EDITORIAL

Orçamento da crise ou do défice?

Os diagnósticos são mesmo duros, o défice já atinge máximos históricos, a crise só tenuemente parece abrandar e as ameaças das empresas de rating pairam persistentes e consistentes. Depois de um ano marcado por muitas eleições com múltiplas envolvências, o País deparou-se com um cenário nada benigno para a elaboração de um orçamento do Estado.
Com apoio parlamentar minoritário, o Governo sentiu bem as dificuldades de uma conjuntura que de efémera já sobejamente mostrou nada ter. Não podendo atribuir culpas ao anterior Governo e não podendo ou não querendo ainda decretar o fim da crise, começou por fazer subir a fasquia para depois ensaiar alguns ténues desafios e, finalmente, corresponder aos convites mais ou menos encomendados para dialogar. Apesar de nem todos os Partidos serem tratados de forma idêntica (uns interessam agora, para outros interessarem um pouco depois), como era de esperar, todos eles souberam assumir as suas responsabilidades. E tudo parece estar conjugado para que o Orçamento de Estado para 2010 seja votado favoravelmente na Assembleia da República.
Afinal, um Parlamento com uma distribuição de assentos bem mais homogénea que o anterior também parece ser virtuoso. E o diálogo nas lides do poder ou nas suas orlas, outrora laureado e ultimamente nem sempre bem tratado, reocupou um nobre espaço. Parece serem idos os tempos da infalibilidade e da intransigência e bem-vindos os tempos dos envolvimentos. Regista-se e saúda-se!


2. Um orçamento do Estado não é unicamente um instrumento para a manutenção do aparelho estatal. É isso mas não apenas isso. Também é (ou deve ser) orçamento para colocar todo o aparelho ao serviço de Portugal e dos portugueses e um instrumento para fazer rumar. E há uma certeza que não pode ser escamoteada: quando fica muito caro manter um Estado, não pode sobrar o bastante para que ele sirva de grande monta. E o presente orçamento e os que nos próximos anos lhe seguirão parece que terão de ser mais para manutenção do Estado que para serviço do País.
Apesar da dramatização do discurso de contenção orçamental e de rigor a que se assistiu, pelo que se vai vendo, o Orçamento do Estado para 2010, numa primeira análise, é apenas uma pequena amostra das medidas de austeridade a que o País virá a assistir durante os três anos seguintes, já que não faz muito mais do que dar a partida para mais um ciclo de austeridade.

Os sinais já aí estão. Há reformas e compromissos que pareciam solenes mas que ficam ameaçados, o que faz pensar que isto de reformas e compromissos são um pouco como os amores: eternos enquanto duram ou enquanto não são substituídos. O défice começa o seu processo de redução com a ajuda de receitas extraordinárias e com cortes nas despesas com pessoal (com o congelamento de salários e a limitação de novas entradas na função pública). As receitas não fiscais e as despesas de capital dão o seu contributo. Os encargos com as rodovias diminuem mais do que estava previsto (com o encaixe com portagens reais em mais auto-estradas que deixam de ser “sem custos para os utilizadores” e com uma espécie de anúncio do fim do “ciclo das estradas”). As verbas destinadas ao Rendimento Social de Inserção (RSI) e ao subsídio de doença vão diminuir, enquanto os montantes inscritos para o subsídio de desemprego, abonos de família e Complemento Solidário do Idoso (CSI) vão aumentar. Os prémios dos jogos e das apostas serão desagravados, enquanto o plano de investimentos e de despesas de desenvolvimento da administração central (PIDDAC), que representa mais de metade do investimento público, sofre uma queda, apesar de se prometer investir mais (não se sabe muito bem como).
Estas são algumas das marcas gerais. Umas para aumentar as receitas, outras para diminuir as despesas, algumas para serenar as mentes.
Também por ali há marcas sociais, mas algo disseminadas. Aliás, a opção por um Estado Social parece já ter sido mais determinada.


3. Nos últimos anos, os orçamentos têm sido pautados, alternadamente, ora pelas crises sucessivas ora pela necessidade de fazer emagrecer o défice.
Agora a meta está traçada: é 2013, altura em que o défice não pode exceder os 3%. Depois, muito provavelmente, virá outra crise.
Continuará o vaivém permanente com ciclos cruzados de crises e combates ao défice?
A história demonstra a grande capacidade dos portugueses quando desafiados por desígnios nacionais. Envolventes mas claros. Talvez a falta deles é que nos esteja a fazer mergulhar nestes teimosos ciclos.
Não sendo um orçamento do Estado um desígnio nacional, ele poderá e deverá também ser um instrumento ao serviço de desígnios nacionais. Que faça rumar sem tibiezas.
Mas é imperioso e urge que sejam desfraldados esses grandes desígnios: com ideias empolgantes, com ética mobilizadora, com envolvimentos colectivos, com agentes reconhecidamente enobrecedores. Sempre com respeito pelos valores que nos identificam como povo com passado, responsável no presente e a construir o seu futuro.
Há que construir ideias. Há que envolver pessoas. Há que colocar ao serviço das ideias e das pessoas os instrumentos necessários. Há que semear a confiança e há que saber merecer a confiança.



Padre Lino Maia, Presidente da CNIS 

 

Data de introdução: 2010-02-06



















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