JULHO DE 2017

OLHARES DEPOIS DA TRAGÉDIA

1. "Há calamidades naturais que não têm controlo. De todo. Há momentos em que nem com todos os meios do mundo, aéreos, pedestres, subterrâneos, seja o que for, se controla um incêndio, uma inundação, um tornado, um terramoto, um tsunami, uma erupção, um meteorito. Pode acontecer que, depois de muita destruição, seja possível de novo controlar a calamidade, mas pode haver dias, horas, meses, em que nada se pode fazer a não ser minimizar os efeitos e esperar que acabe". (Pacheco Pereira, in Público).

Como lembrou o Presidente da República, os incêndios no centro do País são "uma tragédia sem precedentes na história do Portugal democrático" e "atingiu um país rural, isolado, com pessoas mais idosas, mais difíceis de contactar, de proteger e de salvar".

Tragédia que convocou a atenção geral. O Santo Padre mostrou-se solidário, a Europa disse presente, o Presidente da República desdobrou-se, o Governo concentrou energias, as autarquias mobilizaram-se, as Instituições movimentaram-se, a Conferência Episcopal apelou para a mobilização geral. E de toda a parte chegaram inequívocas mensagens e eloquentes expressões de solidariedade.

A solidariedade é uma realidade palpável que a todos dignifica.

E esta tragédia irrompeu abruptamente num país que parecia estar a despertar para uma esperança consolidada num futuro melhor...

Agora, mais do que ficar paralisado com medo do que ainda estará para vir ou de levantar dedos acusadores, importa que a atenção de todos os portugueses se concentre no essencial: "manter o combate e a solidariedade por todos os que sofrem e sofreram com esta tragédia e que somos um só povo por Portugal".

2. Mas esta tragédia talvez ajude a "aterrar" um pouco mais e um pouco melhor. Porque é nesta Terra que todos somos que há Pessoas que a todos merecem.

Urge "recentrar" a vida e, muito provavelmente, também alguma cultura e algum culto...

O primeiro culto e a primeira cultura a vivenciar serão, certamente, a de dar prioridade à Pessoa toda e a todas as pessoas. Ultrapassado (?) o tempo da austeridade, urge proclamar que as pessoas são o espaço do devir, das políticas e dos credos: o respeito pela dignidade da pessoa toda, desde a sua conceção até à morte natural, e o respeito pela dignidade de todas as pessoas têm de ser sempre e por todos devidamente proclamados, servidos e honrados.

Uma outra atenção será, muito provavelmente, a de se olhar um pouco (ou muito) mais para o País que realmente somos como um todo nacional que deve ser: muito embora não tenha grande poder reivindicativo, o interior desertificado e envelhecido, porque mais carenciado e porque também é território nacional, tem de ser a opção preferencial na conceção das políticas e na redistribuição dos favores e das riquezas. Mais do que a subsidiariedade, aplica-se aqui o princípio do bem comum: se todos devem contribuir para o bem comum também importa que a ninguém e a nenhum território falte aquilo de que carece em ordem a uma maior equidade e a uma vida com mais futuro.

E a Igreja também tem aqui missão dignificante. Cada vez a sua doutrina social é mais reconhecidamente humana e mais venerada. Oportuna e inoportunamente, urge que também seja proclamada e servida. Quem sabe se a Boa Nova que também urge ser anunciada no meio de um povo e de um território pobre não será a de que é chegada a hora de o libertar da desertificação injustificada ou do abandono injusto e imoral?

3. Mas a tragédia pode fazer concentrar outros olhares para circunstâncias e factos que não podem ser ignorados.

O fascínio de um litoral sedutor atraiu certamente muitos que "abandonaram o torrão que os viu nascer". Mas outros também dali se foram porque iam encerrando equipamentos e serviços de que careciam. O argumento para o encerramento era o da quantidade. Mas para o Estado a universalidade é anterior à quantidade. O Estado não pode encerrar porque há menos pessoas. Nem mesmo depois de tudo ter feito, ainda que sem êxito, para que houvesse alguém, porque, ainda aí, lhe sobrava a razão para estar porque ali ainda ficava território.

Alguns equipamentos e serviços que encerraram ainda eram necessários. Se não fosse por mais razões, sobrava a razão de contrariar a desertificação e o abandono dos que ainda tinham território mas já não tinham voz..

Abandonaram-se as terras e as sementeiras, degradaram-se as casas e os lares: florescem sumptuosamente os eucaliptos!

Anuncia-se agora uma reforma da floresta. Tardia, mas bem-vinda.

Talvez insuficiente...

Se a quantidade de eleitores recenseados tem vindo a determinar a quantidade de assentos parlamentares, porque não reservar uma quantidade de assentos parlamentares em função da dimensão do território? Poderia ajudar qualquer coisinha...

Lino Maia

 

Data de introdução: 2017-07-08



















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