Um relatório da Provedoria de Justiça (PJ) alerta para a "grave" situação de abandono a que estão sujeitos os idosos nos lares dos Açores por parte das suas próprias famílias. "Mais grave do que o desconhecimento ou mesmo o distanciamento existente entre a Administração Pública e os lares, foi a situação de abandono a que os familiares votavam os seus próprios idosos", detectou a Provedoria numa fiscalização a 21 das 24 estruturas do género do arquipélago.
Segundo o documento, a presença dos familiares dos utentes nos lares "era quase sempre, se não inexistente, pelo menos muito rara", mesmo tendo em conta a flexibilização dos horários das visitas e a permissão da circulação livre pelos estabelecimentos. No total, estavam acolhidos em lares, a maioria dos quais de Misericórdias ou instituições particulares de Solidariedade Social, 919 idosos, o que corresponde a cerca de 2,87 por cento da população das ilhas com 65 anos ou mais.
As inspecções da Provedoria, que pretendeu apurar o funcionamento e a fiscalização pública dos lares, detectou ainda que metade dos estabelecimentos não dispunha de regulamento interno, que deve constituir a "referência fundamental" dos idosos no momento da entrada na instituição e mesmo durante a sua vida diária.
Além disso, o provedor de Justiça alertou para a criação de um mecanismo interno de reclamação, de modo a "garantir o cumprimento dos direitos dos idosos e, também, funcionar como elemento de transparência da gestão e funcionamento". A assistência e vigilância médica aos idosos "constituiu um dos mais incisivos problemas verificados" nas inspecções, tendo em conta o "elevadíssimo número" de utentes em situação de grande dependência.
"Os principais problemas situavam-se, primeiro, na escassez da oferta por notória falta de médicos disponíveis", realçou o relatório, que admitiu o "elevado custo inerente à manutenção de um programa de assistência médica".
A Provedoria de Justiça apontou o exemplo de um lar na ilha de São Jorge, onde "nenhum dos médicos ali fixados podia dar consultas no estabelecimento porque estavam todos em regime de exclusividade". Perante isso, "ou os idosos deslocavam-se à unidade de saúde ou, simplesmente, não podiam beneficiar das consultas médicas", realçou o relatório.
Ao nível dos pagamentos dos idosos às instituições, a Provedoria registou que "era universalmente respeitado o valor de 80 por cento do montante do rendimento mensal" dos utentes. Apesar disso, o relatório alerta que é necessário esclarecer se o acesso dos idosos a fraldas e a medicamentos está incluído nas mensalidades, uma clarificação que deve ficar assente nos acordos de cooperação entre o Governo Regional e as instituições.
As infra-estruturas não indicam "motivos para preocupações", uma vez que, na generalidade, os lares estão localizados "junto a áreas susceptíveis de permitir passeios de lazer para os idosos e não ofereciam problemas ambientais".
Os edifícios mereceram, ainda, uma referência "muito positiva" ao nível do aspecto exterior, à organização dos espaços interiores e, em geral, ao arranjo dos estabelecimentos, apesar de "não estarem preparados para acolher idosos portadores de deficiência". Quanto à segurança, os edifícios estão construídos "com materiais pouco ou dificilmente inflamáveis" e não foram observadas grades nas janelas, com excepção de um lar.
Apesar disso, a Provedoria de Justiça considera "muito grave" a falta de planos de emergência e de treino específico do pessoal e dos utentes, assim como caminhos de evacuação estreitos e com inúmeros degraus e barreiras.
Perante estas conclusões, a Provedoria recomenda ao Governo Regional a reformulação dos acordos de cooperação com as instituições e que seja estudada a assistência médica ambulatória. O executivo açoriano deve, ainda, estudar a definição de um modelo único e obrigatório de contrato de acolhimento e apoiar a contratação de pessoal habilitado para assegurar o apoio médico.
Data de introdução: 2005-05-24