São várias as análises feitas sobre os tempos que correm que estão carregadas de uma certa descrença num futuro melhor.
Há aqueles que afirmam que no tempo deles era tudo melhor.
Há os que não acreditam nos dirigentes e nas elites que nos governam.
Há também, perigosos populistas e demagogos, que se aproveitam deste tipo de perceções para apresentar soluções fáceis e imediatas para todos problemas, por mais complexos que sejam.
Há ainda aqueles mais sensatos que não falam, ou porque sentem que não têm nada para dizer, ou já intuíram que não vale a pena expressar as suas opiniões, porque a sensatez não sendo hoje valorizada, também por isso não é notícia.
Vivemos assim um tempo em que na opinião publicada prevalece um certo pessimismo, traduzido numa atitude de ausência de crença num futuro melhor.
Este sentimento torna-se mais intenso nas épocas de finais de cada ano em que é normal que se façam balanços sobre o ano que passou e se projete o que vem aí. Então, como agora é o caso, quando se muda de década esses balanços são naturalmente mais densos porque se projetam em espaços temporais mais alargados seja para o passado e para o futuro
Assim, neste início de uma nova década vários articulistas e comentadores deram conta das inquietações, incertezas e angústias que foram identificando em vários domínios das esferas económicas, sociais e políticas e alguns profetizam que, em breve, alcançaremos um ponto de não retorno que assinalará o fim de melhores dias.
Parece que não fujo à verdade se disser que no início desta década o pessimismo prevalece na vida intelectual.
Será esta atitude razoável?
É certo que não se pode ignorar as ameaças de diversa natureza que pairam sobre a humanidade. Ter a consciência de que existem é a primeira das condições para as combater. Mas é também importante que se faça o exercício de olhar para a evolução que tem ocorrido no passado e perceber a notável evolução para muito melhor de que tem beneficiado toda a humanidade. Porque é que quando vemos melhoramentos fantásticos atrás de nós, não somos capazes de não ver mais nada senão os sinais de deterioração que estão à nossa frente?
No nosso País é impressionante a evolução operada nas últimas quatro décadas para muito melhor.
Há quarenta anos lembro-me, por exemplo, que várias freguesias do concelho de Mirandela não tinham ligação por estrada à sede do concelho e o único meio de transporte disponível era o burro.
Então nas áreas que têm a ver com a resolução de situações básicas que se situam nas áreas das vias de comunicação, escolas, abastecimento de água, eletricidade, tratamento de lixos e esgotos a evolução, no nosso País, tem sido muito significativa.
Em 1990, apenas 58% da população tinha acesso a água canalizada, enquanto em 2010 esse valor passou para 98%.
Em 1994, apenas 31% das águas residuais urbanas eram objeto de tratamento, para ser de 86% em 2017.
A disseminação de equipamentos educativos e culturais pela malha urbana do território representa outra evolução impressionante.
Em 1961 existiam 99 museus, em 1994 eram 333, e em 2014 já eram 674.
Quanto a bibliotecas, eram 89 em 1960, 735 em 1994 para passarem a ser 1018 em 2013.
A nível da humanidade em geral a evolução verificada no último século e, mais intensamente nas últimas décadas, é também claramente positiva e impressionante. A este respeito acabei de ler um livro intitulado “O Otimista Racional” de Matt Ridley que apresenta uma série de dados e factos que demonstram que o mundo está cada vez melhor. O acesso generalizado a alimentos, os rendimentos e o aumente de esperança de vida alcançaram níveis sem precedentes. As doenças, a mortalidade infantil caíram de forma acentuada. A África, depois da Ásia, está a sair da pobreza. As novas tecnologias melhoraram de forma muito acentuada o nosso quotidiano.
O autor do livro parte de uma retrospetiva da história da humanidade e conclui que, graças à ilimitada capacidade de inovação do ser humano, o século XXI registará progressos notáveis, não só materiais, mas também ao nível da biodiversidade.
Às vezes sabe bem operar uma desintoxicação com este tipo de leituras. Foi o que fiz nesta quadra natalícia.
José A. da Silva Peneda
Não há inqueritos válidos.