OPINIÃO

A Serpente Emplumada

1 - Em 1519, o conquistador castelhano Hernán Cortez entrou no território que é hoje o México, destruindo as civilizações pré-colombianas que povoavam essas terras e consumando, ao cabo de três anos, a ocupação e a conquista dos reinos nativos.
A civilização principal era a dos Aztecas, como sabemos do liceu ou dos livros de divulgação que procuram dar-nos explicações simplificadas dos grandes enigmas da História.

A capital do reino Azteca, Tenochtitlan, caiu em 1521 e, segundo a explicação hoje dominante, a conquista fácil de uma civilização tão pujante ter-se-á devido ao facto de os Aztecas pensarem que o castelhano Cortez seria uma reencarnação de seu deus, Quetzalcoatl – a Serpente Emplumada -, cujo regresso sob a forma de um homem branco, barbudo e de olhos claros, como era fisicamente o conquistador, as lendas previam.
Tardaram, portanto, a aperceber-se de que o castelhano nada tinha de divino e que o que pretendia era enviar para o Imperador Carlos V o ouro e as demais riquezas do planalto dos Maias e dos Aztecas, como o milho, o chocolate e as batatas – e desguarneceram as defesas.

Hoje, a investigação científica avança, a par dessa, com outras explicações para a rápida decadência dos reinos nativos, sugerindo que os europeus terão contaminado os habitantes com doenças do Velho Continente (especialmente a varíola), que teriam dizimado a população azteca - cujos nativos não tinham qualquer imunidade - e acabando por provocar a sua rendição, em 1521.
Quetzalcoatl era um deus dos antigos, sedento de sangue e de sacrifício de vidas humanas.
É ele que agora nos devolve, sob a forma de gripe mexicana, a pandemia que o Ocidente exportou para o seu povo há 5 séculos.

2 – Por aqueles mares do Atlântico Sul e do Pacífico que, dum lado e doutro, banham o México, andou o nosso Fernão de Magalhães, ao serviço do rei espanhol, o Imperador Carlos V, a dar a volta ao mundo.
(Curiosamente, a sua armada partiu de S. Lúcar de Barrameda, na foz do Guadalquivir, no mesmo ano de 1519 em que Cortez invadiu o México.)
O estreito que, no extremo meridional da América do Sul, assegura a passagem do Oceano Atlântico para o Pacífico leva ainda hoje o nome de Estreito de Magalhães.
Foi também o nome do navegador que o Governo Português foi buscar para baptizar o computador Magalhães – o nosso sucesso tecnológico.

Com o sentido de oportunidade que todos lhe reconhecem, o Primeiro-Ministro José Sócrates, quando foi à última Cimeira Latino-Americana, em El Salvador – separado do Sul do México pela escassa Guatemala -, não deixou de apresentar o seu Magalhães aos Chefes de Estado e de Governo dessas Américas Central e do Sul onde espanhóis e portugueses deixaram descendência e língua, evocando os feitos desse nosso Magalhães morto na viagem e cujo fantasma ainda percorre aqueles sítios que lhe tornaram o nome eterno.
(Também por lá paira a sombra antiga do deus Quetzalcoatl.

Se formos ver aos mapas, lá daremos, na Guatemala, entre o México e El Salvador, com a cidade de Quetzaltenango; e, mesmo em El Salvador, junto da capital, San Salvador, figura a cidade de Quetzaltepeque.)
Os leitores estarão lembrados do Primeiro-Ministro a atirar o Magalhães ao chão – o computador, não o navegador –, para o mostrar indestrutível (ainda o computador).
O problema é que o Magalhães – blindado, resistente, determinado, teimoso, como o dono - apanhou, nessa sua viagem às Américas, o vírus da gripe mexicana.
E trouxe-o para Portugal.

3 – É por isso que é injusto, como faz a Oposição – e os pais das crianças de Castelo de Vide -, criticar o Governo por o tempo de antena do PS transmitir imagens de alunos de escolas de Castelo de Vide, que foram recolhidas a mando do Ministério da Educação, a elogiar o Magalhães-computador.

Já veio o Primeiro-Ministro, num escusado e imprevisto exercício de humildade, pedir formalmente desculpa aos pais das crianças, por o PS ter utilizado esses materiais de propaganda que eram do Governo.
É que o Primeiro-Ministro não teve culpa nenhuma.
Nem se percebe que a Ministra da Educação – ela própria - tenha vindo a terreiro reconhecer que o que se passou foi um erro.
Mas o Ministério de Educação comete erros?
É que nunca ninguém deu conta.
Um erro de comunicação, como lhe chamou.
Que erro?

Alguém acredita que haja comunicação entre o Governo e o PS, em matéria de serviço público e que o Governo municie o partido que o sustenta com informação privilegiada?
Inside trading, creio que é assim que se chama…
Se não há contaminação, se não há comunicação, entre as duas entidades, como todos sabemos, não pode haver erro de comunicação!
Não, também não foi erro de comunicação entre o Governo e o Partido.
Não foi o Governo que deu ao Partido informação que não devia.
O agente foi o Magalhães, foi o vírus.
Foi o contágio.

*Presidente da Associação Ermesinde Cidade Aberta

 

Data de introdução: 2009-05-05



















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