É bem conhecido o título, de Samuel Beckett, «À espera de Godot», no caso do Centro Social e Cultural de Orgens, em Viseu, a história é mais «à espera do Procoop».
Isto, porque a ERPI, entretanto, inaugurada não tem protocolo com a Segurança Social, apesar de ter havido “uma candidatura aprovada no Procoop… mas já não havia verba”.
“A ERPI começou a funcionar no dia 1 de junho de 2020 e ainda não houve inauguração oficial. Abrimos no período de pandemia”, começa por dizer Celestino Martins, um dos quatro vice-presidentes de Horácio Faria, presidente da instituição viseense, sustentando ainda: “Penso que é um caso de estudo, porque não faleceu ninguém com Covid-19 e fomos enchendo a ERPI gradualmente em plena pandemia. Tivemos casos de Covid, inclusive alguns utentes em isolamento já na fase final, mas não houve situações dramáticas. A equipa ficou na instituição em permanência e ninguém saiu enquanto a situação não passou”.
Assim, sem qualquer apoio da Segurança Social, “as mensalidades atualmente estão a cobrir, minimamente, os custos”, refere, acrescentando que a resposta já está a “ter prejuízo”.
“A nossa mensalidade base é de mil euros. As instalações da ERPI são um autêntico hotel de cinco estrelas. Temos piscina, fisioterapia, cabeleireiro, um salão para ginástica, gabinete de psicologia, e enquanto não tivermos acordo de cooperação as pessoas sabem que para virem para aqui têm que pagar mil euros. Estamos à espera, quando abrirem novamente as candidaturas ao Procoop, entregaremos a nossa”, afirma Celestino Martins.
A obra custou 3,3 milhões de euros e a instituição pediu um empréstimo à banca de 2,375 milhões de euros.
“Isto dá-nos um encargo mensal muito elevado. Estávamos à espera do PARES, mas primeiro foi para as creches e, quando surgiu para as ERPI, a instituição já tinha licença de utilização da Segurança Social e licença de funcionamento da Câmara Municipal de Viseu, o que nos impediu a concorrer a qualquer tipo de programa, quer fosse o PARES, quer fosse o PRR. Por isso, estamos ansiosos que venha o Procoop, senão, dentro de pouco tempo, não temos viabilidade financeira”, argumenta.
A necessidade da comunidade, a vontade dos dirigentes foi sendo construída com dificuldades, que levantam problemas à instituição.
“A ERPI, apesar de ser uma obra que ia fazer crescer o edifício já existente, foi considerada uma obra autónoma e o PARES nessa altura só apoiava requalificações. Fomos aguardando, mas avançámos com a obra, porque havia uma grande necessidade na comunidade. Muitas das pessoas do Centro de Dia já estavam a precisar de outra resposta que só um lar podia dar. Depois, tínhamos já tudo em condições, veio a pandemia, quando nós já tínhamos o pessoal contratado e a receber”, recorda Mário Lourenço, outro dos vice-presidentes, ao que Celestino Martins acrescenta: “Não tínhamos a valência a funcionar, mas já tínhamos o pessoal contratado e não o pudemos colocar em lay-off. Abrimos em junho, porque tínhamos o pessoal contratado desde março, a receber e sem poder trabalhar”.
Estas e outras situações têm debilitado as finanças do Centro, que nos últimos quatro anos tem registado saldo negativo, “em virtude das amortizações”.
“Apesar de tudo, conseguimos um resultado contabilístico operacional positivo, mas muito reduzido. No entanto, com as amortizações temos um resultado negativo. Neste momento, ainda com a agravante do aumento dos custos da energia, chegámos a pagar 18 mil euros de gás num mês. Estes aumentos fizeram com não tivéssemos capacidade financeira para pagar os subsídios de férias e de Natal. Assim, no ano passado tivemos que recorrer à banca para pagar o subsídio de férias e no final do ano tivemos uma pequena ajuda, que foi a nível nacional, o apoio extraordinário da Segurança Social, que ajudou a pagar o subsídio de Natal”, recorda Celestino Martins, considerando que o futuro não se mostra fácil: “Neste momento, não estamos a libertar verbas para o subsídio de férias, porque o dinheiro vai todo para pagar as prestações dos dois empréstimos aos bancos. Neste momento, são perto de 20 mil euros por mês que estamos a pagar à banca, o que nos provoca um grande desequilíbrio financeiro”.
Os dirigentes têm tentado chegar a alguns apoios, mas as portas têm-se fechado.
“Já fizemos algumas tentativas e candidaturas, inclusive ao Fundo de Socorro Social, há três anos. Recorremos à Segurança Social, mas como não devemos a fornecedores, nem a trabalhadores, não devemos à Segurança Social, nem às Finanças… temos estabilidade financeira. Devemos é à banca e, mês após mês, as condições financeiras da instituição estão a apertar mais”, lamenta, insistindo na ideia de que é nos acordos de cooperação que está o reequilíbrio financeiro da instituição.
“Estamos convictos que a nossa salvação passa pelo Procoop, para podermos rever as mensalidades e isso já nos daria algum desafogo financeiro. A nossa principal preocupação é resolver a questão dos acordos de cooperação da ERPI, porque temos capacidade para ter mais utentes em SAD e em Centro de Dia. E só não temos já mais utentes nestas duas valências, porque não queremos apertar mais a situação financeira da instituição. Se não fôssemos uma IPSS, o Centro de Dia era para fechar, porque nos dá muito prejuízo, mas temos uma responsabilidade social que queremos cumprir”, assevera Celestino Martins.
No passado dia 21 de março, o Centro Social e Cultural de Orgens assinalou meio século de existência. Contudo, a primeira semente data de 1948.
O primeiro rancho folclórico (Rancho Folclórico Flores da Minha Aldeia) surgiu em 1948, terminou em 1955 e recomeçou em 1973, como Rancho Folclórico de Orgens. Depois, em 1976, nasceu o Centro Popular de Trabalhadores de Orgens, filiado no Inatel.
Então, a 21 de março de 1983, dá-se a fusão das duas entidades, surgindo o Centro Cultural e Recreativo de Orgens. Já em 1991, após uma alteração de estatutos e ter sido reconhecida como IPSS, a instituição passou a designar-se Centro Social, Cultural, Desportivo, Defesa do Ambiente e Património de Orgens, para assumir a denominação atual de Centro Social e Cultural de Orgens, após nova alteração de estatutos em 2015.
“Quando esta equipa chegou, os aniversários eram contados a partir de 1973, pelo que mantivemos essa contagem e daí termos celebrado 50 anos no passado mês de março”, conta Celestino Martins, que acrescenta: “Somos uma instituição sui generis, pois somos uma IPSS com a vertente social, mas também temos o desporto, com o ténis de mesa (campeão nacional sub-11 e dois em veteranos), ainda temos a parte cultural, com um rancho folclórico, a tuna regional, uma parceria com o Teatro Projeto Off, que fazem aqui os ensaios e apresentam dois espetáculos na instituição, e ainda os Zé Pereiras”.
A atividade social da instituição começou por um projeto de alfabetização, ainda nas antigas instalações no centro da aldeia. “Terminado esse projeto, a Direção que se seguiu voltou-se mais para a área social. Assim, em 1980, começou pelo ATL e, depois, veio o SAD. Já não temos ATL, porque na escola primária foi criada uma Associação de Pais que passou a prestar esse serviço. Atualmente, fomos apoiados pelo PRR para a requalificação do espaço do ATL para criarmos uma nova creche, com a mesma capacidade da que já temos atualmente”.
De momento, a instituição tem em funcionamento uma creche com 42 bebés (em três salas) e um Pré-escolar com 44 petizes.
“O trabalho que fazemos com as crianças é de grande qualidade e todos os pais querem colocar os filhos aqui na nossa creche. Temos uma lista de espera muito grande, porque chegámos a um patamar de qualidade muito elevado e acima da média”, afirma Celestino Martins.
Já na área da terceira idade, o SAD apoia 43 utentes, o Centro de Dia 15, apesar da capacidade protocolada de 25, enquanto a ERPI acolhe 60 idosos, valência sem acordos de cooperação.
“No Centro de Dia, a pandemia levou à diminuição de frequência, mas também como abrimos a ERPI, houve alguns utentes que passaram de uma para a outra resposta. Mas foi mais devido à pandemia. Depois, os elevados custos que o Centro de Dia tem, não nos interessa ter muitos mais utentes, porque esta é uma resposta que nos dá sempre prejuízo anual de cerca de 50 mil euros”, revela.
A instituição é ainda proprietária de uma quinta, onde gostaria de desenvolver para que os utentes possam ter experiências no exterior.
“Falta-nos financiamento para fazermos uma piscina, uma parte mais temática para as crianças e também para os idosos. O projeto de desenvolvimento da quinta, que é o próximo que queremos avançar, está, para já, à espera de financiamento. Temos mais projetos, mas temos primeiro que resolver a situação financeira da instituição. Por outro aldo, queremos também a certificação de qualidade, apesar de trabalharmos segundo todas as normas exigidas, mas falta avançarmos com o processo de certificação para termos o selo”, sustenta Celestino Martins, sublinhando uma ideia: “A nossa ambição é sermos uma instituição de referência. Na área da infância já somos, mas queremos ser também nos idosos”.
Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)
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