Realizaram-se recentemente eleições parlamentares no Canadá. O triunfo do partido liberal não constituiu propriamente uma surpresa, já que, ao longo da história relativamente curta deste país, ele tem vencido a maioria dos confrontos eleitorais com o partido conservador. Mas nos últimos tempos, uma outra formação apareceu neste jogo eleitoral: o chamado partido do Québec.
O Québec é uma das dez províncias do Canadá, sujos habitantes, cerca de oito milhões, falam francês. Trata-se da mais significativa das especificidades culturais que fazem deste território uma nação, uma especificidade a que se deve juntar uma outra: a religião católica. Língua e religião fazem pois desta província uma “ilha” francófona e católica, num estado que é maioritariamente anglófono e protestante.
Foi em 1950 que surgiu e começou a crescer, no Québec, um movimento de afirmação nacionalista que rapidamente se transformou em movimento separatista. Com o objectivo de consagrar a independência, realizaram-se mesmo dois referendos, um em 1980 e outro em 1995. Em ambos os casos, e contra a maioria das sondagens, acabou por vencer, embora por diferença mínima, o não à independência que ficou adiada para uma oportunidade mais favorável. A última consulta eleitoral seria pois uma boa ocasião para o povo do Quebec se manifestar, de novo, relativamente a este anseio, até porque um dos partidos em luta era precisamente um partido independentista. Aconteceu, no entanto, que este sofreu uma derrota clara.
Foi uma derrota contra a corrente, se tivermos em conta as tentações de separatismo que parece terem invadido muitas regiões do mundo, a começar pela Crimeia, embora este não seja um caso exemplar, por se tratar de uma separação com vista à sua integração na Rússia. Mas a Ucrânia corre ainda o risco de perder outra parcela do seu território, a avaliar pelas movimentações que se vão desenvolvendo na sua região leste, com a exigência de mais um referendo que pode ter o mesmo desfecho da Crimeia.
Depois, temos o caso da Escócia, ainda em processo evolutivo, mas que pode acabar na sua saída do Reino Unido. E a unidade de Espanha corre também sérios riscos com as tentações independentistas da Catalunha. E poderíamos acrescentar ainda outros exemplos mais ou menos sérios ou caricatos. A própria Itália, cujo processo de unificação ainda não tem século e meio, assiste a manifestações, pelo menos folclóricas, a exigir o regresso ao passado, como está acontecer na região de Veneza.
Os movimentos da História passam dialecticamente por fases de integração e de separatismo, mas a tentação do separatismo parece hoje mais forte do que a necessidade da integração. O resultado das eleições no Quebec é pois contra a corrente.
António José da Silva
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