JOSÉ LEIRIÃO

O problema da fiscalidade na União Europeia

O sistema fiscal na EU abrangendo as empresas e cidadãos é um dos elementos em que existe liberdade dos Estados Membros estabelecerem o seu próprio sistema fiscal (impostos sobre as empresas, pessoas e bens, levando assim a que existam 27 sistemas fiscais diferentes na EU.

Esta liberdade conduz a que alguns Estados Membros não só decidem aplicar impostos mais baixos a grandes empresas globais como, por exemplo, a Irlanda e Luxemburgo e, em relação à Google, Apple e outras empresas globais, como a Amazon, prejudicando por esta via as receitas fiscais sobre estas e outras empresas noutros Estados Membros devido a um planeamento fiscal agressivo utilizado por aquelas empresas.

Por exemplo: a Google. Estabelecida na Irlanda, este Estado Membro aplica taxas de IRC muito baixas e/ou através de esquemas de crédito fiscal que beneficiam estas empresas globais para as manterem no seu país, prejudicando assim outros Estados Membros que decidiram manter um mesmo nível de fiscalidade aplicado a todas as empresas que operam no seu território.

Trata-se de uma situação injusta que urge resolver porque gera tensão e injustiça entre os Estados Membros do mercado comum europeu. O mercado interno garante o livre movimento de pessoas, bens e capitais, mas o estabelecimento dos impostos é da responsabilidade de cada Estado Membro. Deste modo, os Estados Membros são levados a uma organizada competição, a qual minimiza a sua soberania e receita fiscal, conduzindo a enormes perdas fiscais num período de dramáticas alterações climáticas, societais e outras globais sem precedentes, acrescidas pelos elevados prejuízos provocados pela crise da Covid-19 que requerem um muito elevado investimento público. Assim, sem receitas fiscais normais, alguns Estados são levados a contrair empréstimos no mercado de capitais aumentando dramaticamente a sua dívida pública, colocando um pesado fardo financeiro sobre as gerações actuais e futuras. 

Com efeito, no primeiro trimestre de 2020 cinco Estados Membros já tinham a sua dívida pública nacional maior do que o valor do seu PIB anual, ao mesmo tempo que as grandes corporações globais estão economizando pagando baixos impostos. Por exemplo: a Apple em 2011 obteve lucros de 16 biliões de euros na Europa, no entanto, pagou apenas 50 milhões de euros de impostos na Irlanda, isto só é possível porque a República da Irlanda facultou sistemas de poupança e de créditos de impostos à empresa.
Por outro lado, no Luxemburgo, a Amazon realizou em 2018 lucros operacionais na ordem dos  11 biliões de euros, no entanto, segundo acordo com as autoridades do Luxemburgo ainda conseguiu receber um crédito de imposto.
É necessário mudar o sistema.
Não é surpresa que as empresas globais retirem vantagens das peculiaridades dos sistemas de impostos dos vários Estados Membros através de um agressivo planeamento fiscal quando formalmente aderem à letra da lei.
O princípio de fiscalidade justa para empresas e cidadãos é portanto um horizonte ainda  muito longínquo, e como resultado das disparidades entre os Estados Membros, que se vão alargando e tornando ainda mais gravosas essas diferenças, devido à pandemia Covid19. Quando o objectivo seria convergir. A Comissão Europeia afirma que a evasão e fraude fiscal  são uma ameaça para as finanças públicas dos Estados Membros e que agora mais que nunca os Estados Membros necessitam de receitas seguras para investir nas pessoas e ajudarem as empresas a manterem-se viáveis, mantendo o emprego. No entanto, isto é insuficiente e também por que a directiva da UE para combater a evasão fiscal tem demonstrado estar longe de ser eficaz. Com efeito, a perda de receitas pelos Estados Membros devido à evasão internacional de impostos, os Estados são obrigados a financiarem-se e captar investimento estrangeiro principalmente em esquemas de crédito, aumentando a sua dívida pública.   Portanto esta também não é uma boa solução.

Uma solução mais justa e efectiva, suportada por 74% dos cidadãos europeus, é de que é  urgente uma acção da Comissão e tomar medidas mais eficazes que apliquem no espaço  europeu uma fiscalidade mais justa e aceite por todos os Estados Membros e esta só poderá ser alcançada em conjunto, através de esforços para encontrar uma efectiva e justa regulação a nível global através de esforços de regulação  conjuntos envolvendo a OMC, mas tal ambição pode também levar a uma guerra comercial em que todos perdem. Creio que uma política fiscal justa só será atingida quando as pessoas certas ocuparem os lugares chave e a palavra solidariedade e os valores do bem comum tiverem o mesmo significado para todos, mas quando vai isso acontecer? Infelizmente vai sendo cada vez mais difícil encontrar homens ou mulheres com a visão e compromisso semelhante aos dos pais da União Europeia de há cerca de 65 anos. Resta-nos continuar a ter esperança que tais personalidades apareçam e se comprometam na construção de um mundo melhor para todos. Será isto utópico? Não. Depende da vontade humana aprender com os erros e emendá-los em favor de todos.

 

Data de introdução: 2020-12-09



















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