COOPERAÇÃO 2010

Não é o Protocolo desejável, mas é o Protocolo possível

A assinatura do Protocolo de Cooperação 2010, que decorreu poucos dias antes do Natal, ficou marcada pela questão do IVA Social, um benefício que as IPSS lhe vêem ser retirado a partir de 1 de Janeiro de 2011. De resto, todos os discursos convergiram no destaque do espírito de compromisso que norteou as difíceis negociações.

Se do lado do Governo o primeiro-ministro e a ministra do Trabalho e da Solidariedade Social omitiram a questão candente do IVA Social, nos seus discursos na cerimónia de assinatura do Protocolo de Cooperação 2010, os três representantes das organizações do sub-sector da Economia Solidária fizeram dessa questão a pedra de toque das suas intervenções. O presidente da CNIS, padre Lino Maia, solicitou mesmo um novo enquadramento legal que, no mínimo, equipare as instituições de solidariedade às autarquias, que apenas pagam 6% de IVA.

“O que se passou relativamente ao reembolso do IVA veio demonstrar que o sector da Economia Social em geral e particularmente o sub-sector da Economia Solidária talvez careça de novo enquadramento legal”, referiu o padre Lino Maia, justificando: “Quando cooperam com o Estado, as instituições de solidariedade estão a implementar direitos sociais reconhecidos e garantidos pelo Estado com serviços sociais para cuja harmonização já foram cobrados impostos. Não é ético, nem justo cobrar novos e mais impostos, com a implementação de direitos sociais com serviços sociais, onerando e tornando mais difícil o desempenho daqueles que cooperam sem fins lucrativos e, sobretudo, solidariamente na harmonização de um futuro de cooperação para a inclusão e para uma melhor justiça e equidade social”.
Para o presidente da CNIS, “não se trata de dispensar benefícios ou distribuir arbitrariamente privilégios, mas de enquadrar a cooperação na ética da harmonia”, por isso, defende: “Urge fazer caminho para o estabelecimento de um novo enquadramento legal que garanta, pelo menos, a equiparação das instituições de solidariedade sem fins lucrativos às autarquias com o IVA a 6%. Não se trata de um privilégio, mas de uma correcta interpretação da filosofia de cooperação”.

ACORDO DIFÍCIL MAS CONSENSUAL

Todos os intervenientes fizeram questão de salientar as dificuldades das negociações, mas todos saudaram igualmente o final consensual que se alcançou.
“Não foi fácil”, começou por dizer a ministra do Trabalho e da Solidariedade Social, Helena André, referindo: “Fomos capazes de estabelecer em conjunto as linhas de cooperação estratégica entre as Uniões e o Estado e, sobretudo, ter o objectivo de apoiar as famílias e os mais desfavorecidos. Este acordo é significativo quando resulta de um consenso entre os parceiros e quando se tem a noção de que, no momento em que enfrentamos dificuldades no País, vai criar condições para podermos continuar a melhorar a forma como servimos os nossos cidadãos e continuar a facilitar a igualdade de oportunidades de acesso a equipamentos e a serviços sociais e de solidariedade social, promovendo a coesão social no nosso País”.
O padre Lino Maia, a este propósito foi um pouco mais incisivo, dizendo que apesar de assinado em época natalícia, o acordo “não é uma prenda de Natal”.

“Para se chegar ao dia de hoje, a assinatura do Protocolo de Cooperação 2010, o esforço foi longo e grande. Pelo caminho houve manifestações de aspirações e de necessidades por satisfazer, houve negociações, houve cedências de ambas as partes, mas houve diálogo”, sublinhou o presidente da CNIS, realçando a “determinação” do secretário de Estado da Segurança Social, Pedro Marques, que negociou com “lealdade e corajosa persistência”.
Depois de destacar “a comunhão estabelecida entre as três organizações do sector, a União das Mutualidades, a União das Misericórdias e CNIS”, o padre Maia sustentou: “Esta não era decididamente a nossa proposta de Protocolo, como também não era a proposta apresentada pelo Governo. Este não é o Protocolo desejável, mas é o Protocolo possível”.

GOVERNO FAZ BALANÇO POSITIVO

Inicialmente prevista para o Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, a cerimónia de assinatura do Protocolo de Cooperação 2010 foi transferida, à última hora, para o Centro Cultural de Belém, por demanda do primeiro-ministro José Sócrates que, com a sua presença, quis “sublinhar a importância do acordo”.
O líder do Governo saudou “o espírito de compromisso e de diálogo entre o Estado e as Uniões”, frisando: “É com este espírito de compromisso, de diálogo e de concertação que se serve melhor o País”.

Para José Sócrates, o acordo “é também, claramente, um sinal de que o País quer fazer um esforço de concertação e de diálogo que permita que as políticas de solidariedade para o próximo ano sejam melhores”.
O governante aproveitou a ocasião para, em jeito de balanço, registar a maturidade do estado social português: “Em 2005, o Estado despendia cerca de 17,5% da sua riqueza com as prestações sociais, mas em 2010 vamos investir 21,5%. Isto é um número europeu e atesta o nível de maturidade do nosso estado social. Em 2011 investiremos mais de 6000 milhões do que o Estado investiu em 2005 em matéria de protecção social. Isso quer dizer que evoluímos e melhorámos e quem está no terreno sabe do que falo. E evoluímos e melhorámos muito, em particular, a nível de equipamentos”.

Por seu turno, a ministra Helena André salientou o “esforço significativo do Estado neste investimento que tem feito na solidariedade social”.
“Os valores da cooperação têm aumentado exponencialmente, mais de 30% nos últimos seis anos, e mesmo se hoje estamos a falar de um acordo em que não temos aumentos nos valores nominais da cooperação, continuamos a ter para 2011 um aumento de 2% e vamos ter no terreno mais de 1200 milhões de euros que servem sobretudo para apoiar as pessoas”, reconheceu a ministra, destacando: “Um aspecto fundamental é fazermos tudo isto contribuindo para a sustentabilidade das instituições. Sabemos que as instituições não prestam só um serviço de qualidade aos nossos concidadãos, mas elas também são geradoras de emprego, dois aspectos fundamentais para que asseguremos sempre a sustentabilidade das instituições”.
No retrato da situação actual, o presidente da CNIS não deixou passar o momento sem lançar um olhar ao futuro, pedindo empenho a todos.

“Resolvida, e bem, a questão do reembolso do IVA das obras em curso ou das obras de candidaturas aprovadas, impõem-se passos de coragem e de futuro próximo”, recordou o padre Lino Maia, realçando a responsabilidade das IPSS por 66,5% da Economia Solidária para afirmar: “O caminho faz-se à medida que se vai caminhando, mas é urgente continuar o trabalho de aprofundamento da filosofia de cooperação, porque não somos apenas responsáveis pelo que fazemos, mas também pelo que deixamos de fazer”.
Por isso, e porque nunca é demais vincar a identidade e autonomia das IPSS: “Tudo isto é susceptível de negociações, de conquistas e de cedências, excepto a nossa natureza e essência, que advém de sermos de natureza privada, actuarmos sem fins lucrativos com objectivos de solidariedade social e de interesse público. Diz-se que devemos rezar para pedir milagres, mas para obter resultados, sobretudo, é preciso trabalhar. Vamos canalizar as aspirações não cumpridas nas energias dos passos que iremos dar em prol dos mais desfavorecidos”.

INOVAÇÃO E IMAGINAÇÃO NAS RESPOSTAS

Em declarações ao Solidariedade, o secretário de Estado da Segurança Social, Pedro Marques, principal interlocutor do Governo nas negociações do Protocolo de Cooperação 2010, esta foi “uma negociação mais intensa e demorada, mas muito positiva”.
O governante sublinhou as inovações introduzidas neste Protocolo, como forma de contornar as restrições financeiras a que o Governo estava obrigado.

“Como os recursos não permitiam aumentos muito grandes, neste momento o que tínhamos e podíamos fazer fizemos, que foi, mantendo genericamente os valores em causa, ser mais imaginativos na gestão das respostas e da cooperação, dar também mais sustentabilidade às instituições e apoiar mais pessoas carenciadas”, sustentou o secretário de Estado da Segurança Social.
Segundo Pedro Marques, a negociação “foi alargada a muitos domínios, alguns que nem sequer são domínios tradicionais da negociação do Protocolo anual”.

Destacando a “imaginação” de todos na elaboração do Protocolo, pois foi apenas possível registar um aumento de apenas 2% nas verbas para o próximo ano e a manutenção dos valores nominais por utente, Pedro Marques concluiu: “Demos estabilidade e perenidade à relação de cooperação, mas também com inovação em domínios que habitualmente não tocávamos. Num quadro de estabilidade de recursos, porque não havia margem para aumentá-los muito, demos uma série de passos, com inovação e imaginação, numa negociação mais intensa e demorada, mas que foi muito positiva”.

DESTAQUES DO ACORDO

O Protocolo de Cooperação 2010 define as grandes linhas de orientação subjacentes à cooperação estratégica estabelecida entre o Estado e as IPSS, assente nos princípios de uma parceria público-privada e no compromisso de partilha de objectivos, interesses comuns e responsabilidades, e do documento destacam-se os seguintes aspectos: mantêm-se inalterados os valores da comparticipação financeira da Segurança Social; é revisto o modelo de comparticipação em lares de idosos, mantendo o equilíbrio e reforçando o acesso dos mais carenciados a estes equipamentos num quadro de sustentabilidade das instituições; consagra-se uma reserva de vagas, em acordos de cooperação celebrados de novos equipamentos com vista à colocação de idosos com menos recursos e indicados pelos serviços competentes da Segurança Social; através de despacho conjunto dos ministérios do Trabalho e da Solidariedade Social e da Saúde será garantida a admissão prioritária de utentes provenientes de lares de idosos com acordo de cooperação até ao máximo de 10 % da capacidade das unidades de internamento de longa duração e manutenção da rede nacional de cuidados continuados integrados.

Com o objectivo de melhorar a gestão dos equipamentos sociais de gestão directa acorda-se a transferência gradual da gestão dos estabelecimentos integrados, nomeadamente das IPSS, Misericórdias e Mutualidades; reforça-se o princípio da flexibilidade e simplificação de algumas exigências que não prejudiquem a qualidade das respostas sociais, nomeadamente na de creche, assumindo-se o compromisso de rever o respectivo normativo no prazo de 30 dias após a assinatura do presente protocolo.

Na resposta social Lar de Idosos, acorda-se a revisão dos requisitos legais em vigor, tendo em vista, designadamente, a harmonização das condições previstas para as estruturas residenciais de maior dimensão, em particular no que respeita à percentagem de quartos individuais. Nos equipamentos sociais com acordos de cooperação que sofram obras de requalificação e que legalmente não necessitem de licença camarária, acorda-se a não exigência da celebração de novos acordos mas tão só a sua actualização quanto à capacidade. A criação no prazo de nove meses, no âmbito da estratégia nacional para a energia 2020 (N2020) e no quadro da legislação no quadro da micro e da mini geração de um plafond específico de potência reservado a projectos apresentados por IPSS.

Pedro Vasco Oliveira (texto e fotografia)

 

Data de introdução: 2011-01-07



















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