A acção social não é monopólio de ninguém nem pode ser politizada; no momento em que se transformar em bandeira política, acaba a acção social." Este foi um alerta da Irmã Maria Isabel Monteiro, directora da Casa Nossa Senhora do Rosário, da Figueira da Foz, em conversa com o Solidariedade. E logo adianta que "não podemos admitir que as populações sejam exploradas nas campanhas eleitorais.
Conhecedora profunda da problemática social, sector a que se dedica há muito no âmbito da comunidade das Irmãs Doroteias, a que pertence, a Irmã Maria Isabel Monteiro viu já reconhecido o valor da sua capacidade de intervenção social pelo Presidente da República, Jorge Sampaio, que lhe atribuiu uma comenda da Ordem de Mérito, em 2004, no Dia Internacional da Mulher. Maria Isabel Monteiro referiu, em resposta à questão que o SOLIDARIEDADE lhe pôs, sobre os objectivos das IPSS (Instituições Particulares de Solidariedade Social), que todas têm de ser a "consciência social das populações", criando desenvolvimento, fomentando a igualdade de oportunidades, estando sempre ao serviço dos mais pobres. No seu caso concreto, e porque a instituição que dirige - Casa Nossa Senhora do Rosário - é uma instituição católica, não pode menosprezar a acção evangelizadora.
No entanto, adianta, o facto de ser uma instituição católica, não significa que pretenda ser um "gueto", porque não fecha a porta seja a quem for. "Somos uma comunidade integradora: temos os mais pobres e temos os que têm posses, possibilitando a convivência entre todos, o que é uma urgência, hoje mais do que nunca", salientou.
Sublinhou que as pessoas "têm de sentir que todas são importantes na construção da própria comunidade", devendo as IPSS estar atentas ao contexto social em que se integram, apresentando-se com uma abertura muito grande, face às exigências dos tempos que correm. "Hoje, perante a multiplicidade de situações de necessidade, e sobretudo à grande heterogeneidade das sociedades, nós temos de estar abertos a todos, trabalhando com todos, porque a pobreza é um conceito muito lato, muito abrangente", disse.
A directora da Casa Nossa Senhora do Rosário frisa que a pobreza não se limita só à falta de recursos financeiros e económicos, mas passa também pela incapacidade das pessoas se realizarem pessoal e socialmente, pela não consciência do seu próprio valor e pela falta de auto-estima de outras tantas. Nestes casos, as instituições têm de lhes dar "ferramentas para desenvolverem as suas capacidades profissionais e pessoais", garantiu.
Depois de reconhecer que muitas vezes os trabalhadores "são vítimas do próprio sistema", quando não há ninguém que se debruce sobre eles e os ajude a descobrir "a consciência de que são pessoas", a Irmã Isabel Monteiro afirma que todo o trabalho social tem de apostar na humanização da sociedade, trabalhando em rede. Nessa linha, frisou a premência da implementação de parcerias, fundamentalmente para "rentabilizar recursos físicos e financeiros, a bem da comunidade. Isto é um desafio, mas também um grande obstáculo, porque poucos o querem fazer".
Como católica e consagrada, lembrou que o espiritual não pode estar "desencarnado da vida", e que o Evangelho tem de ser vivido "a par das pessoas". "Antes de sermos evangelizadores, temos que nos deixar evangelizar, tendo consciência da pobreza que temos; às vezes até somos ’evangelizados’ por não crentes, pessoas que têm uma grande consciência colectiva e social, o que nos faz rever a nossa posição e a coerência entre o que anunciamos e o que vivemos", acrescentou.
Salientou que "a evangelização passa pela educação", levando a pessoa a sentir que é amada por Deus e que tem de crescer em maturidade e em integridade. "O que mais nos interessa é que as pessoas tenham um sentido para a vida e que encontrem esse sentido em projectos de vida", disse.
Sobre as obrigações das autarquias neste sector, Maria Isabel Monteiro afirmou que "a obrigação é de todos e que todos têm de criar uma consciência social interventiva e activa". Contudo, garantiu que falta definir qual é o papel concreto das autarquias, das instituições, das associações e das organizações, para todos trabalharem em conjunto e de mãos dadas. Para já, recordou que há um instrumento muito proveitoso, que é a Rede Social, que poderia contribuir, em muito, para a resolução de bastantes problemas.
Denunciou, entretanto, que esse desejável e fundamental instrumento de trabalho tem sido pervertido, "quando nem todos são chamados a colaborar, quando há os que se recusam a colaborar, quando há patamares de intervenção e de colaboração diferenciados entre as instituições públicas e privadas e quando a Rede Social apenas é chamada para formalizar procedimentos, em vez de debater os problemas e encontrar soluções". Urge, então, apostar "na mudança de mentalidades e na cultura da partilha dos saberes e do conhecimento". Assim, "todos seríamos mais beneficiados; mas estamos ainda muito longe dessa consciência, quer as instituições, quer os poderes local e central", enfatizou.
Data de introdução: 2006-01-08