MANIFESTO DA CNJP

É urgente combater a pobreza

Organizada pela Comissão Nacional Justiça e Paz , com a colaboração activa da CNIS, realizou-se em 25 e 26 de Maio, no Auditório do Colégio São João de Brito, em Lisboa, a Conferência Nacional - Por um Desenvolvimento Global e Solidário - Um Compromisso de Cidadania. O Solidariedade deixa aqui o texto final em forma de Manifesto.

1. Por ocasião da Conferência Nacional 2007 «Por um desenvolvimento global e solidário – um compromisso de cidadania», os signatários desejam convidar todos os concidadãos e concidadãs a uma tomada de posição pública acerca do grave problema da pobreza e da exclusão no país e no mundo.

2. Desejam, antes do mais, expressar a sua admiração e respeito profundos por todos quantos, de uma forma ou outra, vêm dedicando o melhor das suas vidas em favor dos mais desfavorecidos, quer entre nós, quer em tantos outros países, sobretudo nos que se debatem com situações massivas de pobreza e fome, que levam à morte. Em muitos casos, é uma dedicação total aos pobres e excluídos, por vezes com risco da própria vida.

3. Do mesmo passo, verificam que o notável esforço de quantos, pessoas e instituições, se dedicam à causa dos pobres e dos excluídos - apesar dos benefícios concretos que traz a inúmeras pessoas e sociedades e do seu valor intrínseco enquanto expressão de amor e busca da justiça - é, infelizmente, insuficiente face à dimensão que o problema assume, no mundo e entre nós. Isto revela, de modo flagrante, o défice de empenhamento que existe em confronto com aquilo que urge realizar perante tanto sofrimento e tantas mortes que a pobreza está gerando cada dia.

4. Os signatários acreditam que a pobreza e a exclusão não existem por acaso, nem se resolvem apenas com sobras ou gestos de generosidade esporádica. Reconhecem que muito tem de ser feito numa base interpessoal e directa, junto do pobre e do excluído. Mas verificam, também, que enxugar o chão, se bem que necessário, não basta para estancar uma torneira aberta. Dito por outras palavras, entendem a pobreza como um problema que reclama apoio pessoal para ocorrer às carências, mas, cujas causas só podem ser removidas modificando os factores económicos, sociais e culturais que geram os mecanismos societais que perpetuam a pobreza. São, aliás, estes mesmos factores que se opõem às indispensáveis mudanças.

5. Importa afirmar que, globalmente considerado, o mundo em que vivemos é um mundo de abundância e nunca como hoje foi tão possível erradicar a pobreza. Deve também reconhecer-se que a pobreza em Portugal não é devida à falta de recursos nacionais. O problema central reside no facto de a pobreza continuar a ser vista como um problema periférico, pretensamente resolúvel por políticas e medidas periféricas e residuais.

6. Há cerca de vinte anos que existem no País programas mais ou menos compreensivos de luta contra a pobreza, desde 1986 integrados nos programas correspondentes de âmbito europeu. Muito se aprendeu e se fez no decurso desse tempo. Ocorre, no entanto, perguntar a razão por que, não obstante esse esforço rodeado de grandes expectativas, persistem situações como as seguintes:

• a taxa de pobreza no País tem-se mantido quase constante, à volta dos 20%, taxa que corresponde a cerca de 2 milhões de portugueses;
• durante o período de 1995-2000, passaram pela pobreza (em pelo menos um ano) 47% das famílias portuguesas, dentre as quais 72% foram pobres durante 2 ou mais anos;
• 40% dos representantes desses agregados familiares eram pessoas empregadas por conta d’outrem ou por conta própria e a percentagem de reformados era superior a 30%;
• é anormalmente elevada, no contexto europeu, a transmissão geracional da pobreza.

7. Perante esta realidade, parece incontornável a conclusão de que a maior parte de quanto se vem fazendo, cujos benefícios se não devem subestimar, não só evidencia ineficiência na aplicação dos recursos como permite deduzir que passa ao lado das reais causas da pobreza em Portugal, no pressuposto, porventura inconsciente, de que a pobreza é erradicável mantendo inalterados os modelos económico, cultural e de poder da sociedade portuguesa.

8. Os signatários não ignoram os problemas económicos e financeiros que o País atravessa, nem subestimam a relevância das dimensões supranacionais (europeia e mundial) de algumas alavancas em que é necessário intervir. O que rejeitam é o dogmatismo do «pensamento único». Reconhecem que as condicionantes existentes não determinam soluções únicas. Existem espaços de liberdade onde a intervenção humana, individual e colectiva, é possível e necessária.

9. Entendem que, numa sociedade com pobreza persistente e de longa duração, como é a portuguesa, é necessário intervir, simultaneamente, em três frentes:
a) - Em relação aos empobrecidos, há que ocorrer às carências mais graves, relacionadas com a não satisfação de necessidades humanas básicas, vencer os bloqueios culturais e comportamentais que a pobreza persistente gera nos pobres, comprometendo a sua capacidade de vencer a situação e de utilizar os meios postos ao seu dispor e, ainda, ajudar o pobre a (re)conquistar a sua autonomia em matéria de recursos, o que implica que esteja apto a ganhar a sua vida de uma das formas consideradas normais na sociedade em que vive.
b) – Integrar, nas diferentes políticas públicas, objectivos, estratégias e instrumentos que visem a remoção das causas estruturais da pobreza e da exclusão.
c) - Promover a mudança de mentalidade dos não-pobres, superando preconceitos acerca da pobreza e suas causas e estimulando comportamentos mais solidários.

10. Os signatários consideram que a pobreza constitui uma grave negação dos direitos humanos fundamentais e das condições necessárias ao exercício da cidadania, situação que reputam eticamente condenável, politicamente inaceitável e cientificamente injustificável.

11. Por isso, convidam todos os portugueses e portuguesas, para um compromisso colectivo que vise:
• Influenciar os órgãos de soberania no sentido de aqueles incluírem nas suas
agendas o objectivo da erradicação da pobreza no mais curto período de tempo;
• Pressionar o governo para a adopção de níveis de salários, pensões mínimas e prestações sociais que não fiquem aquém do limiar da pobreza e bem assim para que sejam feitos esforços no sentido de uma maior eficácia e eficiência das transferências sociais e demais políticas sociais.
• Incentivar a sociedade civil para que se multipliquem as acções de proximidade em favor dos mais pobres e se desenvolvam atitudes e comportamentos de maior justiça social e solidariedade.

12. Em particular, das Igrejas cristãs, suas organizações e comunidades, assim como de outras confissões religiosas, os signatários esperam um empenhamento particularmente activo e responsável que seja expressão de autenticidade do amor e da busca de justiça que os anima.


Lisboa, 26 de Maio de 2007

 

Data de introdução: 2007-06-13



















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