Apesar de ser Paroquial, em termos de dimensão a Cáritas Paroquial de Nossa Senhora da Conceição, em Vila Viçosa, “equipara-se mesmo à própria Cáritas Diocesana, em termos de volume de trabalhadores e de apoio à população”, refere o padre Francisco Couto, presidente da instituição há três anos.
“Eu não estava cá quando esta casa nasceu, mas foi há 25 anos que um conjunto de pessoas de bem de Vila Viçosa, encabeçados pela Dª Cremilde Vermelho, entendeu pôr de pé este projeto de ajuda social sempre ligado à Igreja e que aos poucos foi ganhando grande dimensão. Sem casa, nem espaço onde desenvolver as suas ações, a instituição nasceu com a ideia de apoiar a população mais necessitada e, aos poucos, foi-se desenvolvendo e crescendo”, conta o pároco, explicando um pouco o estatuto da instituição: “O normal é haver uma Cáritas Diocesana com polos em vários locais, mas Évora tem duas Cáritas Paroquiais, esta e a de Coruche, que apresentam este tipo de estrutura e que deixaram de ser polos para ter um volume de serviços muito equiparado à Cáritas Diocesana, ainda que as coisas estejam interligadas e haja alguma partilha de situações. Não dependemos é diretamente da Cáritas Diocesana, mesmo até em termos de financiamento e de ajudas, a não ser naquilo que é comum a todas as Cáritas ou polos das Cáritas Diocesanas, que é o Projeto Elos”.
A primeira valência da instituição foi o SAD, que ainda hoje é a maior da instituição, com 120 utentes, apesar de apenas 87 estarem protocolizados. Na mesma altura, a instituição avançou também com o ATL, uma valência que a instituição conseguiu conservar muitos anos, mas que em 2007 foi encerrada. A instituição retomou, entretanto, esta resposta, mas apenas nos períodos de férias escolares e ganhou a denominação de «Cáritas Brinca», movimentando cerca de 50 crianças.
Para além destas respostas sociais, a Cáritas Paroquial de Vila Viçosa tem uma creche com 17 bebés, um Centro de Convívio com 80 utentes, uma ERPI com 19 camas e um serviço de Atendimento e Acompanhamento Social através do qual apoia cerca de uma centena de famílias. Hoje é já um dos grandes empregadores do concelho, com uma equipa de 60 funcionários.
Paralelamente, a Cáritas é que faz, atualmente, a distribuição de alimentos por todas as escolas do concelho, com um protocolo inicialmente gratuito, mas pelo qual agora há uma pequena comparticipação de 170 euros mensais por parte da autarquia.
Abrangendo uma população de cerca de sete mil habitantes, o padre Francisco Couto considera que, entre as diversas instituições do concelho, o apoio à comunidade está garantido, no entanto, há situações que lhes escapam.
“Não sei se o SAD chega para toda a gente, mesmo com a Santa Casa da Misericórdia de Vila Viçosa a dar resposta, o que notamos é que, se calhar, há alguma pobreza envergonhada e nem todas as pessoas têm dinheiro para pagar”, começa por dizer, acrescentando: “Neste momento, estamos a ajudar meia-dúzia de famílias que não pagam rigorosamente nada, mas a Cáritas também existe para isso. Uma das coisas que disse no CLAS foi que não faz sentido ter uma instituição de solidariedade para ajudar as pessoas, mas só aquelas que podem pagar. Na Santa Casa não sei como as coisas funcionam, mas se calhar não chega para todas as pessoas que têm necessidades também por estas razões”.
Para o líder da instituição, “falta dinheiro às pessoas e há muitos pais endividados com os filhos”, algo que acaba por se refletir também na instituição: “Esta é uma realidade grave na nossa zona, e as valências também nos estão a levantar alguns problemas porque as pessoas desistem. O Estado deixa de comparticipar se não tivermos aqueles números contratualizados, mas isto acontece porque as pessoas não têm dinheiro. Agora, o que tentamos é que não falte o essencial às pessoas”.
Inserida numa das zonas economicamente mais deprimidas de Portugal, Vila Viçosa tem sofrido bastante com a crise que o País atravessa.
“A população de Vila Viçosa, neste momento, é pobre. Antes da crise não era tanto… Dito de forma feia, a Guerra do Iraque trouxe muitos problemas a Vila Viçosa, porque os mármores deixaram de faturar e a população estava toda praticamente empregada nessa indústria e as empresas começaram a fechar. Tivemos um CLDS que veio para aqui precisamente por causa do desemprego e da infância desprotegida”, argumenta o pároco, acrescentando: “O concelho é pobre e mal governado, e não estou a falar da Autarquia… As pessoas, tal como por todo o lado, habituaram-se a um estilo de vida que é muito complicado de manter e, se calhar, o RSI também não ajuda muito, porque falta educação social. Nós criámos uma dinâmica de educação social, enquanto tivemos o CLDS, que monitorizou e ajudou cerca de 20 famílias, com acompanhamento semanal para ajudar a gerir finanças, a cuidar melhor da casa, a usar bem os recursos por poucos que fossem e conseguimos 60% de sucesso… Agora, se a cabeça não muda, não há muito a fazer”.
Com o negócio dos mármores em baixa, as opções da população não são muitas, pois, como refere o padre Francisco, “os campos são impossíveis de cultivar porque está tudo esburacado”.
Para o pároco, a grande necessidade no concelho é fazer “um acompanhamento de apoio à pessoa, que o Estado hoje define como solidão”.
Porém, existem outros problemas, porque “as pessoas têm necessidades básicas, como alimentação, há muita gente acamada em casa e, por isso, a instituição também desenvolve uma forma de estar junto da população através dos centros de convívio, onde está diariamente com as pessoas nos vários espaços, onde as pessoas possam jogar, partilhar as suas histórias e receitas”.
Para estar mais próxima das pessoas, a Cáritas Paroquial descentraliza os Centros de Convívio, que funcionam nos quatro lugares do concelho: Pardais, Bencatel, S. Romão e Vila Viçosa.
Com cerca de 20 utentes em cada um, a instituição mantém esta opção apesar de apenas dois dos Centros de Convívio estarem protocolizados com a Segurança Social.
Laborando num contexto economicamente difícil, a instituição luta diariamente para se manter à tona de água, não deixando de acorrer a quem mais necessita.
“Neste momento, a situação financeira da Cáritas está periclitante, mas não fecha por isso, garantidamente”, assegura o padre Francisco, complementando: “É verdade que estamos com algumas dificuldades, também porque nos metemos em outros projetos, mas a seu tempo conseguiremos alcançar algum equilíbrio. Agora, é preciso é andar sempre com o cinto apertado. Os projetos foram os CLDS+, que nos fizeram avançar uma quantidade imensa de dinheiro. Depois tivemos que adquirir duas carrinhas novas, o que também nos coloca alguns problemas, e ainda o facto de estarmos a contar com uma quantidade de dinheiro que estávamos a receber pelos serviços que prestávamos e as pessoas começarem a cortar-se porque não têm dinheiro e isto gera uma discrepância. Em alguns casos houve aumento de produtos e de situações que nos criaram alguns conflitos nos últimos tempos, mas estamos a tratar de encontrar o rumo certo e o equilíbrio, quer financeiro, quer de serviços, sem deixar de prestar um serviço de caridade, não no sentido de dar e esquecer, mas de acompanhar”.
E se as questões materiais são sempre um obstáculo a esse trabalho de caridade, também o fator humano levanta alguns problemas à instituição na prossecução da sua missão.
“Nós temos dois tipos de recursos, o humano e o material. Do humano, há muita gente à procura de trabalho ou emprego e encontro muita gente preocupada com o que ganha e, se calhar, pouca gente preocupada com a oferta do seu ser a um serviço social com o nome Cáritas. Depois encontro também alguma generosidade, não de empenhamento ou de compromisso concreto, mas de ser hábito as pessoas darem e, por isso, dão, sobretudo bens materiais, não dinheiro. Dizer que, de facto, há uma busca de trabalho mas, se calhar, sem um compromisso muito claro ao nível da caridade ou da oferta pessoal de fazer o bem ao outro porque o outro está necessitado. E, depois, também sinto que há pouca qualificação para este tipo de trabalho… Este ano desenvolvemos algumas ações de formação, em especial uma que está a decorrer que visa a questão da deontologia no serviço e no trabalho aplicado a este caso concreto que é a área social”, sustenta o pároco, continuando: “A nível material encontramos outras dificuldades. Um pouco subjugados às necessidades do Estado, porque o Estado não pode fazer ação social sem nós, mas, em muitas situações, também nos coloca num saco fechado, de onde não conseguimos sair sem a bondade de todos os intervenientes da sociedade civil. De facto, às vezes, passamos aqui um calvário por causa das questões materiais, porque é preciso dinheiro para tudo, seja para as carrinhas, seja para os ordenados. Depois, as pessoas não têm dinheiro para pagar e, então, o que fazemos? Isto é em nome da Igreja, por isso não posso deixar de ajudar alguém que precisa só porque o Estado não nos dá dinheiro. Isto é uma luta interior muito grande, porque o Estado obriga-nos a tornarmo-nos uma empresa, as pessoas entendem-nos como uma empresa, mas ao mesmo tempo entendem-nos como alguém que tem que lhes dar tudo o que elas precisam e à maneira delas… Isto gera muitos conflitos interiores. Temos algumas dificuldades de resposta, essencialmente a nível material”.
Mesmo assim, o padre Francisco defende que a população tem uma boa imagem da instituição, que “é reconhecida e sentida, pelo menos as pessoas recorrem muito à Cáritas”.
Com as restantes instituições sociais do concelho, a relação é boa e complementar em muitas situações.
“Entre instituições, encontramo-nos, partilhamos ideias, fazemos ações e projetos em conjunto e falo na Santa Casa, como na Cruz Vermelha, ou nos Vicentinos, alguém mais escondido mas que apoia muita gente, e que se apoiam muito na Cruz Vermelha e na Cáritas. Por exemplo, criámos uma Loja Solidária comum, uma Ludoteca comum. Isto é um meio tão pequeno que não faz sentido, e sou o primeiro a combater, a falta de diálogo entre nós. Depois temos o Dia do Idosos, a Feira Solidária, a Universidade Sénior, tudo projetos comuns”, revela, acrescentando: “Somos muito solidários uns com os outros, agora ao nível da contabilidade e das outras coisas, cada um é por si”.
Face aos obstáculos financeiros, dois projetos que a instituição gostaria de implementar estão, para já, na gaveta. Um é a construção de raiz de uma ERPI, com 30 camas, em Vila Viçosa, uma vez que o Lar da instituição é no lugar de S. Romão, um equipamento que integraria uma cozinha e uma lavandaria que serviria todas as demais valências. Para além disto, a instituição gostaria de recuperar o edifício-sede e ali instalar novas valências.
No entanto, esperam-se melhores tempos e estuda-se a possibilidade de candidaturas ao Portugal 2020.
Por outro lado, a Cáritas tem um outro projeto mais imediato e que passa por “redefinir um pouco toda a dimensão de apoio domiciliário, em que a resposta de acompanhamento à solidão possa ser mais evidente e assim a instituição possa dar mais qualidade ao serviço que desenvolve”.
E como seria Vila Viçosa sem a Cáritas Paroquial? “Garantidamente, mais pobre a todos os níveis, mas Vila Viçosa seria mais pobre sem a Cáritas, como seria mais pobre sem a Santa Casa ou sem a Cruz Vermelha… Entre nós entendemo-nos, mas faltando algum isso criaria um certo desequilíbrio”.
Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)
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