CENTRO SOCIAL PAROQUIAL DA VERA CRUZ

Vítimas da violência doméstica vão ter Casa Abrigo

rochamartins@hotmail.com


Por iniciativa do Centro Social Paroquial da Vera Cruz (CSPVC), de Aveiro, vai nascer uma Casa Abrigo, denominada VeraVida (Verdadeira Vida), para apoiar mulheres vítimas de violência doméstica. O edifício já foi comprado e adaptado, situa-se nos arredores da cidade, em local não divulgado, e entrará em funcionamento, provavelmente, em Novembro. A direcção do CSPVC aguarda apenas a assinatura do protocolo com a Segurança Social, para adquirir o equipamento indispensável e abrir as portas a mulheres que venham a ser encaminhadas por diversos departamentos, estatais ou outros, que certifiquem a sua qualidade de vítimas de violência. 

Em conversa com o padre Manuel Joaquim Rocha, presidente da direcção, e com a dra. Paula Hipólito, directora técnica do CSPVC, ficámos a saber que a ideia da criação de mais uma valência nesta instituição da cidade de Aveiro surgiu “pelas necessidades impostas pela sociedade”, tendo em conta que “o problema da violência doméstica dificilmente se resolve pela prevenção, no imediato”. E o padre Rocha sublinhou mesmo que esta iniciativa vem fechar um círculo no CSPVC. “Se nós temos respostas para gente mais pequena, um centro de apoio familiar e aconselhamento parental e, ainda, uma empresa de inserção social, esta valência vem completar o círculo”, sublinhou. 

A VeraVida, que se integra na rede pública de apoio a vítimas de violência doméstica, tem nove quartos para mulheres e seus filhos, se os houver, num total de 16 utentes, dispondo, também, de cozinha, sanitários, lavandaria, salas diversas, salão polivalente e gabinetes para técnicos e outros serviços. Vai contar com o trabalho de um psicólogo, de uma técnica de serviço social, de um jurista a meio tempo, de cinco ajudantes de lar e de uma administrativa. 

Centro Social Paroquial da Vera Cruz (Aveiro)Os responsáveis por aquela instituição de Aveiro frisaram que, à partida, as mulheres não podem chegar à Casa Abrigo e dizer que são maltratadas. Os casos têm de ser devidamente estudados, porque a VeraVida não é um espaço para as mulheres passarem umas noites. Em princípio, são para ali encaminhadas por diversos organismos, mas a instituição pode tomar a iniciativa de estudar algumas situações e de propor a organização do processo que conduzirá à admissão da vítima da violência doméstica nesta nova valência do CSPVC. 

Segundo o que está estabelecido, a utente pode ficar no lar seis meses, durante os quais se procura a sua recuperação e integração social, eventualmente através da formação profissional. Mas a VeraVida não fecha a porta a nenhuma mulher, se ao fim desse tempo se verificar que o processo não está concluído, garantiram os nossos entrevistados. 

Para a abertura deste equipamento, foi necessário investir 405 mil euros, verba esta que foi comparticipada em 56 por cento pelo FEDER (Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional) e em 36 por cento pela contribuição pública nacional, responsabilizando-se a instituição pelo restante. Não foram consideradas muitas outras despesas, inerentes ao estudo e desenvolvimento dos mais diversos trabalhos e projectos, da responsabilidade do CSPVC. 

A Casa Abrigo VeraVida propõe-se acolher mulheres e seus filhos que foram vítimas de violência doméstica, proporcionando-lhes acompanhamento psicológico e social, contribuir para a inserção profissional das utentes, que conduza à sua sustentabilidade financeira, e proporcionar-lhes apoio judicial e ao nível da saúde, caso não tenham recursos próprios. Pretende-se ainda assegurar aos filhos a adequada integração escolar nas próprias valências da instituição (Creche, Jardim-de-Infância e ATL), e no ensino oficial. 

Toda a acção a desenvolver implica o envolvimento de parcerias a estabelecer com o Centro Distrital de Solidariedade e Segurança Social e com outros organismos, com os quais já houve contactos, tais como a CIDM – Comissão para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres, a Câmara Municipal de Aveiro, o Centro de Emprego, o Centro de Saúde, o Hospital Infante D. Pedro, a Ordem dos Advogados, a Associação Alecrin (Vigo), e a Polícia de Segurança Pública, entre outros. 

Aqueles responsáveis pelo CSPVC contam, necessariamente, com a indispensável colaboração das empresas da região, ao abrigo da lei do mecenato, para a integração das mulheres no mercado de trabalho e para a manutenção da Casa Abrigo, “que é uma valência muito dispendiosa”, como nos sublinharam. 

Manuel Joaquim Rocha e Paula Hipólito referiram que este projecto veio responder a uma lacuna muito grande existente na região, nesta área de apoio às mulheres que sofrem as consequências da violência doméstica, até porque, no Distrito de Aveiro, segundo a APAV (Associação de Apoio à Vitima), há registados 120 casos. A cidade situa-se no 3.º lugar das que têm mais vítimas, de entre as que não dispõem de um gabinete daquela organização. 

Quanto às causas da violência doméstica - que gera mais casos de morte e de invalidez, entre as mulheres dos 16 aos 44 anos, do que o cancro, os acidentes de viação e até a guerra - , são apontadas questões culturais, o alcoolismo, algum machismo, a persistência de flagrantes desigualdades entre homens e mulheres e situações irregulares difíceis de identificar. “Há homens que ainda consideram as mulheres como propriedades suas, com direito a fazerem delas o que lhes apetecer”, adiantou o presidente do CSPVC 

Os nossos interlocutores lembraram que há “muita violência encapotada”, física e psicológica, não só nas camadas mais baixas da sociedade, mas também nas mais altas. Ao mesmo tempo, denunciaram o medo da vingança e a vergonha como razões para as mulheres sofrerem no silêncio a violência dos maridos ou companheiros, com inevitáveis reflexos na educação e formação dos filhos. Por outro lado, o receio do futuro e as dificuldades económicas, com salários que não garantem uma certa independência, impedem muitas vítimas de se queixarem às autoridades policiais e judiciárias, sofrendo até ao dia em que conseguem coragem para assumir a sua libertação, concluiu Paula Hipólito. 

Solidariedade, 21 de Setembro de 2004

 

Data de introdução: 2004-10-21



















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