SOLIDARIEDADE - O que é que a forma como se constrói, como se organiza um território, tem que ver com o modo de vida?
Maria João Freitas - Tem tudo a ver com o modo de vida. As pessoas não vivem no ar. Nós precisamos de espaço e o espaço faz-nos sentir bem ou faz-nos sentir mal e condiciona efectivamente a forma interior como organizamos a nossa vida, a forma como nos sentimos e a forma como nos relacionamos uns com os outros. Estas são três dimensões muito importantes na vida das pessoas.
SOLIDARIEDADE - Mas pode ser determinante?
Maria João Freitas - Pode. O facto de vivermos mais perto ou mais longe, de termos que passar por uma série de contingências nas deslocações que nós fazemos, nos sítios onde habitamos, onde trabalhamos, aquilo que encontramos quando voltamos a casa, tudo isto estrutura a nossa forma de estar, a nossa forma de estar connosco próprios e de estar com os outros. Podemos analisar estes espaços ao nível do indivíduo e às vezes esquecemo-nos do efeito de bola de neve que isto tem no colectivo, do impacto que tem nas sociedades agradáveis, nas sociedades não agradáveis, nos espaços agregados, nos espaços ditos urbanos, e até mesmo nas representações de cidade que fazemos. Quando nós pensamos numa cidade, o que é que nos vem à cabeça?
SOLIDARIEDADE - Que explicações existem para a desertificação das cidades?
Maria João Freitas - A forma como nós gerimos os espaços. Quando nós tiramos de lá a residencialidade, a proximidade e os tornamos cada vez mais espaços vazios, tiramos ou aumentamos o comércio… Quando esse equilíbrio entre o residencial e o comércio não funciona, e os serviços não funcionam, criam espaços onde esta alteração de ocupação mexe também com a questão temporal. Tem horas em que estes espaços estão totalmente ocupados e tem horas em que estão totalmente desertificados …
SOLIDARIEDADE - E há também aquelas conflitualidades entre as grandes superfícies e o pequeno comércio usadas muito vezes como argumento para justificar a desertificação. Faz sentido?
Maria João Freitas - O que eu acho é que as grandes superfícies oferecem hoje às pessoas aquilo que elas precisam e não encontram no resto dos espaços. Elas encontram lá tudo o que precisam, às horas que precisam. Encontram conforto climatérico, encontram variedade e possibilidade de escolher, têm as ruas do comércio, de móveis, a rua do vestuário, quer dizer, é um espaço muito amplo em que há uma enorme funcionalidade. Na rua, não há continuidade, enquanto que as superfícies comerciais oferecem aquilo que as pessoas procuram, em termos de espaço público, sem grandes custos de deslocação, com condições de estacionamento com condições, climatizado, isto é, não têm chuva nem têm calor, com uma enorme diversidade de escolha.
SOLIDARIEDADE - Não acha que agora as cidades são menos atractivas?
Maria João Freitas - As cidades continuam a ser atractivas. As cidades são os sítios onde as pessoas continuam a achar que estão as oportunidades. Muitas estão lá, não quer dizer que as pessoas as aproveitem e não quer dizer que não haja outras oportunidades fora. As cidades principais continuam a ser os sítios onde as pessoas acham que têm as oportunidades. As cidades não deixaram de ter as oportunidades e as pessoas não deixaram de pensar que é lá que as têm. O que custa efectivamente é aquilo que as pessoas acham de considerável, de limite ou de aceitável, o custo para usufruírem dessas oportunidades. A suportabilidade ou não suportabilidade, e isto é apenas a minha opinião, não desenvolvi nenhum estudo sobre o tema, é isso que faz a emergência de novos modos de vida, mesmo em termos da procura de residencialidade. Hoje em dia o movimento migratório já tende a ser ao contrário, as pessoas trabalham nos centros das cidades e têm as suas residências fora das grandes cidades. Hoje em dias as pessoas também já fazem percursos mais alargados, isto é, é possível uma pessoa viver no Porto e exercer uma profissão em Lisboa. Vêm duas ou três vezes. Continuam a ter a sua vida organizada no Porto.
SOLIDARIEDADE - Há cada vez mais a tendência de as cidades se tornarem aglomerados de condomínios privados, de pequenas ilhas onde as pessoas se vão juntando em função do poder de compra, de situação e de estatuto semelhante?
Maria João Freitas - Mas isso é uma tendência das pessoas, dos grupos. As pessoas obviamente procuram mais os seus pares. As pessoas tendem a agregar-se em função de alguma semelhança, de alguma partilha de interesses, e portanto, é normal que isso aconteça. O que torna tudo um bocadinho mais complicado é quando os critérios dessa paridade se vão restringindo cada vez mais ao medo ou à dificuldade em gerir a diferença e se enquistam e tornam a diferença uma coisa altamente ingerível em proximidade. A escolha da paridade não é algo que traga problema em si.
SOLIDARIEDADE - Mas trata-se também de uma questão de organização do espaço…
Maria João Freitas - É uma questão de gerir o meu espaço e de saber ou não gerir a diferença e o seu contacto com o diferente de forma a desejar estar à vontade com esse diferente ou de cada vez mais limitar o seu contacto com esse diferente. Portanto, aqui a questão da gestão dos espaços, e a questão dos condomínios privados, pode ter efeito de quebra de laços de proximidade e o exacerbar da procura da paridade e, portanto, pode levar à perda de competências.
SOLIDARIEDADE - Em nome da segurança, nos condomínios fechados e, cada vez mais, também nos espaços públicos, as pessoas vão abdicando da sua privacidade…
Maria João Freitas - Em prol de uma maior segurança sim. É engraçado que as pessoas permitem isso quando há a sensação de insegurança, ou fazem isso no seu domínio privado. Mas porque é que as pessoas permitem esse excesso de controlo? Ou que alguém as controle? É a ideia de que são eles a controlar. Repare: num condomínio fechado há seguranças que são pagos pelos moradores. Há aqui um auto-controlo, um auto-domínio sobre as formas de controlo. Que no fundo traduz a forma descrente que há em relação às formas públicas de segurança. O que é que controla as nossas ruas? Quem é que as pessoas chamam quando é preciso impor controlo nas nossas ruas? A polícia. Depois há que provar que o sentimento de insegurança que uma pessoa tem corresponde efectivamente a uma insegurança que existe. Isso não está provado. Podemos por exemplo reduzir o sentimento de insegurança tentando animar os espaços, tentando cuidá-los melhor, torná-los mais agradáveis, as pessoas sentem-se melhor. Numa rua cheia de grafitties, por mais limpa e segura que seja você sente insegurança. E porquê? O grafittie é uma forma de marcação de território, e que você associa a grupos, não tem uma imagem positiva desses grupos, e portanto sente-se ameaçado. Na organização dos espaços é necessário ter controlo sobre os cantos e recantos, e há espaços onde você não tem controlo sobre as ruas, não vê o que está a acontecer no outro lado da esquina, em que tem que passar por escadas. E isso acontece em quase tudo o que é empreendimentos novos.
SOLIDARIEDADE - Seguindo essa ideia, permita-me que use esta comparação: os bairros sociais, na sociedade portuguesa, são uma espécie de condomínio que os exclui.
Maria João Freitas - Os bairros sociais não sei se são condomínios porque nos condomínios há a noção da gestão, do controlo, do bem-estar e por tudo isto não sei se o são. São sim espaços de enorme concentração populacional. Nós estamos de facto a acantonar pessoas, não apenas com base na suas etnias porque até existe mistura étnica, mas os bairros sociais demonstram uma solução, e não digo que seja uma estratégia, uma solução de acantonamento das pessoas que tinham algo em comum - viviam em barracas. Que por sua vez também já tinham algo em comum que era virem protagonizando processos migratórios. Sejam esses processos migratórios internos ou externos. A partir do momento em que se tentou controlar esse processo tentaram que deixasse de haver pessoas a morar em barracas, aliás os programas criados eram apenas para as pessoas que moravam em barracas, mas as pessoas continuaram a vir e as pessoas têm que morar em algum lado. E agora o que temos é um processo invisível de perpetuação de condições de pouca habitabilidade, de grande carência habitacional, e para os quais não há ainda soluções. Espero que quando se pensar em soluções para estas questões se pense no impacto que tiveram outras tentativas desenvolvidas.
SOLIDARIEDADE - Terão sido más soluções?
Maria João Freitas - A criação de habitações sociais não é uma má solução. Não é é uma solução por si só. O que acho é que a habitação social precisa de ser pensada num leque mais abarcado de soluções. E sobretudo deve ser pensada de uma forma menos concentracionista. Nós já sabíamos na altura em que foi implementado este processo, de realojamento, porque é que não funcionou noutros sítios, nomeadamente na Europa, onde estavam já a lamber as feridas que tinham, e que ainda têm, da enorme massificação da habitação social. Hoje em dia há situações em que se tentou fazer uma inserção na malha urbana de baixa dimensão e baixa densidade e nesses sítios nem se ouve falar disso. Pode até passar por eles e nem se percebe que é habitação social. As pessoas não podem ser mandadas para lado nenhum, fazem parte da cidade.
SOLIDARIEDADE - Não será possível encontrar soluções para os casos de grande concentração populacional em que os aspectos arquitectónicos funcionam como factor de exclusão? Acha por exemplo que há bairros em que uma solução seria demolir e construir de novo?
Maria João Freitas - Nunca rejeito essa hipótese, sendo que não acho que deva ser a melhor na altura na formulação do problema, isto é, não é prioritária. Deve ser a última e quando não há mais nenhumas soluções. Custou muito dinheiro ao Estado construir esses edifícios. Alguns deles foram já construídos há muito tempo mas outros foram agora acabados de ser construídos ou estão a acabar. Acho que deve haver um cuidado acrescido quando se está a construir e, de facto, o planeamento nem sempre tem acontecido. Entre isso e demolir tudo acho também que é um passo muito grande. É óbvio que para a próxima, quem pensa nisso deve começar a pensar em termos não de custos imediatos mas em termos de custos de gestão. Porque o que vão gastar para corrigir o que está mal feito vai encarecer todo o projecto e lá se vai o orçamento da habitação social por água abaixo. A demolição é solução mas se não houver mais nenhuma solução. Vamos ter é que ser um bocadinho inventivos.
SOLIDARIEDADE - Pode dar-se o caso da demolição ser o princípio da solução?
Maria João Freitas - Não sei se será assim em Portugal. Tendo como referência o que outros países estão a fazer, nomeadamente o que se passa em Paris, na reabilitação de habitações sociais, e ele têm-nos por extensões bastante maiores, o que é que eles fazem? Às vezes fazem uma reabilitação parcelar para criar pontes, aberturas, para tornar o reordenamento mais viável dentro da própria vivência e gestão daqueles empreendimentos. Provavelmente em Portugal haveria alguns casos em que isso seria possível, mas eu não fiz esse estudo. Sei, por exemplo, que há bairros como no Aleixo, em que essa questão é sempre recorrente. Eu não tenho opinião formada quanto a isto porque nunca desenvolvi nada sobre esse assunto, mas também não excluo essa solução de demolição. É uma solução como as outras. Não se pode é pensar: está mal, deita-se abaixo. Acho até que era um raciocínio demasiado facilitista.
SOLIDARIEDADE - Houve algumas autarquias que julgaram que combinar etnias, pessoas de diferentes tipos e metê-las em urbanizações separadas e afastadas poderia ser uma forma de tentar resolver o problema da criminalidade.
Maria João Freitas - As pessoas não querem ser separadas. As pessoas podem ainda não saber gerir as suas diferenças em proximidade, mas as pessoas não querem ser separadas. Querem que as respeitem nas suas particularidades, mas querem também que respeitem aquilo que têm de semelhante com os outros. Essa solução foi usada durante um tempo: "como os ciganos têm hábitos muito diferentes vamos separá-los". O mesmo com os africanos. Revela também alguma atenção pelas suas particularidades, mas eu acho que hoje em dia nós devemos pensar de outra forma, e isto tem também na sua base estudos que têm sido feitos. Está até agora um para sair de uma colega, Margarida Rebelo, sobre a redução de preconceitos, em que se chega à conclusão de que o problema não está nas diferenças, mas o problema está nas semelhanças e na gestão dessas semelhanças. Nós quando estamos a fazer esse afastamento estamos a exacerbar essa diferença, pela nossa dificuldade em aceitar e lidar com o semelhante.
SOLIDARIEDADE - Há ideias pré-concebidas sobre as pessoas que vivem nos bairros que estão presentes nas definições das políticas de habitação social…
Maria João Freitas - Claro. E, repare, isto depende muito das representações que fazemos destes bairros. Fazemos representações de que é tudo um problema. Temos pessoas que vieram dos interiores para aqui ou fizeram percursos de outros países para aqui em busca de melhor qualidade de vida. São processos migratórios todos eles baseados na procura de melhoria de qualidade de vida. As pessoas mexeram-se. E este capital de mobilidade física passou a ser abafado por um outro capital que acaba por ser um capital de não mobilidade. Estes territórios têm grande potencial, da mesma maneira que têm grande concentração de problemas. Não têm é a exclusividade dos problemas. Nós tendemos a pensar que os problemas só existem ali, que estes territórios têm a exclusividade de determinado tipo de problemas. Estes territórios podem é ter uma maior concentração de determinado tipo de problemas. Mas se nós formos ver, na maior parte destes territórios, predominam as situações ditas problemáticas ou predominam as situações ditas normais? As famílias dizem "nós somos uma família normal", e demonstram os sinais do que é uma família normal. E, se calhar, a maioria das famílias lá são estas. E isso posso dizer-lhe que é assim, pelos estudos que fizemos destes processos. Imagine o drama que é não dar continuidade a estes processos de mobilidade destas famílias nestes territórios. É extraordinariamente penoso e agravado por causa dos estereótipos e preconceitos das representações que se têm sobre estes territórios e sobre quem lá vive. O esforço que uma destas famílias tem para continuar a desenvolver a sua vida normal, com rotinas que algumas esqueceram e que outros, eventualmente ainda têm e que continuam, é extraordinariamente penoso porque ninguém os reconhece. Porque o facto de residir naquele território é extraordinariamente estigmatizante.
SOLIDARIEDADE - Mas, por exemplo, quando se estabelece uma relação do senso comum entre os fenómenos de criminalidade, de droga, e os bairros sociais, isso é abusivo?
Maria João Freitas - Não estou a dizer que não existe. Existe. O que estou a dizer é que não são todos traficantes de droga, da mesma maneira de que é mentira dizer que quem é negro é criminoso. Esse tipo de generalizações são muito abusivas. Não quer dizer que não haja lá criminalidade. O problema é que essas representações acabam por se basear em ideias que generalizam questões que, se calhar, nem sequer são as predominantes naqueles territórios. Fazendo retratos desfigurados daquilo que lá há. Normalmente essa desfiguração é sempre puxando para o lado negativo.
SOLIDARIEDADE - Mas isso acaba por propiciar o espaço e acaba por adequar a realidade à imagem? Como nos fenómenos da segunda e terceira geração?
Maria João Freitas - Não sei. Acho que o impacto das representações sobre a dinâmica das organizações internas é muito grande e cria revolta, cria dúvida e cria perda de força de vontade porque, de facto, os muros que eu tenho que passar para chegar àquilo que eu gostava que fosse são tantos, tantos, que a probabilidade de eu vir a cair de um desses muros é maior do que se eu não tivesse de ultrapassar muro nenhum. E aqui falo de muros como os muros da sociedade, que cada vez mais são muros mais altos, em que cada vez mais se vêem coisas incríveis nos processos de exclusão. Normalmente não vê uma pessoa a dizer "eu sou excluída". Vê uma pessoa a dizer "eu sou pobre". O processo de exclusão é um processo em direcção a estes grupos. Eu acho é que estas representações, quanto mais fortes são, e quanto mais gravosas são, e quanto mais intimidam, criam depois problemas de relacionamento. Mas criam sobretudo problemas de relacionamento destes indivíduos com a sua própria construção de identidade. Nós, à partida, nem perguntamos o que é que eles querem, o que é que eles sentem. Chamamos à partida segundas e terceiras gerações. Porque é que havemos de lhes chamar segunda geração se são portugueses? Podemos tentar encontrar categorias ao nível da academia mas isto é muito perigoso. Criamos categorias do ponto de vista analítico, para tentar perceber dinâmicas mas depois, rapidamente, elas tornam-se barreiras.
SOLIDARIEDADE - Quando fala em intervencionar nos bairros, refere trabalhar estes aspectos? Maria João Freitas - Também. Quando concebo intervenção em bairros não concebo apenas em termos urbanísticos nem apenas do ponto de vista financeiro. Eu acho que a intervenção tem que ser uma intervenção integrada. É preciso é ter cuidado nesta intervenção porque estamos a trabalhar com pessoas que têm hábitos diferentes. Se vemos estes bairros efectivamente como parte da cidade, estes bairros têm que ser intervencionados na ligação com a cidade e, se calhar, para optimizar o bairro tenho que intervir fora do bairro. Fazer chegar a cidade ao bairro e fazê-los chegar à cidade. E trabalhar este encontro. Porque é que eles estão separados? Porque este encontro nunca foi desejado, é evitado.
SOLIDARIEDADE - E as tentativas de tornar o bairro auto-suficiente, de criar estruturas no bairro?
Maria João Freitas - Eu acho que tem que haver estruturas. Não é preciso olhar só para os bairros. Olhamos para as nossas cidades e o que é que nós temos? Temos a mercearia da esquina mas também outro serviço que atrai mais pessoas, e é isso que dá vida. A multifuncionalidade dos sítios. Qualquer coisa que seja monofuncional dificilmente se aguenta. Portanto, se eu estou a criar instituições que sirvam apenas para aquelas pessoas obviamente eu estou a reforçar o seu fechamento ali dentro. Não quer dizer que aquelas populações tenham agora que ter tudo o que precisam nos locais próximos. Tem que haver aqui um equilíbrio entre o que eu posso ter ali dentro, que seja facilitação da regeneração, e tem que se ter um enorme cuidado na forma como se trabalha a acessibilidade nestes bairros. Não posso ter estes bairros metidos entre duas circulares, nem posso ter bairros onde só há uma entrada e uma saída. Acho que deve haver oportunidade às pessoas de lá irem e, claro, fazer também o contrário. Costumo dar este exemplo, relativamente à comunidade cigana. Toda a gente diz o pior em relação a esta comunidade. Ninguém diz do pior quando lhes vai comprar as camisolas à feira. A sociedade sabe muito bem instrumentalizar a mentalidade em relação e essas questões. Mas quando não lhe interessa segrega.
SOLIDARIEDADE - Faz sentido que, hoje, em Portugal, estes processos migratórios que têm vindo a crescer, esta vinda de estrangeiros, faz sentido aqui pensar em habitação social ou, de maneira nenhuma, há outras formas de ajudar estas pessoas a arranjar habitação?
Maria João Freitas - O que acho é que estamos muito habituados a pensar numa lógica de Política de Habitação Social. E acho que devemos é pensar na lógica da Política Social de Habitação, que é uma política completamente diferente porque aposta numa diversidade de soluções, em que a habitação social é uma das soluções. Acho que é preciso manter, ou pelo menos continuar a desenvolver, as políticas de habitação social. O Estado precisa de ter soluções para as pessoas que de maneira nenhuma se conseguem inserir no mercado. O mercado precisa é de desenvolver também, com mais ou menos apoios públicos, dando outras soluções que não sejam monolíticas. Em rigor, nós vamos atravessar uma fase complicada, e aí as pessoas vão começar a mexer-se. Porque já não são só os que habitam em barracas, há também aquelas pessoas escondidas em pensões e outros locais e que precisam de habitação. Começamos então a ter uma faixa de pessoas que nem são emigrantes, nem vivem ou viveram em barracas e que começam a ter uma enorme dificuldade de acesso ao mercado e até em manter a casa. Porquê? Porque as soluções que temos são uma renda de habitação, temos a habitação social, mas só para os que viviam em barracas até 1993, e depois temos umas estatísticas que dizem que Portugal tem muito mais casas que famílias…
E isto é uma grande mentira porque de facto Portugal continua a ter um enorme excesso habitacional mas também tem uma crescente procura habitacional em que não consegue encontrar respostas nesta fragilidade de opções que acaba por ter. Eu defendo que a solução não passa por acabar com a dita habitação social, que eu prefiro chamar um Parque Habitacional de Arrendamento Público, que é uma solução de arrendamento que é gerida por públicos, tal como podemos ter um Parque Habitacional de Arrendamento Privado.
Data de introdução: 2005-09-06