Há quase dois anos a viver sob a guilhotina da CoViD-19, as instituições têm-se adaptado e reinventado para responderem da melhor forma aos desafios da pandemia, protegendo os mais vulneráveis, em especial os idosos. Mas esta luta tem sequelas e a saúde mental dos idosos, dos trabalhadores e da sociedade em geral foi posta em causa. Assim, a CNIS promoveu a realização do estudo «A Saúde Mental nas Instituições Associadas da CNIS», cuja apresentação foi no final de novembro, um trabalho que confirma problemas antigos, novos desafios, mas também mais-valias que, segundo os investigadores, devem ser exponenciadas e exploradas. Fica aqui um resumo das principais conclusões e recomendações que emanam da investigação realizadas junto de 314 instituições associadas, de um universo de 1890 com resposta de ERPI, Centro de Dia e SAD.
A CNIS, em parceria com a empresa AddedSolutions SR e o Instituto Politécnico de Bragança, promoveu a realização do estudo «A Saúde Mental na População das Instituições Associadas da CNIS», cuja apresentação pública decorreu na última semana de novembro.
O estudo foi liderado por Hélder Cavaleiro Correia, em co-autoria com Adília da Silva Fernandes, Ana I. Pereira, Augusta Mata, Carlos Pires Magalhães, Clementina Rodrigues e João Mendes, e teve como objeto principal a «Perceção da Saúde Mental», tendo por objetivo identificar a perceção que os responsáveis técnicos das instituições associadas da CNIS têm sobre os efeitos das contingências inerentes à Pandemia SARS-CoV2 na saúde mental de utentes e colaboradores dessas mesmas instituições.
“E, de repente, o mundo como o conhecemos parou e tivemos de aprender novamente a viver, de reinventar-nos, de perceber e aceitar que nada controlamos, que os problemas de hoje podem ser uma solução amanhã. A incerteza, o medo, o cansaço, a solidão, tornaram-se as palavras mais ouvidas nas instituições nossas associadas”, começa por escrever, na Nota de Abertura do estudo, o presidente da CNIS, lembrando que “a saúde mental foi largamente afetada pela pandemia que todos vivemos, mas que de forma brutal atingiu os mais debilitados, testando os limites das nossas instituições”.
Por isso, e para melhor as acompanhar, a CNIS quis ouvir as instituições sobre a matéria.
“Deste estudo saíram apelos claros da necessidade de investimento, formação técnica, capacitação pessoal e profissional, a necessidade de dar o salto digital e usar o que de mais novo há para facilitar e melhorar a qualidade dos serviços de proximidade”, sublinha o padre Lino Maia, reafirmando a postura da Confederação e das instituições: “Nós ouvimos, estamos atentos e estamos a dar resposta, é importante que toda a sociedade ouça também, esteja atenta e disposta a responder”.
Nas derradeiras palavras da nota introdutória, o padre Lino Maia destaca uma alteração de linguagem que emerge do estudo e que aponta para o caminho que as instituições, mas também toda a sociedade, devem seguir: “Este estudo substitui as palavras medo, frustração e solidão por capacitação, estimulação e colaboração”.
No inquérito realizado no âmbito do estudo, os investigadores obtiveram resultados com um grau de confiança de 95% e uma margem de erro de 5%. A amostra do inquérito foi de 314 respostas num universo de 1890 instituições, 16,6% correspondendo às associadas cujas respostas sociais são Estruturas Residenciais Para Idosos (ERPI), Centros de Dia (CD) e Serviço de Apoio Domiciliário (SAD).
Os principais resultados do estudo colocam em evidência, quanto à perceção da saúde mental das equipas de trabalho, em tempos de pandemia, um impacto negativo, de índole físico e psicológico. Este é expresso fundamentalmente por um desgaste, cansaço, saturação, uma menor tolerância para com assuntos menores e por um sentimento de sobrecarga de trabalho, causado pelos recursos humanos insuficientes. Apesar de tempos complicados, foram expressos impactos positivos, evidentes na visibilidade/valorização das instituições e suas equipas, relevando a sua importância, outrora esquecida. O sentimento de união das equipas, foi também um dos pontos positivos em relevo.
Já os recursos humanos insuficientes foram considerados como uma das causas responsáveis por esse cansaço, paralelamente com a ausência de respostas e o desconhecimento na ação a seguir.
Como estratégias facilitadoras para uma melhor resistência, os investigadores consideraram: a melhoria da comunicação entre instituições e entre técnicos; o apoio psicológico às equipas, concedido por profissionais externos à instituição; a aposta da formação das equipas.
Relativamente aos utentes da instituição, foram salientados impactos ao nível da saúde mental, física e social.
A nível mental, o enfoque residiu nas alterações cognitivas e no aumento da sintomatologia depressiva, entre outros. Já a nível físico, sobressai, fundamentalmente, o agravamento das patologias a nível geral. A perceção do isolamento social vivenciado pelos utentes ficou deveras evidente nos demais relatos.
Sintomático da situação é o facto de todos os participantes terem expressado que “a pandemia intensificou a deterioração da saúde mental, considerando que já existiam sinais reveladores da sua latência”. Por outro lado, nas respostas ficou destacada a perceção de um agravamento da desresponsabilização familiar para com o utente.
O estudo regista ainda que “a aposta na existência de apoio profissional e de espaços próprios, visando a partilha de vivências, emoções e sentimentos, como forma de minimizar as consequências sofridas e que permanecerão se as instituições nada fizerem”, é uma estratégia relevada pelos participantes no inquérito.
CONCLUSÕES
Das principais conclusões tiradas do estudo, os investigadores realçam que “nenhuma delas [é] totalmente desconhecida”.
E se já antes eram evidentes “os sinais de mudança da cultura institucional, da visão do mercado social, das necessidades e lacunas existentes e da inequívoca importância” das IPSS na sociedade, a pandemia “revelou-se uma oportunidade”.
Segundo os investigadores, esta é “a oportunidade de não deixar a sociedade esquecer que as instituições existem, que as suas necessidades são reais, urgentes e que representam mais-valias e ganhos muito altos para o SNS, para as famílias e para a sociedade em geral, pelo que não podem ser descuradas”.
Apesar das instituições terem “equipas técnicas resilientes, criativas e lutadoras”, capazes de liderar os trabalhadores em momentos de crise, “a saúde mental das equipas tem impacto direto na saúde mental dos seus idosos, a todos os níveis”, tendo sido “identificadas formas de promover a saúde mental e física dos idosos e aumentar a capacidade de resiliência”.
Sublinhando que a saúde mental dos idosos, e não só, “foi posta em causa”, o estudo realça que o “impacto mais elevado, mais rápido e com consequências económicas mais dramáticas para as instituições”.
Apesar de toda a motivação e empenho dos dirigentes e das suas equipas, as instituições “necessitam, contudo, de ajuda das entidades decisoras, de investimento”.
Por outro lado, o relacionamento institucional revelou vantagens com a criação de sinergias entre os organismos governamentais, Segurança Social, IEFP, movimentos civis e associativos, tecido empresarial, “que devem agora ser exponenciadas”.
Por fim, os investigadores consideram “que o embate sofrido pelo mercado social foi necessário”, pois agora a sociedade olha de forma diferente o apetecível mercado das instituições sociais, como algo com potencial de investimento.
“É o momento de investir no potencial humano das instituições, de aproveitar a evolução tecnológica, que toda esta situação alavancou, fazer uso do espírito empreendedor dos líderes institucionais para melhorar, evoluir e crescer”, recomendam os investigadores: rematando: “Fica claro neste estudo que a vontade existe, a necessidade existe, a oportunidade existe, é tempo de começar!”.
O estudo «A Saúde Mental nas Instituições Associadas da CNIS» resulta da colaboração entre a CNIS, responsável pela promoção, o Instituto Politécnico de Bragança, responsável pelo acompanhamento científico e apoio técnico, através da Escola Superior de Saúde e CeDRI, e a Addedsolutions SR, responsável pela elaboração e execução do mesmo.
O estudo pode ser consultado na íntegra AQUI.
RECOMENDAÇÕES
A situação recentemente vivida foi um acordar para a urgência de respostas a necessidades antigas:
• A falta de formação/capacitação dos recursos humanos existentes nas instituições versus a dificuldade em formar/capacitar esses mesmos recursos humanos, os custos que acarretam, a disponibilidade que implicam, a motivação que exigem;
• A necessidade de se apostar em novas contratações de recursos mais qualificados;
• A necessidade de alfabetização digital dos recursos humanos de forma a poder rentabilizar os recursos digitais que, neste momento, surgem no mercado;
• A aposta em digitalizar as instituições, sem cair no erro de querer digitalizar a humanização imperativa dos cuidados de proximidade;
• A necessidade de apostar mais e melhor nos processos preventivos de estimulação cognitiva, sensorial e motora, dotando as instituições de ferramentas adequadas às necessidades e recursos disponíveis; e capacitar os recursos humanos de competências para poder fazer transversalmente este trabalho sem prejuízo das restantes funções;
• Dotar as instituições de metodologias e ferramentas que promovam a estimulação autónoma e a rentabilização de tempo e investimento;
• Dotar as instituições de ferramentas digitais de acompanhamento, monitorização e cruzamento de informação que permitam unir todos os elos da cadeia de cuidados, facilitando, diagnósticos preventivos e fomentando uma mais fácil e ágil troca de informação;
• Dotar as instituições de equipas exclusivamente direcionadas para a promoção e manutenção da saúde mental, com programas, metodologias e ferramentas feitas à medida da pessoa idosa ou, em alternativa, encontrar no mercado soluções externas que facilitem o acesso a esses programas, metodologias e ferramentas.
Não há inqueritos válidos.