Um estudo realizado por uma socióloga na região Norte do país conclui que o realojamento das comunidades ciganas de forma demasiado concentrada pode aumentar os conflitos e a exclusão social destas minorias. "Nós, os Ciganos e os Outros", de Maria Manuela Ferreira Mendes, compara as realidades de comunidades de ciganos em zonas urbanas do Porto e em Espinho.
A autora, professora do departamento de Ciências Sociais e do Território da Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa, defendeu que as políticas de realojamento "são cruciais" para o sucesso da integração social destas comunidades. "Existem muitas teses que defendem tanto esta posição como a oposta", comentou, mas na sua experiência de campo, Maria Manuela Ferreira Mendes constatou que "a grande concentração pode trazer conflitualidade mesmo entre os membros da mesma comunidade". "Isto é válido tanto para os ciganos como para os africanos ou outras comunidades que fiquem muito concentradas num espaço e acabam por ser segregadas e estigmatizadas", sustentou.
A ligação da investigadora a esta área surgiu em meados dos anos 90, quando participou num projecto da Rede Europeia Anti Pobreza Portuguesa, uma entidade privada, realizado no Bairro de São João de Deus, no Porto, onde vive uma grande comunidade de ciganos.
Dos contactos com os jovens e as famílias para fornecer apoio na procura de formação e emprego, a socióloga aprofundou laços com a comunidade e decidiu fazer uma tese de mestrado para a Faculdade de Letras da Universidade do Porto, onde estudou sociologia.
Durante esse trabalho, também se apercebeu da desilusão gerada nas comunidades relativamente aos projectos de apoio que se desenvolvem em Portugal, muitos deles "de curta duração, sem continuidade e que acabam por gorar expectativas das populações".
Posteriormente, decidiu levar a cabo o presente estudo, comparando a realidade do Bairro de São João de Deus, no Porto, com comunidades de ciganos realojados em Espinho, Silvalde e Ponte de Anta.
Maria Manuela Ferreira Mendes concluiu que no Porto, o facto da comunidade estar demasiado concentrada num só bairro gerava muita conflitualidade e problemas de exclusão social. Ao contrário, na zona de Espinho, a dispersão do realojamento em vários bairros teve resultados positivos na integração social dos ciganos, que "eram bem aceites pelas outras populações e tinham uma boa auto-imagem".
Por seu turno, a comunidade cigana do bairro São João de Deus era "muito rotulada e segregada, com um duplo estigma por as pessoas serem ciganas e viverem num bairro problemático, que até é conhecido por Tarrafal e bairro dos Malditos", descreveu.
A investigadora considera que a elevada concentração é apenas um factor que explica as duas realidades tão opostas, mas bastante relevante. "Neste bairro, onde residem 3.000 pessoas, cerca de um milhar são de etnia cigana", indicou, comentando que a conflitualidade é frequente mesmo entre os próprios ciganos.
O objectivo do estudo, dirigido a um público geral, mas sobretudo aos especialistas da área social, é uma tentativa de compreender estas comunidades, ainda hoje vistas com algum preconceito.
A socióloga constatou que a imagem que os portugueses têm dos ciganos é negativa: "Basta ir ao dicionário ver o significado da palavra", que surge associada aos adjectivos "impostor", "ladino" e "traficante".
Na sua pesquisa, levada a cabo através de entrevistas e conversas informais, observou, nomeadamente, que "são pessoas com comportamentos exuberantes e fazem festas com muito barulho", características por vezes mal aceites pelas populações, mas que fazem parte das suas práticas culturais.
16.09.2005
Data de introdução: 2005-10-04