EUGÉNIO FONSECA, PRES. CONF. PORT. DO VOLUNTARIADO

ENCP: Um nobre desafio a Portugal

Finalmente, foi aprovada uma Estratégia Nacional de Combate à Pobreza (ENCP). Apesar de haver aspetos importantes por conhecer, no que respeita a exequibilidade desta Estratégia, em termos gerais, considero que ela poderá vir a ser a tentativa ou a solução para responder à vergonhosa realidade persistente em Portugal que é a dos níveis de risco de pobreza oscilarem entre os 17% e os 22 %. 

Para um país integrado na União Europeia e com potencialidades endógenas significativas, o número de cidadãos em situação de pobreza severa, a quantidade de crianças que são afetadas por falta de condições básicas de subsistência, a injustificável pobreza geracional, bem como a que atinge uma taxa considerável de empregados, são evidências que demonstram nunca ter havido a vontade política bastante que levasse a enfrentar, com determinação, tão graves problemas para se alcançar o desenvolvimento integral e consistente do país.

A forma como está elaborada a ENCP aponta para a superação de uma injustificável incoerência em que decorreram muitos programas de combate à pobreza: eram maiores os investimentos financeiros no funcionamento das estruturas criadas, que nas ações programadas para se alcançarem os objetivos determinados. Desejo que sejam bem-sucedidos os programas de aproveitamento e rentabilização dos recursos infraestruturais e humanos existentes e a metodologia de articulação entre diferentes setores ministeriais, conjugada com uma ligação às autarquias e a todo o tipo de organizações, formais e informais, da economia social, contando com a participação direta dos próprios destinatários. Para que seja eficaz esta indispensável articulação, há que não cair na fatalidade que tem sido o excesso de procedimentos se tornarem num emaranhado burocrático. 

Como já referi, ainda existem muitas medidas concretas que farão parte dos previstos planos de ação para se sintonizar, realisticamente, com os eixos estratégicos estabelecidos, se tornarem alcançáveis os indicadores e metas determinados. Também há que saber como será o relacionamento, nomeadamente no que respeita à articulação da Comissão Técnica de Acompanhamento da ENCP com as autarquias e os representantes nacionais dos diferentes setores da economia social, bem como o das autarquias com as instituições locais e destas entre si.

Sem prejuízo de se voltar a este assunto, é importante que as IPSS e as demais organizações da economia social se comecem a preparar para integrarem, por inteiro e nas diferentes frentes, as ações que vierem, em conjunto com elas, a constituírem os Planos de Ação. Quer dizer que a motivação e a preparação têm de redobrar, particularmente nesta área da intervenção socioeconómica, desde já, procurando estarem atentos para fazerem parte da implementação da ENCP em todas as suas fases e não apenas como executantes de realizações pensadas por outros, por vezes mais distantes das realidades em causa. Os representantes nacionais das IPSS e de outras organizações da sociedade civil têm assegurada a sua participação nos “fóruns consultivos”. Mas a missão mais importante está na capacidade de adaptação dos Planos de Ação às realidades de cada comunidade. Aí entram as autarquias, a começar pelas Juntas de Freguesia e as IPSS, assim como com organizações de âmbito local. Para que funcionem sem o risco de sobreposições serão criados, no âmbito do Eixo Estratégico 5, “Fóruns Locais de Combate à Pobreza” e revista e fortalecida a Rede Social. Bastaria a revisão da Rede Social no que concerne aos seus objetivos e metodologias de intervenção, pois o aparecimento de mais uma estrutura levará, ao que já acontece: serem os mesmos representantes a integrarem as duas instâncias. Mesmo que seja assim, nenhuma IPSS se deveria dispensar de estar representada nestes dois órgãos de âmbito local. Prevê-se a participação de toda a comunidade, em particular, dos públicos envolvidos na auscultação e participação direta, através dos designados “Projetos de Adesão (“modelo bottom-up” – de baixo para cima). As IPSS e demais organizações formais ou informais da sociedade têm uma missão incontornável na sensibilização e motivação das populações e que sejam as principais impulsionadoras dos referidos Projetos, bem como na monotorização das ações em curso ou realizadas.

A ENCP apresenta-se como um enorme desafio ao funcionamento do Estado, ao enraizamento popular das autarquias, à revitalização das IPSS e demais Organizações, direcionando-as, ainda mais, para dinâmicas de desenvolvimento comunitário ou socio-local.

Mas o maior desafio de todos está na concretização dos pontos 6.2.1. e 6.2.2. do Eixo Estratégico 6 que têm, respetivamente, como objetivos: “Promover uma nova visão sobre a necessidade de erradicar a pobreza” e “Reconhecer com nitidez e pedagogia o sentido do combate à pobreza nas condições contemporâneas”. Isto exige uma transformação de mentalidades muito grande. Se não se conseguirem alcançar estes dois objetivos, praticamente tudo poderá ficar em causa. Mas as causas difíceis são para os audazes; e os colaboradores assalariados e voluntários das lusas instituições já deram, em muitas ocasiões, provas disso.

Voltarei a refletir sobre outros aspetos da ENCP e o compromisso, em particular, das IPSS.   

 

Data de introdução: 2022-01-12



















editorial

TRABALHO DIGNO E SALÁRIO JUSTO

O trabalho humano é o centro da questão social. Este assunto é inesgotável… (por Jorge Teixeira da Cunha)  

Não há inqueritos válidos.

opinião

EUGÉNIO FONSECA

IPSS OU EMPRESAS SOCIAIS: uma reflexão que urge fazer
No atual cenário europeu, o conceito de empresa social tem vindo a ganhar relevância, impulsionado por uma crescente preocupação com a sustentabilidade e o impacto social.

opinião

PAULO PEDROSO, SOCIÓLOGO, EX-MINISTRO DO TRABALHO E SOLIDARIEDADE

A inatingível igualdade de género
A Presidente da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE) foi à Assembleia da República no dia 3 de outubro com uma má novidade. A Lusa noticiou[1] que...