ANSE – ABRIGO NOSSA SENHORA DA ESPERANÇA, MAIA

Novo equipamento reflete o bom trabalho feito

A 6 de junho de 1960 nascia, na cidade do Porto, o Abrigo Nossa Senhora da Esperança (ANSE), uma instituição com uma única resposta social, a de Lar, e exclusiva para senhoras. Tem sido assim ao longo dos 55 anos de existência, mas graves problemas, há cerca de 15 anos, quase ditaram o encerramento da instituição.
Quando no ano 2000, um grupo de associados contactou Sílvio Oliveira para que agarrasse os destinos da instituição, perante o “abandono” em bloco dos órgãos sociais eleitos, o atual presidente estava longe de conhecer a situação difícil da instituição.
É que por despacho do secretário de Estado da Segurança Social da altura, a instituição tinha uma ordem de encerramento devido às graves falhas no cumprimento da legislação. Para além da falta de condições que se verificavam, a instituição acolhia, em péssimas condições, cerca de 75 utentes, quando o número ideal para o equipamento é o que atualmente se regista e que é de 35 utentes.
A primeira tarefa de Sílvio Oliveira e da sua Direção foi pôr a casa em ordem, um processo que demorou perto de meia década.
“Fomos trabalhando na consolidação daquela casa, porque onde hoje estão 35 pessoas, na altura chegaram a estar 75. Que qualidade poderia aquela casa dar àquelas pessoas? Estavam umas em cima das outras numa situação pouco digna de uma instituição social”, recorda o presidente.
Para além do número excessivo de utentes, a instituição não cumpria com alguns normativos, como seja a existência de sala de convívio, de elevador, etc.
“Esta situação foi uma das razões para que, em 1999/2000, o secretário de Estado da Segurança Social da altura decretasse o encerramento da instituição”, refere António Figueiredo, diretor-geral do ANSE.
Foi uma situação muito complicada e que só a disponibilidade e diplomacia de Sílvio Oliveira acabou por contornar.
“Na altura, pedi ao secretário de Estado seis meses para tentar inverter a situação. Ele concedeu-me esse tempo e hoje a casa está aberta e tem qualidade. É uma casa antiga, mas tem qualidade. Infelizmente, para quem precisa está permanentemente cheia, pois não há vagas”, lembra o presidente, que crítica a atitude dos dirigentes da altura, que quando chegou o despacho do encerramento os órgãos sociais se demitiram em bloco, e também os serviços da Segurança Social: “Foi abandono. O presidente que estava antes de mim chegou lá um dia e disse que se ia embora e foi. Certamente que a Segurança Social da altura também não fazia nada e teve culpas no cartório, porque não vigiou e não controlou e ainda passou licenças”.
Mas há mais alvos nas acusações do presidente: “O Ministério Público foi leviano ao dizer que não sabia como é que tinham desaparecido 75 mil euros. Houve pagamentos no valor de 75 mil euros que não tinham justificação. Por vezes, encontrava-se um papel atrás de uma porta a dizer cinco mil euros… Bem, desapareceram 75 mil comprovados em auditoria, falta saber se houve mais! A instituição, na altura, era uma máquina de fazer dinheiro e quantos mais utentes tivessem mais dinheiro podiam meter ao bolso”.
Ciente de que conseguia inverter a situação, o presidente reuniu com a Segurança Social solicitando ajuda.
“Era preciso pôr as coisas na ordem e começou por acabar com a anarquia. A Segurança Social até sabia o nome das pessoas que era preciso mandar embora, mas não mandava”, lamenta, indicando que as suas primeiras ações pretenderam “pacificar, responsabilizar e profissionalizar” a instituição e quem nela trabalhava.
Nas negociações com a Segurança Social a fim de reverter a deplorável situação do lar sito na rua de Santa Catarina, Sílvio Oliveira colocou algumas condições.
“O número de 35 utentes acordado como ideal era um número incomportável para o orçamento que havia na época, porque iam cortar as ajudas de 55 para 35. E nessa altura disse-lhes que entregava as chaves! Depois, demonstrei que a receita patrocinada, quer pelas famílias, que era pouca, quer pela Segurança Social, não cobria os custos de 35 utentes. Havia um défice permanente e eu não podia aceitar uma situação dessas”, recorda, revelando a solução encontrada: “A Segurança Social prometeu ajuda e fomos reduzindo paulatinamente o número de utentes. Não entravam novos utentes até chegarmos aos 35 acordados. Inicialmente, quando negociaram os 35, propuseram um acordo típico, ao que eu disse não chegar e, então, criaram um acordo atípico, que, no fundo, foi redimensionar o típico em termos económico-financeiros”.
A situação levou cinco anos a normalizar e hoje, segundo Sílvio Oliveira, “o Porto, grosso modo, não dá problemas, porque está muito profissionalizado”.
Estava a salvo a casa fundada por Maria José Novais, “uma senhora muito importante, que foi vereadora da Câmara do Porto e da antiga Câmara Corporativa, e que era, acima de tudo, um coração grande”.
Sílvio Oliveira faz questão de sublinhar o facto de no início a instituição ter sobrevivido porque “a senhora começou a pôr dinheiro do bolso dela”.
Com o lar do Porto estabilizado, obras de requalificação – seja o saneamento, seja a instalação de um elevador – realizadas, a instituição mostrou ambição e propôs-se crescer, tentando, assim, dar resposta ao problema da lista de espera.
“Esta situação fez-me meter noutra alhada e meti-me na construção de um lar novo, ao abrigo do POPH, primeiro no PARES, pelo qual andámos anos e anos a lutar. Hoje temos este edifício construído, no qual ainda falta uns pormenores, como, por exemplo, um auditório, mas certificado e inaugurado pelo ministro”, afirma satisfeito, acrescentando: “Como a casa estava a funcionar bem e a minha função já não era tão necessária e como não consigo de estar parado no café a cansar-me de não fazer nada, então, cometi a loucura de me pôr a fazer uma obra nova. Hoje dá-me muito gozo esta obra e estou preparado para me ir embora”.
O diretor-geral da instituição justifica o passo dado com a numerosa lista de espera.
“Atualmente, qualquer ERPI que esteja completa não tem uma lista de espera inferior a 150 pessoas”, argumenta, revelando que, de momento, a taxa de ocupação da nova estrutura, nascida em Milheirós, na Maia, ainda só ronda os 38%. “Foi a necessidade que nos fez avançar”, remata António Figueiredo.
Uma das razões para a baixa ocupação da estrutura inaugurada apenas em Julho do corrente ano é a não comparticipação estatal das vagas existentes.
“A qualidade é inimiga da falta de dinheiro”, afirma Sílvio Oliveira, justificando: “Não tenho prazer nenhum em levar o valor X, Y ou Z a quem está aqui instalado, mas não posso, de maneira nenhuma, deixar desequilibrar a instituição. Estão aqui mais de dois milhões de euros investidos. À medida que vão entrando utentes para completar os 57 lugares de capacidade, vamos, também, metendo mais funcionários. Não estamos cá para ganhar dinheiro, mas não queremos perder para não pôr em risco a sustentabilidade da instituição”.
A este propósito, António Figueiredo reforça a ideia do presidente: “A nossa instituição, acima de tudo, zela pelo cumprimento de excelência da sua missão, ou seja, cuidar, dar bem-estar e dar cuidados de saúde, no fundo, dar uns últimos anos de vida com qualidade às pessoas, mas sem termos uma segunda preocupação, que deve estar ao mesmo nível, que é a com sustentabilidade da instituição, não é possível cumprir com a missão. Se não tivermos mecanismos para garantir a sustentabilidade da instituição, não podemos fazer aquilo para que existimos”.
Nesse sentido, o diretor-geral revela que a instituição, no presente, “está a perder mais de dois mil euros por mês na nova estrutura”, devido a ainda não ter conseguido uma economia de escala.
“O lar não pode ter 22 utentes e só um ou dois funcionários. Ainda não chegámos à velocidade cruzeiro, mas não vamos deixar de prestar os serviços aos nossos utentes porque a casa ainda não está cheia. No Porto, nos últimos cinco anos conseguimos não aumentar nenhuma mensalidade aos utentes. Nos tempos que vivemos isto é um feito, mas tem sido conseguido à custa de renegociação de contratos com os fornecedores, mantendo e melhorando até a qualidade, fazendo angariação de fundos e este ano já conseguimos dar um aumento aos funcionários. No fundo, há um enorme esforço de gestão por parte da instituição para cumprirmos com a nossa missão”, sustenta, sublinhando: “Nos últimos 10 anos a instituição nunca deu nenhum resultado negativo, vai dar este ano em face do investimento. No entanto, nesses anos em que deu lucro houve sempre investimento no equipamento, com a requalificação das instalações no Porto”.
Apesar de tudo, a instituição não está com problemas financeiros, tendo recebido a boa notícia, no passado mês de Outubro, da aprovação do seu pedido ao Fundo de Socorro Social.
“A instituição, atualmente, não vive sobressaltos devido ao forte apoio da Banca, e agora este apoio do Estado, através do Fundo de Socorro Social, vai permitir-nos aligeirar em cerca de 25% os nossos compromissos com a Banca, o que nos vai dar alguma folga para respirar. No próximo ano, vamos ter que começar a amortizar o empréstimo e este dinheiro do Estado vai permitir amortizar juros e respirar um pouco melhor”, refere António Figueiredo, que destaca a profissionalização da gestão na boa situação da instituição: “Neste momento as coisas estão direitas, a situação está estabilizada. Hoje não há despesa que seja aceite sem justificação”.
A isto tudo acresce que, de momento, o rácio utente/cuidador é muito baixo, situação que melhorará no momento em que a capacidade do lar ficar lotado.
“Neste momento, temos um funcionário para cada 5 utentes. Temos uma grande taxa de pessoas dependentes e por isso precisamos de ter um rácio utente/cuidador mais baixo”, justifica o diretor-geral, revelando que os resultados dessa aposta são um orgulho para a instituição: “Somos das poucas instituições no País que tem uma taxa de 0% de úlceras de pressão e isso consegue-se com programas individuais de levante, reposicionamento de X em X horas de acordo com um plano médico estabelecido, hidratação… É uma taxa de que muito nos orgulhamos. Gastamos uns largos milhares de euros por mês só em creme hidratante, que não é um qualquer”.
E para o presidente não há dúvidas que “é algo que custa muito dinheiro, custa muito a vigiar, mas é algo que tem que ser feito”, ao que o diretor-geral acrescenta: “O nosso core business é ERPI e as coisas aqui estão a correr bem porque temos «know how». Já testámos muitos modelos para várias situações e temos vasto conhecimento sobre o que resulta e o que não resulta. Mesmo assim estamos sempre a tentar melhorar e é isso que, se calhar, nos distingue da maior parte das instituições aqui no distrito do Porto. Temos um conjunto de serviços integrados, que também nos distingue e apostamos muito nos cuidadores, porque essa é a nossa missão, cuidar dos idosos. As refeições e as limpezas são feitas por empresas externas e isto permite-nos libertar os colaboradores para o que é importante, que é cuidar dos utentes”.
Com a construção do novo lar em Milheirós, a instituição abriu-se a utentes do sexo masculino e a sede da instituição também mudou para a Maia, único concelho no Porto que acolheu a ideia de receber o ANSE, com a cedência de um terreno e o direito de propriedade por 50 anos.

Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)

 

Data de introdução: 2015-12-01



















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