Carvoeiro é uma pequena localidade do concelho de Lagoa, que em conjunto com a sua sede formam uma das suas quatro freguesias e que tem no Centro de Apoio Social de Carvoeiro (CASC) a única resposta social local.
Dedicada à infância, o CASC tem capacidade para 99 crianças, 49 em creche e 50 em Pré-escolar, sendo que acolhe apenas 47 petizes, pela redução de capacidade de uma sala, porque há uma menina com necessidades educativas especiais.
“No Carvoeiro não há mais nenhuma resposta para infância, mas em Lagoa há o Centro Popular de Lagoa com essa resposta na freguesia”, começa por dizer Márcia Oliveira, a diretora-técnica da instituição.
Tendo em conta a situação verificada em termos de carência de respostas a serviços de proximidade na freguesia e na procura de equidade e justiça social, em 2005, foi assinado, um contrato de Comparticipação Financeira e Cooperação Técnica, que resultou na construção de um equipamento de creche, em funcionamento desde junho de 2009.
“Para falar da história desta casa, tem que se falar do senhor Viegas, que foi quem se lembrou de fazer alguma coisa pelo Carvoeiro. E não fosse ele e algumas pessoas que o acompanharam nesse propósito, nós não estávamos aqui”, recorda Márcia Oliveira, que está na instituição desde a sua criação.
A Associação começou em 2003, depois constituiu-se como IPSS e foi com o apoio do Fundo de Desenvolvimento Social (FDS), que o CASC avançou para a construção da creche, contando “com o apoio imprescindível da Câmara Municipal de Lagoa, sem o qual a instituição não estava aqui”, ressalva a responsável.
«A Escolinha», como é denominado o jardim de infância, arrancou apenas com a resposta de creche e, ainda, sem berçário, surgindo o Pré-escolar uns anos mais tarde, juntamente com o berçário.
“No início tínhamos duas salas de 12 aos 24 meses e duas salas dos 24 aos 36 meses, mas estavam a sair crianças que a única sala de Pré-escolar pública que há no Carvoeiro não conseguia absorver”, recorda Márcia Oliveira, acrescentando que “muitos pais queriam que as crianças se mantivessem na instituição”.
Com a pressão dessa necessidade de Pré-escolar e igualmente de berçário, a Direção decidiu avançar para uma requalificação das instalações e com a adaptação de alguns espaços, conseguiu criar salas para alargar a resposta.
Ao longo da conversa com o SOLIDARIEDADE, a diretora-técnica do CASC não teve pejo em repetir que “sem o apoio da Câmara Municipal de Lagoa, a instituição não existia”. De dimensão reduzida e apenas com resposta para a infância, a sustentabilidade da instituição é difícil, o que evidencia que algo de errado se passa mesmo com os acordos de cooperação.
No entanto, tudo fica mais complicado quando o Pré-escolar não está coberto por nenhum acordo de cooperação com a Segurança Social.
E não tem acordo de cooperação porquê? “Já há tempos, em 2013, fizemos uma candidatura, mas não obtivemos resposta e, depois, surgiu o Procoop. Entretanto, fizemos uma nova adaptação ao espaço e criámos uma nova sala, no final de 2019. Não temos uma candidatura, neste momento, no Procoop, porque para o podermos fazer temos de ter tudo segundo as normas. Por isso, tivemos de alterar o projeto de combate a incêndios e as medidas de autoproteção. Por exemplo, tínhamos portas normais e agora colocámos portas corta-fogo. Estamos a adequar as instalações às normas vigentes”, explica Márcia Oliveira.
“Em creche, tivemos que fazer alterações que, se não tivéssemos feito para criar mais uma sala e tivemos de mudar as dimensões, não teríamos necessidade de mudar as portas. E, assim, foi necessário fazer essa mudança… mas está quase tudo pronto”, acrescenta Ângela Vieira, a diretora pedagógica do CASC.
“Uma das coisas essenciais para podermos avançar com uma candidatura é o parecer da AENPC. Só depois de termos tudo em condições é que podemos pedir a vistoria e, então, avançar para o Procoop”, sustenta Márcia Oliveira, sublinhando: “No fundo, isto é um Pré-escolar privado, só não pagam o que se paga num privado! Há um teto mínimo e um máximo nas mensalidades, mas não chegam aos valores dos privados”.
Tudo isto levanta problemas económico-financeiros à instituição, porque não tem margem de manobra, como explica a diretora-técnica: “Por exemplo, fazer esta obra de mudança das portas, não fosse o apoio da Câmara Municipal de Lagoa, a instituição não tinha condições de avançar. Era impossível! E não fosse a Câmara já tínhamos fechado, repito. Há que dizer isto, porque é a realidade. Estas quase 100 famílias tinham que colocar as crianças noutro lado e as 22 funcionárias tinham que ir trabalhar para outro lado ou ir para o desemprego”.
Sobre a gratuitidade da creche, Márcia Oliveira considera que, “em primeiro lugar, para ser gratuita deveria ter sido logo para todas as crianças” e explica: “Uma família que tenha uma criança com dois anos e meio e outra com seis meses, na creche uma paga e a outra não! Mas são crianças iguais! Devia ter sido para todos ao mesmo tempo e não apenas para os que estavam a entrar”.
Ainda assim, apesar de algumas famílias questionarem a situação, “não foi nada de especial”. Em termos internos a adaptação foi fácil.
“Na instituição adaptámo-nos bem. Penso que a Covid-19 trouxe muitas coisas para as IPSS. Conseguir trabalhar em cima do joelho como fizeram, com portarias constantes, interpretá-las e aplica-las, deu um grande know-how ao pessoal das instituições, o que não foi mau. E aqui temo-nos adaptado consoante as situações”, argumenta, acrescentando que, “em termos financeiros, a gratuitidade da creche não mexe com a instituição”.
Socioeconomicamente, a população que a instituição serve não é abastada, mas o principal problema da instituição é (ou era mais no passado) outro.
“Dantes as coisas eram mais difíceis, porque estamos no Algarve e havia muita economia informal, não declarada, e isso mexia muito com as nossas contas, porque não tínhamos a que nos agarrar para aplicar as mensalidades. Tínhamos uma normativa em que podíamos averiguar a situação e se conseguíssemos comprovar que havia mais rendimentos do que os que nos declaravam, podíamos aplicar o custo médio real por utente. No nosso caso, é o valor máximo, que é sempre abaixo do custo real! Dantes, se calhar, tínhamos 50% das famílias nessa situação, hoje já não é assim, de todo. Melhorou muito nesse aspeto, mas não posso dizer que é uma comunidade de classe média, porque são pessoas que na maioria recebe o salário mínimo”, sustenta Márcia Oliveira.
O Carvoeiro, por outro lado, atrai também muitos europeus que ali instalam a sua residência, alguns a trabalhar para os seus países de origem, como Inglaterra, Países baixos e outros. Isso, para as responsáveis por «A Escolinha» é positivo.
“Temos, de facto, uma grande comunidade de estrangeiros. E essa multiculturalidade é muito boa, é bom sentir essa diversidade cultural, porque temos uma grande variedade de nacionalidades”, afirma Ângela Vieira, que destaca a disponibilidade dos pais para as atividades dos filhos.
Apesar das dificuldades, os responsáveis pelo Centro de Apoio Social de Carvoeiro gostariam de alargar a sua resposta à terceira idade. A criação de um Serviço de Apoio Domiciliário (SAD), que no Carvoeiro é prestado pelo Centro Popular de Lagoa, instituição da sede de concelho, é uma necessidade que a instituição gostaria de colmatar.
“Está nos estatutos e no horizonte da instituição. Atualmente, temos andado a arrumar a casa, em termos financeiros, porque em creche temos acordo com a Segurança Social, mas em Pré-escolar não e é muito difícil gerir essa parte. Mas, no futuro, gostávamos muito de enveredar pelo SAD. Mas antes é preciso perceber se as nossas instalações têm capacidade para acolher os serviços necessários a essa resposta, como a lavandaria e outros”, revela Márcia Oliveira, que sublinha que “faz falta um SAD no Carvoeiro”.
Em jeito de comentário, Márcia Oliveira deixa um desabafo: “Muitas vezes os trabalhadores desta casa damos mais do que aquilo que as pessoas pensam. As pessoas não imaginam, mas há uma grande dedicação e as pessoas não têm consciência do que é trabalhar numa IPSS. As pessoas lembram-se todas da Raríssimas e pensam que as instituições são todas Raríssimas, mas não sabem os esforços que temos que estar sempre a fazer para isto dar para toda a gente, prestando um bom serviço. Por vezes, há pais que ficam chateados com determinada situação, mas nós estamos aqui para zelar pelo bem-estar de todos os meninos e meninas, não é para cuidar só de uns e não de todos”.
A isto, Ângela Vieira acrescentou: “Nós vemos isto como a nossa casa, a nossa família. Sentimos isto como se fosse nosso, sabendo que não é. Temos muito esse sentimento de pertença e, por vezes, acabamos por sentir de mais a casa. Aqui temos um ambiente muito bom e muito saudável”.
CASCARTE
No início do ano letivo de 2021, e com o horizonte de 2024, o Centro de Apoio Social de Carvoeiro encetou um novo projeto educativo, denominado CASCArte.
Sob o lema «A Arte na Escola», o tema foi escolhido por ser “muito interessante” e possibilitar “trabalhar muitas vertentes e muitas competências, tanto em creche e em Pré”.
Ângela Vieira, a diretora pedagógica, considera que, “assim, é melhor do que arranjar um tema que se restringisse a um ano letivo, o que era limitador, sendo que este dá para trabalhar em todas as idades”.
E, segundo a responsável, “nota-se que as crianças gostam de criar e de explorar e a arte acaba por lhes dar isso”.
“Em termos práticos, fazemos muita exploração de obras de arte. Por exemplo, no dia dos namorados explorámos um quadro e depois fizemos uma espécie de galeria de arte que eles exploraram. Este ano foi na Páscoa e os pais quando vinham buscar os filhos, depois de uma caça ao ovo, tinham que passar pela exposição. Para além de trabalharmos com tintas, utilizamos muitos materiais reutilizáveis, como tecidos, plásticos, dando sempre asas à exploração e à criatividade. Em creche são mais orientados e é mais na base da exploração sensorial, no Pré deixamos que sejam as crianças fazer as coisas mais sozinhos”, explica Ângela Vieira.
Beneficiando ainda de espetáculos, teatrais e outros, que o município disponibiliza, a instituição aproveita-as para estimular o gosto das crianças pelas diversas artes.
“Este ano temos apostado muito na arte a nível da natureza. Por exemplo, na minha sala, com paus e tecidos, as crianças fizeram uns bonecos que agora vão entrar numa peça de teatro, cuja história serão eles a construir. É muito à base da exploração e da criatividade e não se restringe à pintura”, refere, deixando um elogio aos pais: “Os pais são participativos, pois quando lhes solicitamos algo, eles participam e contribuem. Desde a Covid as pessoas parece terem mais sede destas coisas. Nas festas e até nas reuniões de pais, sentimos que estão mais participativos e tem sido, assim, depois da Covid”.
Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)
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