JOSÉ FIGUEIREDO, ECONOMISTA

Previsões económicas para 2023: O ano de todos os cenários

Não sei o que me deu!…
Os que têm a misericórdia de acompanhar estas minhas crónicas sabem que abomino as previsões económicas.
Há muito que tomei para mim a sabedoria de John Kenneth Galbraith, o grande economista americano da segunda metade do século XX, que dizia que fazer previsões em economia era a melhor maneira de dar credibilidade ao ofício dos astrólogos.
Na verdade, os sistemas económicos (em geral os sistemas humanos) são demasiado complexos para caber mesmo no mais sofisticado dos modelos ainda que servidos por uma capacidade de computação infinita.
É como o tempo meteorológico. Os satélites recolhem quantidades colossais de informação, os mais poderosos computadores do planeta tratam essa informação a velocidades siderais e, no entanto, não conseguimos prever o tempo com razoável segurança para mais que 3 ou 4 dias!
Talvez as minhas previsões não sirvam para grande coisa, contudo, quem sabe, o exercício não seja totalmente fútil. Quiçá, daqui a um ano, ainda nos havemos de rir em grande com os meus devaneios.
Nestas alturas lembro-me sempre das palavras que Dante parece ter visto à porta do inferno: “aqui se perca todo o medo; toda a vileza seja proscrita”. Assim sendo, sem medo, aqui vai:

Inflação

Vai descer!
Tudo indica que a inflação atingiu o pico e terá começado o ciclo descendente. É provável que a tendência descendente se acentue em 2023 à medida em que o carácter restritivo da política monetária for fazendo o seu caminho e, sobretudo, quando os efeitos de base ficarem mais evidentes.
No segundo trimestre de 2023 estaremos a comparar os preços dessa altura com os preços que vigoravam um ano antes, ou seja, preços que já estavam influenciados pela subida vertiginosa da energia depois da invasão da Ucrânia. À medida que a energia deixar de contribuir para o índice geral, este vai naturalmente baixar.
No final de 2023 poderemos ter uma inflação a rondar os 3% e uma razoável aproximação do índice geral e do índice nuclear (excluindo a energia e a comida).
O que pode correr mal aqui é a energia. A aplicação das sanções à Rússia, o teto para os preços do petróleo russo e a provável relutância da Rússia a vender gás natural para a Europa, vai obrigar a uma reorganização dos fluxos globais de matérias-primas energéticas numa dimensão nunca vista e num período muito curto.
Gás natural e petróleo russos que faziam o caminho para oeste para a Europa rica terão de encontrar novos compradores do mesmo modo que a Europa terá de encontrar novos fornecedores.
Ninguém faz a mínima ideia de como esta reorganização global vai afetar os preços ou a segurança do abastecimento.
Não é impossível uma ressurgência dos preços para níveis como os que vimos no segundo trimestre de 2022.
Se assim for, lá se vai a minha previsão…

Taxas de Juro

Vão subir!
Mesmo no cenário benigno da inflação – trajetória descendente sustentada – as taxas de juro vão subir.
Nos Estados Unidos as taxas de referência estão no intervalo 4,25% - 4,5%, na Europa estão em 2,5 %.
Para os Estados Unidos dispomos de uma informação preciosa. Os decisores da Reserva Federal publicam as suas previsões sobre o caminho futuro das taxas de juro. Não sabemos o que pensa cada decisor, mas sabemos a orientação do coletivo.
Segundo as últimas atas publicadas os decisores da FED antecipam taxas diretoras a subir até ligeiramente acima de 5% e a descer a partir de 2024.
Até onde podem subir as taxas na Europa?
Salvo qualquer surpresa desagradável do lado da inflação, algures entre 3 e 3,5% não parece impossível. Há quem alvitre máximos mais altos, no entanto, se a inflação evoluir como se prevê, ou seja, trajetória descendente e sustentada, não vejo como haja condições “políticas” para ir muito mais longe em matéria de taxas de juro.

Recessão Económica em 2023?

Sim! Quase certa na Europa, nos Estados Unidos, talvez!
Só um milagre permitiria à Europa absorver todos os choques resultantes da guerra na Ucrânia, a reorganização dos fluxos globais de matérias primas energéticas, a alta das taxas de juro e a degradação do poder de compra real das famílias, sem que isso implicasse algures uma contração do nível de atividade económica e do emprego.
Nos Estados Unidos, que atualmente são exportadores líquidos de energia, as coisas são um pouco menos evidentes, embora não possamos excluir a possibilidade de taxas de juro elevadas serem suficientes para provocar uma redução da procura agregada que leve a uma recessão.
Tenderia a dizer que não é tanto um tema de sim ou não, mas antes um tema sobre o tipo de recessão que vamos ter. Profunda e longa? Suave e curta?
Os fatores de incerteza são tantos que, neste particular, qualquer palpite não é melhor que lançar uma moeda ao ar.
Quero acreditar que apesar de tudo a probabilidade de suave e curta é um pouco maior que profunda e longa.
Não vos garanto, contudo, que a minha distribuição de probabilidades não seja mais que esse eterno (e muito humano) viés de tomarmos desejos por realidades.

Mercados Financeiros

Os mercados financeiros levaram pancada à séria em 2022. Os índices bolsistas globais recuaram cerca de 20%. Alguns tipos de ativos mais especulativos recuaram muito mais. Os títulos de dívida, pública e privada, também perderam valor devido à subida das taxas de juro.
A sangria vai continuar em 2023?
Provavelmente, sim!
Convém lembrar que o que provocou a subida irracional do valor dos ativos, em particular, dos ativos financeiros, foi, em larga medida, a colossal injeção de liquidez feita pelos bancos centrais na sequência da crise de 2008/2009 e, depois, por causa da pandemia.
Essa bolha está muito longe de estar desfeita. O que não sabemos é se os bancos centrais vão ter capacidade (escolhas politicamente aceitáveis, melhor dito) para continuar a esvaziar o balão.
Entalados entre uma inflação que resiste ao controlo e a perspetiva de uma recessão que pode ser dura, qual vai ser a função de reação dos bancos centrais? Continuar a apertar? Amaciar as políticas? Não sabemos!
Não é impossível que, no final de 2023, se o consenso apontar para o alívio das taxas de juro, os mercados financeiros possam renascer qual fénix renovada.
Não daria por garantido!
Para terminar não é uma previsão, é um desejo muito sentido – UM BOM ANO de 2023.

 

Data de introdução: 2023-01-05



















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