Contrariamente às declarações públicas de responsáveis governamentais, veiculadas pela comunicação social, de que os jardins de infância – estabelecimentos de educação pré-escolar – se manteriam encerrados até final do presente ano letivo, o certo é que o Decreto-Lei nº 14-G/2020, de 13 de Abril, publicado no 2º Suplemento da I Série do Diário da República, veio estipular a aplicabilidade das disposições do aludido diploma “à educação pré-escolar ministrada(s) em estabelecimentos de ensino público, particular e cooperativo de nível não superior.” – artº 1º, 2.
Embora o Sector Social não seja mencionado pela sua específica designação, e se não considere abrangido pela designação “ensino particular e cooperativo”, que respeita a estabelecimentos geridos sob forma comercial, é de temer que as disposições que são apresentadas para a aplicabilidade do diploma possam vir a ser considerados como igualmente verificáveis no que diz respeito aos estabelecimentos de educação pré-escolar da Rede Solidária.
Entre as disposições do referido diploma, deve referir-se o Artigo 2.º (Realização das aprendizagens em regime não presencial) “1 — Na situação de suspensão das atividades letivas e formativas presenciais nas escolas, as aprendizagens são desenvolvidas através da modalidade de ensino não presencial, com recurso às metodologias que cada escola considere as mais adequadas, de acordo com as orientações do Ministério da Educação. 2 — Para efeitos do disposto no número anterior, as escolas devem definir e implementar um plano de ensino a distância, com as metodologias adequadas aos recursos disponíveis e critérios de avaliação, que têm em conta os contextos em que os alunos se encontram. 3 — Compete às escolas, com o apoio dos serviços centrais do Ministério da Educação e em articulação com entidades que se constituam como parceiras, a implementação do plano de ensino a distância, garantindo os professores de cada turma o acompanhamento dos alunos, com vista a que todos tenham um acesso equitativo às aprendizagens. 4 — A conceção e implementação do plano de ensino a distância deve garantir condições para a realização das aprendizagens em regime não presencial dos alunos em contexto de acolhimento nos próprios estabelecimentos de ensino, ao abrigo do disposto na Portaria n.º 82/2020, de 29 de março.”
Deve referir-se igualmente como relevante o Artigo 5.º (Atividades docentes em regime não presencial): “1 — No âmbito do plano de ensino a distância definido pela escola, o professor titular de turma e os professores da turma adaptam, sob coordenação do diretor de turma, o planeamento e execução das atividades letivas ao regime não presencial, incluindo, com as devidas adaptações, as medidas de apoio definidas para cada aluno, garantindo as aprendizagens de todos.
2 — Compete aos professores recolher evidências da participação dos alunos, tendo em conta as estratégias, os recursos e as ferramentas utilizadas pela escola e por cada aluno.
3 — Para efeitos do disposto no número anterior, os professores elaboram um registo semanal dos conteúdos ministrados, das sessões síncronas e assíncronas realizadas e de outros trabalhos desenvolvidos pelos alunos.”
Embora toda a estrutura e as disposições do diploma se afigurem como pensadas para o ensino básico e secundário, o certo que o artº 1º, 2 alarga expressamente à educação pré-escolar o âmbito do referido diploma.
A aplicação das disposições previstas no Decreto-Lei nº 14-G/2020 traduz-se numa profunda alteração dos pressupostos até ao momento em vigor no que respeita às modalidades de apoio extraordinário à manutenção de postos de trabalho, estabelecidos no Decreto-Lei nº 10-G/2020, de 26 de Março, aplicáveis às IPSS pelo artº 2º, 1 do mesmo diploma – designadamente no que respeita ao recurso ao lay off simplificado – podendo a Segurança Social vir a entender, em sede de fiscalização posterior, não se verificarem os pressupostos para a atribuição dos apoios à manutenção os postos de trabalho nos termos previstos no Decreto-Lei 10-G/2020, de 26 de Março.
Com efeito, a necessidade de implicação dos professores titulares de turma (e, por extensão, dos educadores de infância) no plano de ensino à distância será dificilmente compatível com a suspensão integral dos contratos de trabalho, sendo eventualmente mais ajustada a redução do horário de trabalho, nos moldes determinados em cada estabelecimento de educação pré-escolar.
A CNIS não foi ouvida sobre o projeto do diploma, como deveria legalmente ter sido, nos termos do artº 16º do Decreto-Lei nº 120/2015, de 30 de Junho, e tem a noção da escassa possibilidade prática da execução de um plano de ensino à distância para crianças com idades entre os três e os cinco anos, bem como da dificuldade de acesso dessas crianças aos instrumentos tecnológicos que permitam o ensino a distância – e irá promover as necessárias diligências junto do Ministério da Educação para clarificar a aplicabilidade aos estabelecimentos de educação pré-escolar da Rede Solidária das modalidades de ensino à distância para as crianças que os frequentam, dada a idade destas.
Porto, 15 de Abril de 2020
Com os melhores cumprimentos,
O presidente da CNIS
Lino Maia
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