Em novembro passado, neste jornal, o estimado e competente cidadão, José Silva Peneda, escreveu sobre a pobreza em Portugal. Apresentou dados de estatísticas europeias sobre a pobreza em Portugal. No dia 23 de dezembro, o Instituto Nacional de Estatística (INE) divulgou números sobre a mesma temática, mas revelando, nalguns setores, taxas superiores.
Não se entende que os parâmetros da Pobreza, no nosso país, tenham oscilações tão pouco significativas que indiciam estarmos perante um fatal flagelo humano, sem possibilidades de ser erradicado. Desiludam-se o que defendem que basta fazer crescer a riqueza nacional para se conseguir resolver as questões de carência de meios financeiros. Sem critérios justos da distribuição dos resultados do que se produz, a pobreza não desaparecerá. É desta incoerência socioeconómica que resulta o drama persistente das desigualdades sociais que geram diferentes formas de exclusão social com consequências perniciosas para o desenvolvimento humano com o qual está, intrinsecamente, relacionado o cuidado global com toda a Natureza. O crescimento económico é apenas um dos meios para o desenvolvimento integral. Há evidências de sobra a provarem que o aumento da riqueza é, por vezes, feito à custa do empobrecimento e de alterações maléficas de recursos naturais. Por outro lado, a excessiva preocupação “financeirista” da economia, que se centra mais na obtenção gananciosa do lucro, é alcançada à custa do enfraquecimento económico (até de quem trabalha) por via da prática de baixos salários. A isso se referia Silva Peneda, no texto acima indicado, ao dar nota de que “33% dos pobres, em Portugal são trabalhadores”. Há ainda quem defenda que, em tempos de crises socioeconómicas, é preciso primeiro criar riqueza, mesmo que se tenha de diminuir ou cortar apoios sociais, para depois os retomar. Todavia, há já economistas, alguns até, a quem foram atribuídos os Prémios Nóbeis da Economia e da Paz, que garantem não ser imperiosa esta opção. Muitas das nossas IPSS têm dado evidências disso, ao criarem emprego e ao disponibilizarem-se para receberem, para além das que já as frequentam, pessoas carenciadas a precisarem dos seus serviços em tempos difíceis, a vários níveis.
No que diz respeito à erradicação da pobreza, Silva Peneda apresentou os pressupostos fundamentais: «No combate à pobreza o papel reservado ao nível local tem de ocupar uma posição de relevo. Paralelamente a uma visão integrada, articulada e coerente da política social, a busca de soluções terá de ser encontrada na base da proximidade, com envolvimento dos destinatários, das instituições particulares de solidariedade social, das autarquias e dos serviços pertencentes à administração central, designadamente segurança social, educação, emprego e habitação. Sem este pressuposto de organização poucos ou nenhuns resultados poderão alcançar.» (Jornal “Solidariedade”, novembro, 2021, pg. 14). Com base nesta dinâmica, como sabemos, desde o dia 29 do passado mês de dezembro, está aprovada a Estratégia Nacional do Combate à Pobreza. Na sua execução, as IPSS irão ter o precioso contributo a dar. Deixo algumas singelas propostas de contributos:
1.º É fundamentalíssimo que os dirigentes e demais colaboradores das IPSS acreditem, sem reservas, que a pobreza não é uma fatalidade e é possível erradicá-la, a curto prazo, na sua expressão mais severa e a médio e longo (não infinito) poderá ser mesmo erradicada. Enquanto se considerar que as principais causas da pobreza são da responsabilidade de quem está amarrado a ela, o combate será muito mais difícil;
2.º As IPSS devem assumir ou reforçar uma metodologia interna de interligação e articulação entre as diferentes valências, evidenciada, desde logo, nos programas anuais, nos quais os colaboradores, os utentes e seus familiares, em conjunto, têm uma missão incontornável;
3.º Transformar as instituições que apenas se comportam como prestadoras de serviços, em agentes de desenvolvimento comunitário, interagindo com as populações envolventes, criando grupos locais que viabilizem a participação das pessoas beneficiárias, ou não, das ações que a Estratégia Nacional vier a implementar a nível local ou, mesmo nos de nível nacional, que apontem para exigências de proximidade. Nenhumas instituições, incluindo as Juntas de Freguesia, estão tão bem posicionadas para a constituição de grupos em que as pessoas possam dar as suas opiniões. Conseguir isso, seria uma revolução nas metodologias de participação existentes;
4.º Não desvalorizar a participação ativa e persistente nas Comissões Locais de Freguesia e nas Redes Sociais Municipais. Estas duas instâncias precisam de uma revisão profunda, mas até que isso aconteça, devem continuar a funcionar, e serem reativadas ou criadas, onde não existam;
5.º A candidatura aos programas que a Estratégia apresentar, analisando bem os impactos que poderão ter quanto aos objetivos almejados, e nunca como possibilidade de obterem mais meios de financiamento;
6.º Disponibilizar instalações para a realização de atividade mesmo promovidas por entidades exteriores, a fim de se alcançar o objetivo, indelével, da proximidade;
7.º Apoiar as pessoas e instituições no acesso às oportunidades que aparecerem, sobretudo quando a trágica burocracia dificultar qualquer candidatura;
8.º Criar condições de cooperação com Estado, fundamental parceiro, para que nenhum colaborador/a de qualquer IPSS faça parte da estatística dos trabalhadores pobres. Ninguém terá força anímica para contribuir para a erradicação da pobreza de outros quando vive na mesma situação.
Sem a participação das instituições que garantam a aplicação próxima das Políticas Públicas, o seu sucesso terá mais dificuldades de ser alcançado. Mas é preciso que os dirigentes e colaboradores dessas instituições estejam, devidamente, capacitados para colaborarem. Em alguns casos, estaremos a falar de uma autêntica “revolução de mentalidades”.
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