Ainda no rescaldo do I Congresso Nacional do Instituto da Droga e Toxicodependência, forum de debate sobre a avaliação das políticas de combate à toxicodependência e oportunidade para repensar estratégias de intervenção, julgo adequado partilhar com os leitores do SOLIDARIEDADE algumas reacções que esta temática me despertou.
Sem valorizar demasiado as estatísticas, julgo, porém, que ninguém poderá ficar indiferente ao saber que 50% dos toxicodependentes ainda não foram abordados por ninguém que procurasse interessar-se por esta “doença” (é assim que agora se trata o fenómeno, e bem!).
Sabermos que em 1999 existiam cerca de 12,3% de jovens com 16 anos que eram consumidores e que em 2003 esse número se elevou para 17.7% , é preocupante!
O novo responsável político por esta problemática, Nuno Freitas, afirma querer comprometer-se numa “boa mudança” em relação à abordagem destes fenómenos, pormenorizando que, “entre o que há a mudar, está a abordagem de índole técnico-científica, que deve sair da esfera política e ir mais fundo. O Presidente do IDT defende também que é necessário encontrar respostas mais “simplistas” (deve ser mais básicas), abrindo as complexidades do fenómeno da droga às suas CAUSAS”.
Se, efectivamente, há a intenção de sair da esfera política para ir mais fundo, há que tirar consequência desta manifestação de vontade, “despolitizando opções e competências” e criando condições para um maior envolvimento das instituições que no seu dia-dia no território onde intervêm socialmente, se cruzam com estes milhares de jovens que andam de mal com a vida, buscando numa seringa ou em qualquer outra droga da nova geração, a razão de viver, que a família e a sociedade muitas vezes lhe não conseguem oferecer.
É evidente que não podem contar com instituições de solidariedade para “escorraçar e esconder de quem passa, os portadores desta doença!”
Não queira, porém, o Senhor Presidente, adoptar o projecto Porto Feliz, da Fundação para o Desenvolvimento Social do Porto como “filosofia de intervenção de referência” na prevenção, no tratamento e na reinserção de pessoas toxicodependentes!
A par de êxitos de recuperação que são de saudar, bem assim como do forte empenho na identificação e combate aos traficantes, em colaboração com a Autarquia e a Polícia, o modelo adoptado para abordar e recrutar os candidatos a tratamento dá um pouco a impressão de que se trocou a “despenalização” por uma “certa recriminação” das pessoas portadoras de toxicodependência, que não deverá servir de inspiração a outras formas de intervenção.
Abra-se a outras boas práticas que outras Instituições há muito tempo vêm adoptando, mesmo que pouco mediatizadas e com muito menos dinheiro para investir na recuperação da dignidade das pessoas apanhadas por esta doença.
Boas estratégias sem novas atitudes serão como óculos sem lentes!
Há uma atitude prévia que cada técnico ou não técnico terá de provar ter para poder intervir nesta problemática: um respeito sagrado pela dimensão humana deste flagelo, a consciência interiorizada de que por detrás de um farrapo humano que dá mau aspecto e até pode criar confusões sociais, há uma pessoa, revestida de dignidade humana.
maia@paroquia-areosa.pt
Data de introdução: 2004-12-15