É uma instituição que serve uma população muito carenciada, o que acaba por se refletir na gestão, criando dificuldades financeiras. Com o edificado a necessitar de obras, o Centro de Promoção Social do Furadouro conseguiu, fruto da iniciativa de um casal de pais que tem um filho na instituição, levar a bom porto uma candidatura ao Orçamento Participativo de Ovar e angariar 50 mil euros para requalificar três espaços essenciais ao bom desenvolvimento dos mais pequenos. Um exemplo a seguir por outras IPSS.
Quando em 1969 um inquérito levado a efeito junto da população, essencialmente, piscatória do Furadouro, lugar do concelho de Ovar, os resultados criaram preocupação: 50 homens não tinham qualquer ocupação e 127 crianças, entre os seis e os 13 anos, não tinham acesso à instrução.
Perante isto, o pároco, a diretora da escola primária e o Rotary Club de Ovar, muito em especial, os rotários Mário Alçada e João Peixinho, deitaram mãos à obra e criaram o Centro Infantil do Furadouro.
“Este é o momento que consideramos como o início desta obra, sendo que a formalização da instituição e a designação atual de Centro de Promoção Social do Furadouro aconteceria em janeiro de 1972”, conta Jorge Cunha, presidente da instituição vareira, acrescentando: “Ao longo dos anos sempre houve uma relação muito estreita entre a instituição e o Rotary, que logo na formação teve a participação muito próxima de alguns elementos, especialmente os senhores Alçada e Peixinho, que dedicaram muito da sua vida à instituição. E ao longo dos anos têm sido muitos os rotários a integrar os órgãos sociais da instituição. E durante a vida da instituição o Rotary tem ajudado muito, não só através de ações de voluntariado, mas também na angariação de fundos. E há que também não esquecer o papel da Casa da Amizade do Rotary Club de Ovar, que dá um donativo mensal ao Centro para ajudar nas mensalidades dos utentes mais carenciados”.
Álvaro Gomes, rotário e membro da Direção, lembra que, “em 1969, o Furadouro era apenas a pesca, não havia mais nada, para além de muita pobreza e fome”.
A instituição começou a funcionar num velho barracão, em tempos as instalações do Centro Vidreiro que ali existia.
“Quando deixou o barracão, o Centro veio para as atuais instalações, propriedade da instituição, apesar de a construção não ter sido feita com verbas próprias. A construção foi feita ao longo dos anos 1980, tendo ficado concluída em 1990”, recorda Álvaro Gomes.
Porém, as dificuldades financeiras que a instituições tem vivido no decurso da sua existência levaram a que as sucessivas direções não tenham podido requalificar o edificado, que atualmente apresenta algumas necessidades prementes de obras.
Servindo uma população de baixos recursos económicos, o Centro de Promoção Social do Furadouro tem-se debatido com problemas financeiros, tendo já recorrido ao Fundo de Socorro Social para conseguir equilibrar as contas.
“Embora não se compare com o antigamente, ainda há uma parcela significativa de utentes bastante carenciados. As comparticipações são reguladas pela Segurança Social e vamos percebendo, quando fazemos as contas, que ainda há uma percentagem relativamente elevada de utentes que paga uma verba muito reduzida face às suas dificuldades económicas. Por isso é que o Centro é um ponto essencial de apoio à comunidade”, afirma o presidente da instituição, considerando que esta situação se reflete nas contas “em algumas dificuldades”.
“Agora as coisas estão mais equilibradas, mas durante muitos anos o Centro passou por grandes dificuldades. Nestes últimos anos, tivemos dificuldades em pagar subsídios de férias e de natal aos funcionários. Conseguimos sempre pagar as remunerações em atraso, cumprimos os Contratos Coletivos de Trabalho, com grande dificuldade, mas fomos tomando medidas para tentar garantir a sustentabilidade financeira. O Centro passou por grandes dificuldades e ainda está numa situação que não se pode dizer que seja desafogada. Vai tendo para o dia a dia e essas dificuldades refletem-se também no estado de degradação das infraestruturas, porque nunca houve condições para fazer uma devida manutenção”, confessa Jorge Cunha.
“Realisticamente, nós vamos ultrapassando as dificuldades, mas elas estão aí no dia a dia”, sublinha Álvaro Gomes, no que é corroborado pelo presidente: “Agora que as coisas estão mais equilibradas e com isto quero dizer que, pelo menos, a gestão corrente não tem problemas, mas se for preciso fazer investimentos não há condições. Felizmente também houve uma iniciativa que veio beneficiar o Centro”.
De facto, a instituição do Furadouro foi beneficiada por uma ação de um casal de pais que têm o filho no Centro, que decidiu candidatar um projeto de intervenção no edificado da instituição ao Orçamento Participativo da Câmara Municipal de Ovar. É algo inédito e pioneiro, mas sem dúvida uma excelente opção para todas as IPSS.
“Confesso que não foi uma ideia da Direção e até desconhecia que os regulamentos previam essa possibilidade, mas houve um casal, o António e a Elis Magina, que tem aqui uma criança que sugeriu a ideia de concorrer ao Orçamento Participativo de Ovar com um projeto em benefício do Centro”, conta Jorge Cunha, acrescentando: “Inicialmente, esses pais falaram com a diretora-técnica, que informou a Direção e que desde a primeira hora apoiou a iniciativa.
Se não fosse esta iniciativa, este projeto de requalificação não teria avançado. E não foi a instituição a candidatar-se porque não pode, mas foram uns pais”.
Assim, através do Orçamento Participativo, o Centro conseguiu 50 mil euros que “estão a ser aplicados no projeto de requalificação do parque infantil, visto que o que havia estava muito degradado e até tinha já sido retirado, numa área em que as crianças podem praticar desporto e ainda numa sala de creche, que também estava mesmo a precisar de ser requalificada ao nível do chão, pintura e algum equipamento”, revela o presidente, lamentando: “Há outras necessidades, mas não temos verbas”.
Para além da componente financeira, fundamental para que aqueles três espaços possam ser melhorados, a vitória na votação do Orçamento Participativo por parte da população de Ovar é ainda o reconhecimento do importante trabalho desenvolvido pelo Centro.
“Embora tenha havido um esforço de todos para conseguir a melhor votação, se as pessoas não reconhecessem e não se revissem no trabalho desenvolvido pela instituição não teriam votado no projeto. Foi algo que nos deixou muito orgulhosos e satisfeitos”, confessa o presidente, apesar de Álvaro Gomes ainda notar alguma desconfiança por parte da comunidade: “Mesmo assim, ainda acho que não há o devido reconhecimento por parte das gentes do Furadouro, talvez por culpa nossa que deveríamos, se calhar, ir mais à comunidade dizer e mostrar o que somos e o que fazemos, porque muita gente não sabe. Mas, globalmente, somos reconhecidos e o serviço que prestamos é valorizado pela população”.
Com as obras em marcha nas três áreas referidas, fruto da verba do Orçamento Participativo, os dirigentes da instituição desejam intervir ainda noutras zonas do edifício, mas não só.
“Para já estamos a tratar destas situações, mas gostaríamos, caso tenhamos oportunidade, de reaproveitar um espaço que, pomposamente, chamamos de multiusos, que está encerrado por não reunir as condições necessárias para ser utilizado. Neste momento serve de arrecadação. Face ao sucesso do Orçamento Participativo, o mesmo casal já efetuou uma nova candidatura, que já passou a primeira fase do concurso. Portanto, esperemos voltar a ser beneficiados para requalificar o multiusos”, sustenta Jorge Cunha, revelando ainda: “Outro projeto que gostaríamos de pôr em marcha a curto prazo é a substituição das nossas carrinhas que servem no SAD. Não estão adequadas para o serviço que prestam, pois são muito antigas e precisam de ser substituídas. Por outro lado, gostaríamos de pintar todo o Centro. Também fizemos uma candidatura, no âmbito de uns fundos comunitários, para a requalificação do edificado. Falou-se em 28 milhões de euros para a zona centro, mas acho que são tantas as instituições a pedir que não sei se nos chegará alguma coisa. Mas esta seria uma remodelação mais profunda e também necessária”.
Para além das obras já em curso, está prestes a iniciar-se também a remodelação da sala de convívio onde os idosos se reúnem para diversas atividades, fruto de uma candidatura bem-sucedida à Fundação PT.
Nos dias que correm, o Centro de Promoção Social do Furadouro acolhe 48 crianças em creche, 60 em Pré-escolar, duas dezenas em CATL e apoia 25 idosos em SAD. Para além disto, através do Centro Comunitário acompanham cerca de 120 pessoas, nas respostas de SAAS (Serviço de Atendimento e Acompanhamento Social) e RSI (Rendimento Social de Inserção).
“O foco inicial do Centro foi o apoio às crianças, porque era evidente a necessidade de prestar apoio à infância, mas com o passar do tempo e o desenvolvimento da instituição e da comunidade em geral houve necessidade de alargar o âmbito de intervenção da instituição a outras dimensões. Depois, alargou-se também aos idosos, com a abertura do SAD, que é algo importante, até porque nesta zona, embora o estado desenvolvimento socioeconómico seja muito diferente de há 50 anos, continua a haver muitas necessidades. Esse apoio aos mais idosos foi importante, tal como a criação do Centro Comunitário”, afirma o presidente.
E como seria o Furadouro sem o Centro de Promoção Social?
“Se não tivesse surgido o Centro, outra instituição acabaria por aparecer porque as necessidades eram muito prementes, não só na altura da criação, mas nos anos que se seguiram. Se não aparecesse o Centro as condições de vida seriam piores e a condição das crianças muito frágil. Estou convencido que o Centro contribuiu para melhorar as condições de vida das pessoas do Furadouro”, argumenta Jorge Cunha, ao que Álvaro Gomes acrescenta: “Face às condições de vida das pessoas do Furadouro à época em que o Centro surgiu, se ele não tem nascido, estou convencido, que o Furadouro não era o que é hoje”.
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