem mais espaço mas também pelos outros, nomeadamente pelos que ali dão o necessário e suficiente respaldo ao Governo. Ainda bem...
Obviamente que, se todos assim pensam, provavelmente nem todos assim o querem, porque aqueles em que se sente mais o "cheiro dos assentos" do que o "cheiro dos cidadãos" facilmente se deixam inebriar pelo "cheiro do poder" que jamais quererão perder. Por assim ser, é que temos um interior que definha e um litoral que abafa. Entre outros constrangimentos...
Descentralizar e desconcentrar. Bom será que sejam opções imperativas e sem reversões. Ver e julgar próximo dos cidadãos para melhor decidir e agir e mais prontamente servir é uma boa opção. Melhor: é o grande caminho. Evidentemente: porque o importante são as pessoas e as suas circunstâncias.
Com isso, todos lucram: menores custos e resultados certamente muito melhores.

2. Uma das grandes virtudes das Instituições de Solidariedade é a de serem instituições de proximidade onde bem se sente o "cheiro dos cidadãos". São Instituições protegidas pelo art.º 63º, nº 5 da Constituição da República Portuguesa que reconhece a existência das IPSS, enquadrando-as então no âmbito do Sistema de Segurança Social e estabelecendo o direito a serem apoiadas pelo Estado para o desenvolvimento das suas atividades.
São as comunidades locais que erguem estas Instituições e as mantêm, porque são as comunidades que sofrem com as carências, sentem as necessidades das pessoas e criam as respostas sociais para os cidadãos. O Estado obriga-se com elas por contratos celebrados (acordos de cooperação). São Instituições ágeis e adequadas. Inquestionavelmente, representam muito menores custos para o erário público.
Mas hoje não falta quem se farte de acenar com os cerca de mil e trezentos milhões que o Estado transfere para essas largas dezenas de milhares de respostas sociais em que, diariamente e ao longo das vinte e quatro horas de cada dia, são apoiados bastante mais de meio milhão de cidadãos e onde têm emprego pelo menos duas centenas de milhares de pessoas. São respostas sociais conhecidas e requeridas por  um Estado que quer fazer das pessoas o seu caminho.  São respostas sociais desenvolvidas e suportadas pelas mais de cinco mil Instituições de Solidariedade. São respostas sociais de Instituições que são um significativo sector da economia (social) à volta das quais outras e diversificadas atividades económicas se desenvolvem. São respostas sociais de Instituições de Solidariedade em que, nomeadamente, os custos do trabalho e a fiscalidade fazem com que, mais de metade do que estas Instituições recebem do Estado ao mesmo Estado acabe por regressar. São respostas sociais de Instituições que são um pilar estruturante do Estado Social. São respostas sociais de pessoas, com as pessoas e para as pessoas.

3. O bom percurso feito por estas Instituições de Solidariedade, muito particularmente no período anterior e posterior à celebração do Pacto de Cooperação para a Solidariedade Social, em 19 de dezembro de 1996, período em que quase triplicaram as suas respostas sociais e em que os serviços de qualidade chegaram a mais pessoas e em melhores circunstâncias, também foi possível porque na Segurança Social se fazia sentir alguma descentralização e alguma desconcentração, com autonomia administrativa e financeira, sendo essa, aliás, a primeira área da Administração pública a dispor de uma organização territorialmente descentralizada, na sequência da Constituição de 1976. Os Centros Distritais da Segurança Social tinham competências próprias e decidiam designadamente em matéria de cooperação e apoio às IPSS. Eram, também, centros de suficiente proximidade, de útil serviço e de bom acompanhamento.
Nessa área, porém, desde há alguns anos, parece estar a instalar-se um processo de irreversível (?) centralização e concentração. Progressivamente, o acompanhamento vai dando lugar à burocracia e a exigências nem sempre sustentadas e vai sendo substituído por uma fiscalização normalmente excessiva e muitas vezes insensata, com o aproveitamento especulativo de alguma comunicação. Com isso, a autonomia das Instituições pode estar a ser substituída por algum desencanto e por progressiva desmobilização...
Com isso também começaram a sofrer, e muito, as Instituições de Solidariedade. E nem os serviços nem os cidadãos beneficiaram.
Descentralizar e desconcentrar pode e deve ser uma opção inadiável. Também na Cooperação e antes que seja demasiado tarde...

Lino Maia

 

Data de introdução: 2018-03-08



















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