A Associação Portuguesa de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental (APPACDM) de Aveiro foi a décima terceira das cerca de trinta APPACDM’s criadas a nível nacional. Surgiu na cidade em 1986. De um edifício pré-fabricado cedido pela Câmara Municipal, em 1992, esta instituição particular de solidariedade social (IPSS) passou para uma construção de raiz num terreno localizado em Azurva.
Actualmente apoia sessenta pessoas portadoras de diferentes deficiências. Há onze anos que Lília Rosmaninho, psicóloga, desenvolve um trabalho junto de pessoas com graves dificuldades mentais, motoras, auditivas e visuais. A instituição apoia ainda as Escolas de Eixo e de São João de Loure. “Apoiamos jovens com necessidades educativas especiais que possuam problemas de aprendizagem. Desenvolvem uma ou duas vezes por semana actividades na APPACDM”, afirma a psicóloga.
Na sala dos golfinhos conhecemos a Helena que sofre de surdez profunda. Tem 54 anos e é a utente mais velha da instituição. O seu sorriso genuíno revela uma extrema simpatia. “Ela é muito perspicaz, pois facilmente nos entende e facilmente se faz entender”, explica a psicóloga enquanto acarinha a utente.
Como sistema de comunicação alternativo para os utentes que desconhecem a comunicação verbal, como é o caso da Helena, na porta de cada sala, por todo o edifício, há uma fotografia que simboliza um gesto. Assim, um aluno “quando quer ir para a sala dos computadores, por exemplo, vê a fotografia e sabe que é ali”, explica a psicóloga. Esta é uma das várias preocupações dos responsáveis que aspiram a tornar o mais normal possível a vida dos utentes, com diversas problemáticas, ensinando “competências sociais e pessoais”.
Em termos de valências, a APPACDM possui dois Centros de Actividades Ocupacionais (CAO), que albergam pessoas que “não têm a possibilidade de virem a ser integradas numa área de formação profissional”, explica a psicóloga. Uma dessas actividades consiste no fabrico de carpetes, cortinados, individuais de mesa, criados pelos utentes e vendidos ao público em geral, a preços “demasiado acessíveis”. “O ritmo de trabalho deles é menor, mas são trabalhos muito engraçados e temos uma lista de espera muito grande. Dos trabalhos vendidos 90 por cento do valor do trabalho reverte a favor do utente e 10 por cento para fundo de maneio da própria sala”, sublinha orgulhosamente Lília Rosmaninho.
Na sala de cerâmica encontramos outros grandes artistas que, no momento da criação das suas obras, conseguem transcender as suas capacidades individuais. Conhecemos uma das utentes mais antigas. Chama-se Sónia.
Inicialmente trabalhou na cerâmica que deixou por motivos de saúde. Apesar de possuir alguns traços de autismo consegue, com grande precisão, desenhar cada traço no painel. “O que mais gosto é de pintar painéis. Primeiro desenho, depois pinto e vai para coser para ser levado para a TGV”, uma loja situada na Estação de Aveiro. Sónia tem a consciência de que alguns dos seus trabalhos são vendidos para essa loja. “Eu gosto deste”, diz apontando para o painel que retrata a imagem do pescador de Aveiro. Aos 30 anos pode orgulhar-se de inúmeros trabalhos feitos como, por exemplo, presépios e bijutarias.
Além do CAO a APPACDM tem três lares residenciais que se encontram divididos consoante o grau de dificuldade dos utentes. O lar no Bairro de Santiago alberga doze rapazes, dos 20 aos 39 anos, com “dificuldades ao nível das competências académicas”. O outro lar residencial está localizado em São Bernardo que acolhe dez raparigas dos 14 aos 46 anos. Em Dezembro de 2006 a terceira residencial foi inaugurada na Costa do Valado, um espaço misto que alberga 16 utentes com maior grau de dependência.
“Estamos abandonados”
António Dias, presidente da APPACDM desde 1997 também foi contaminado pelo espírito de solidariedade. Inspirado pela filha, também ela utente, António Dias revê nela o grande impulso para continuar a exercer o cargo.
Não esconde algum desânimo e até revolta e deixa um alerta: “vejam com outros olhos a deficiência em geral”, culpando o Governo pela actual crise na instituição. “Eu gosto muito disto. Só não gosto ultimamente do que se está a passar a nível de governos. Sentimo-nos abandonados e esquecidos. Falam muito em integração mas é um falar gratuito, nem a Lei do Mecenato funciona”, lamenta-se.
A precariedade de verbas e incentivos têm dificultado a conclusão de um centro ocupacional mesmo em frente à Associação. “Nós temos aqui esta obra começada e não concluída pois não há acordos para funcionar. É este o grande desafio que temos agora em mãos pois foram muitos milhares de contos envolvidos e é uma obra que se está a degradar de dia para dia. E ainda temos por resolver compromissos assumidos por uma obra acabada em Dezembro”, diz o director referindo-se ao lar residencial da Costa do Valado que abrange cerca de 16 utentes com elevado grau de dependência.
“Tem sido muito difícil. Se calhar teremos de fazer cortes de pessoal porque está a ser pesadíssimo neste momento e teremos de fazer uma reflexão muito séria sobre isso. Não podemos continuar como estamos. Quem nos tutela que olhe para a nossa causa ou teremos de forçar outras medidas”, antevê o director que completará 60 anos em 2008, esperando ser esse o ano de viragem para a instituição.
Data de introdução: 2007-07-06