A preocupação central com o ser humano, a liberdade e o desenvolvimento de uma cultura reformista e de compromisso são, em minha opinião, os três valores mais decisivos no processo de desenvolvimento de qualquer sociedade que se pretende seja livre, equilibrada e próspera.
A criação de condições para que cada um possa ter ao seu alcance a possibilidade de concretizar os seus sonhos de vida é uma condição essencial para a realização de todo o ser humano. Mas tal só será possível numa sociedade livre. O valor liberdade nunca poderá ser atingido quando uma sociedade não revelar capacidade para criar níveis crescentes de prosperidade e riqueza, distribuídos na base de critérios de equidade e justiça.
Uma sociedade em que grassam desigualdades de diferente natureza não pode almejar a ser uma sociedade nem desenvolvida, nem livre, porque está provado que as desigualdades são, em si mesmo, um obstáculo ao desenvolvimento. Daqui decorre que é fundamental a existência de uma classe média pujante. Uma sociedade sem uma classe média forte nunca poderá almejar a ser desenvolvida. Limitar-se-á a gerir os conflitos sociais e a miséria.
A opção pelo empenho numa cultura reformista e de compromisso deverá ser outro elemento central na conceção e execução de políticas públicas que tenham a ver com o processo de desenvolvimento. A experiência mostra que práticas revolucionárias ou de rotura pouco ajudaram a construir sociedades prósperas e livres. Os casos conhecidos bem-sucedidos foram-se consolidando através de reformas gradativas, concebidas em ordem a atingir objetivos bem identificados e com o maior grau de consenso possível.
No tempo de hoje a dificuldade maior para a observância destes valores reside no facto das expectativas dos agentes políticos e, em larga medida também, dos eleitores, estarem mais viradas para o curto prazo e muito pouco para o médio e longo prazo.
Quando são as visões de urgência ou de curto prazo que prevalecem descura-se a coerência entre diferentes políticas, ou por que as coisas são feitas em cima do joelho, sem curar de analisar todas as consequências de uma dada decisão, seja por que uma dada política, normalmente a financeira, se sobrepõe de tal maneira às demais que não deixa espaço para que a consistência e coerência entre políticas aconteça.
Para fazer política nos dias de hoje há que perceber que as sociedades são cada vez mais complexas, mais fragmentadas e apresentam-se com muito maior diversidade e mobilidade. Como consequência, vão surgindo novas formas de organização, que exercem pressão sobre os governos para que os processos de elaboração de políticas sejam alargados a novos participantes.
O elevado nível de interdependência entre tudo e todos faz com que os processos de decisão se tenham tornado mais complexos, porque têm de ter em consideração diferentes tipos de interesses, por vezes mesmo antagónicos. Este nosso tempo obriga assim os governos a acompanhar e a tentar perceber e antecipar os interesses dos grupos na sociedade. A atitude adaptativa, que consiste em reagir às situações apenas quando elas se transformam em problemas, tem como resultado respostas insuficientes e tardias e, quantas vezes atabalhoadas, porque no momento em que os governos reagem a um dado problema, normalmente o leque de opções já são muito reduzidas.
Uma maior capacidade para prever as aspirações da sociedade obriga à adoção de estratégia pró-ativas que comprometam poderes públicos e os diversos agentes económicos e sociais.
No nosso tempo, os governos são apenas mais um centro de decisão entre outros que influenciam a vida dos cidadãos. Enganam-se aqueles que pensam que a força política de quem governa resulta apenas da legitimidade democrática. Essa força é consequência, também e cada vez mais, da capacidade de relacionamento entre governos e diferentes parceiros económicos e sociais.
Nesta evolução das sociedades em que é visível a existência de uma maior complexidade, diversidade, mobilidade, fragmentação e interdependências de todo o tipo, novos centros de poder de diferente natureza vão surgindo, e isso obriga a que se faça uma reflexão profunda sobre novas formas de governar.
Esta nova forma de governar assume importância maior numa fase em que os problemas são de tal monta e tão graves que não são possíveis de solução na base de um único agente ou governo, por mais poder com que se apresente.
O crescimento económico é uma via não dispensável que permitirá contribuir para corrigir as desigualdades, combater a pobreza, pagar melhores salários e levar a cabo reformas que melhorem o funcionamento das instituições, mas enganam-se os que pensam que o crescimento económico surge como resultado da ação exclusiva do Estado ou de uns poucos. Pelo contrário, isso só será possível como resultado do esforço conjugado de muitos.
Esta visão contrapõe-se a uma outra que pensa que é ao Estado e aos poderes públicos que cabe a responsabilidade maior e, para muitos, única, com vista ao desenvolvimento, a uma maior justiça social e à criação de emprego e de riqueza. Para os que assim pensam, o combate à pobreza e às desigualdades faz-se dominantemente por via administrativa, ou seja, por mais decretos e mais leis. Para outros, onde me incluo, esse tipo de orientação não é dispensável mas não é a mais decisiva. É meu entendimento que o combate à pobreza e às desigualdades faz-se através de um conjunto de medidas que, no seu conjunto, possibilitem um forte impulso ao crescimento da economia e pela dinamização de projetos elaborados a nível local com a participação ativa das IPSS.
O intervencionismo excessivo do Estado já teve o seu tempo e foi associada à expressão de “Estado Providência” ou “Estado de Bem Estar”. Prefiro, para marcar diferença no plano político passar a falar não em “Estado de Bem Estar”, mas sim em “Sociedade de Bem Estar”.
Liberdade, primado da pessoa humana e desenvolvimento de uma cultura reformista e de compromisso são os pilares que, nas atuais circunstâncias, devem ser mobilizados para a recuperação do País.
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