1. Por proposta de “Os Verdes”, votada em Plenário da Assembleia da República em 3 de junho de 2015, e com a intenção de promover uma gestão eficiente dos alimentos, 2016 é o “ano nacional de combate ao desperdício alimentar”.
No total eram 15 as recomendações ao Governo avançadas pelos deputados para promover o combate ao desperdício alimentar, a larga maioria de carácter generalista. Entre elas, salientavam-se quatro: a) compatibilização dos objetivos e das medidas de redução do desperdício de alimentos com a segurança alimentar e a satisfação plena das necessidades alimentares da população, com particular urgência em relação a crianças e jovens, tendo em conta o relatório do INE sobre a pobreza, as desigualdades e a privação material em Portugal; b) desenvolvimento de uma campanha de sensibilização de agentes económicos e de consumidores para o problema do desperdício alimentar; c) incentivo à compra de bens alimentares em mercados de proximidade, nomeadamente no que respeita a produtos perecíveis; d) fixação de uma percentagem significativa de utilização de produtos alimentares locais, por parte das instituições públicas, designadamente para abastecimento de cantinas públicas (em estabelecimentos de ensino, hospitais, estabelecimentos prisionais, etc.).
2. A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) estima que o desperdício alimentar nos países industrializados ascende a 1,3 mil milhões de toneladas.
Um terço dos alimentos produzidos “desaparece” ou vai para o lixo! Na Europa, o desperdício de produtos hortofrutícolas próprios para consumo ronda os 30%. Atiram-se todos os dias para o lixo produtos ainda em bom estado de conservação só porque ultrapassam a data de consumo preferencial.
Alimentos que poderiam ter sido consumidos (ou ter outra utilização) estão a ser desperdiçados. Talvez, também, porque muitas vezes, a pretexto da segurança alimentar que urge garantir, a legislação rende-se a uma espiral de exigências sucessivas que quase ninguém sabe a quem interessam mas que, parecendo preferenciar o aspeto do que se produz sobre o humano a quem se destinam, muito provavelmente servirão alguns interesses. E entre os interesses poderá estar, também, a probabilidade de se poder ganhar mais no circuito comercial com a destruição daquilo que ainda pode ser útil mas já não pode ser comercializado do que com a sua distribuição por quem precisa mas não paga... É ignorada a degradação de muitos humanos a quem não chega aquilo que foi produzido para os humanos e que seria essencial para uma vida humana com dignidade.
Na Europa cerca de 122 milhões de cidadãos enfrentam o risco de pobreza, e em Portugal, sensivelmente 300 mil pessoas passam fome. Isto quando se desperdiçam anualmente milhões de toneladas de alimentos e quando há milhares de toneladas de produtos alimentares que todos os dias são deixados a apodrecer no campo por falta de mercado ou deitados para o lixo por ficarem fora de prazo.
É necessário acabar com este desperdício irracional com consequências trágicas a nível ambiental e social.
Trata-se de um problema de consequências graves no âmbito ético-social e não menos graves no âmbito ambiental e económico – a produção destes alimentos envolve gastos em terrenos, em energia, em água e em recursos humanos sem beneficiar os humanos por quem e para quem foram produzidos.
3. O Partido “Os Verdes” fez a proposta. O Parlamento aprovou. E o Governo recebeu uma série de recomendações. O ano em curso deveria ser de “combate ao desperdício alimentar”...
Aqui como em muitas outras situações, são as comunidades, são as suas organizações não governamentais e, sobremaneira, são as suas instituições particulares de solidariedade social, com todo o seu dinamismo, inovação e voluntariado, a agarrar as “causas nacionais”. O que se está a fazer de combate ao desperdício alimentar a estes se deve.
E, reconheça-se, em abono da verdade, apesar de nem sempre serem reconhecidos e por vezes serem maltratados, porque já o vinham fazendo e não se deixam desmobilizar, nem sequer precisaram da proposta de “Os Verdes” e da decisão do Parlamento para combater tanto o desperdício alimentar como outros desperdícios, enquanto eles ainda são considerados bens que podem ser colocados ao serviço do maior número possível de pessoas.
É chegada a hora de o Parlamento também o reconhecer.
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