Dezenas de dirigentes, técnicos e outros trabalhadores das IPSS associadas da CNIS participaram no seminário «Complementaridade entre as áreas da Saúde e da Ação Social nas Respostas Sociais de Acolhimento», que decorreu no auditório da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra.
Refletir sobre a prestação de cuidados nas respostas sociais de acolhimento residencial (Estrutura Residencial para Pessoas Idosas, Lar Residencial, Casas de Acolhimento, Centros de Apoio à Vida, Centros de Alojamento Temporário e Residências de Autonomia para a Inclusão, entre outras) era a principal proposta da CNIS para a jornada de trabalho em Coimbra, mas também, entre outras questões, tentar identificar metodologias de articulação entre as IPSS, a Segurança Social e a Saúde de forma a assegurar cuidados individualizados e integrados que respondam às necessidades dos utentes em todos os domínios.
Transversal a, praticamente, todas as intervenções ao longo do dia foi a necessidade de a Saúde estar mais próxima das instituições que têm respostas sociais de acolhimento, porque, cada vez mais e em especial nas respostas à terceira idade, as pessoas mais velhas já chegam às instituições cheias de problemas de saúde, com especial destaque para as demências.
“A idade é um privilégio e deixemos de olhar para os velhos como um problema”, começou por dizer o médico psiquiatra António Leuschner, na conferência «Cuidar em resposta social de acolhimento» que protagonizou, lembrando que “cuidar é dar atenção” e “muito do que as pessoas mais velhas precisam é de atenção”.
De seguida, o psiquiatra, que presidiu ao Conselho Nacional de Saúde Mental, recordou que Portugal é um dos três primeiros países da União Europeia com maior esperança de vida, mas “está também nos três primeiros com pior qualidade de vida após os 65 anos”, sustentando que “a culpa não é das ERPI, a nossa organização da Saúde e Ação Social é que não é suficiente”.
Considerando uma “separação patogénica” da Saúde e da Ação Social em termos ministeriais, o que gerou o que apelidou de “irmãs desavindas”, António Leuschner sublinhou que “a falta de articulação entre as irmãs desavindas leva ao desperdício” e deixou um alertou: “É vital para a melhoria da vida das pessoas mais velhas que a Saúde e a Ação Social trabalhem de forma articulada. Os cuidados às pessoas têm de ser continuados, integrados e articulados entre a Saúde e a Ação Social. Todas as respostas devem ser integradas e deve haver partilha de informação médica sobre as pessoas entre todas as entidades envolvidas. Isto não é só dinheiro, mas organização. Temos que garantir que o sistema sobrevive, articulando o público, o privado e o social, sectores que devem ser complementares e não sobrepostos, como muitas vezes acontece”.
Estava dado o mote sobre o que existe e o que deve ser feito. E as ideias lançadas pelo médico psiquiatra foram demonstradas pelas representantes das IPSS que, no painel que fechou a manhã do seminário, relataram as diferentes experiências das suas instituições no acolhimento.
Sob o título «Que cuidados? Da prevenção à integração e continuidade de cuidados», Gabriela Nunes, da ADCL – Associação para o Desenvolvimento das Comunidades Locais, Paula Aguiar e Marisa Teixeira, da Fundação Nuno Silveira, Sara Sousa, do Centro Social Vale do Homem, e Célia Pereira, da ASFE – Associação de Socorros da Freguesia da Encarnação, deram conta das boas práticas no acolhimento de crianças e jovens, de pessoas mais velhas e de pessoas com deficiência e, com a moderação de Filomena Bordalo, assessora da CNIS, colocaram também em evidência alguns dos constrangimentos que sentem por falta de resposta da área da Saúde.
E este exercício prosseguiu, da parte da tarde, com a mesa-redonda «A complementaridade de cuidados nas respostas sociais de acolhimento – sucessos, dificuldades e perspetivas», agora já com a presença de alguns dos responsáveis por duas das entidades estatais envolvidas na temática, no caso Fernando Araújo, diretor-executivo do Serviço Nacional da Saúde (SNS), e Catarina Marcelino, vice-presidente do Instituto da Segurança Social (ISS).
Com moderação de Fernanda Rodrigues, assistente social, investigadora e professora universitária, completaram a mesa-redonda Manuel Antunes, da Cáritas Diocesana de Coimbra, João Calão, da ACASO – Associação Cultural e de Apoio Social de Olhão, Maria da Luz Silva, da Associação A Casa do Caminho, Deolinda Miranda, da APPACDM de Portalegre, Mariana Costa, do Centro Social Paroquial Nª Sª das Virtudes de Ventosa, que deram conta da(s) realidade(s) das suas instituições e aproveitaram a presença dos representantes do Estado para colocarem questões a debate de grande pertinência para as IPSS, pois são obstáculos que diariamente têm de contornar.
O diretor-executivo do SNS começou por desejar que “esta partilha traga uma nova forma de estar”, sublinhando que “o envelhecimento é o melhor que pode acontecer a todos, mas com saúde e autonomia e de preferência em casa”.
E, logo de seguida, Fernando Araújo recuperou o tema das altas sociais. “Temos que encontrar soluções para estas pessoas na comunidade e, nesse sentido, temos trabalhado como o Sector Social”, afirmou, lamentando: “Este é um problema que nos aflige, mas estamos a ser ultrapassados pela realidade”.
Já na sessão de abertura, Maria João Quintela, da Direção da CNIS, a propósito da questão das altas sociais, disse: “Não queremos ser um sector que resolve problemas de outro sector. Nós fazemos parte do SNS”.
Por seu turno, a vice-presidente do ISS, depois de afirmar que “o acolhimento são muitas respostas com desafios diferentes” e ter uma palavra para cada uma delas, sustentou que “há um desafio grande de financiamento e de articulação entre as áreas da Ação Social e da Saúde e a relação da Segurança Social com as IPSS tem de ser menos burocrática e mais relacional”.
A este propósito, Catarina Marcelino defendeu que “a Segurança Social tem de ir às instituições não para desconfiar, mas para confiar e ajudar na melhoria dos serviços”, acrescentando: “Temos de apostar mais na humanização e na colaboração e numa perspetiva positiva de resolver problemas e encontrar soluções”.
Já na fase de debate, Manuel Antunes começou por dizer, em jeito de crítica ao que tinha acabado de ouvir: “O que disseram é música para os meus ouvidos!”.
Em jeito de resposta às intervenções emandas da plateia, a vice-presidente do ISS afirmou: “A máquina da Segurança Social é muito grande, são mais de 8.600 funcionários… Assumo a responsabilidade das falhas, mas mudar mentalidades é difícil. No entanto, estamos a colaborar com as instituições para alterar a situação”.
No fundo, é a resistência daqueles que um dia o padre Lino Maia apelidou de “zelotes da Segurança Social”.
No encerramento do seminário, o padre Lino Maia enfatizou duas ideias lançadas da plateia, em que a CNIS foi recebeu o cognome de “Confederação dos Afetos” e em que sobre o seminário foi dito que “não era um muro de lamentações”.
“Podia ser uma oportunidade para lamentações, mas não foi, afirmou o presidente da CNIS, lembrando, de seguida, que, ao longo do dia, “foram apresentadas experiências muito felizes que podiam ter sido as de outras instituições, porque no universo das IPSS faz-se muita coisa muito boa”, e relevando a ideia que perpassou por toda a jornada de trabalho em Coimbra de que “deve haver mais complementaridade entre a Saúde e a Ação Social”.
“Vamos continuar a abater os muros que ainda vão existindo e estamos disponíveis para criar pontes entre a Saúde e a Ação Social, criando uma maior complementaridade. Nesse sentido, o Sector Social Solidário compromete-se a dar as mãos para a complementaridade e na reorganização de alguns serviços”.
Por seu turno, Horácia Pedrosa, presidente da Mesa Assembleia Geral da UIPSS Coimbra, destacou que o seminário “não foi um muro de lamentações, mas foram aqui constatadas situações que é necessário dar resposta”.
A fechar, Ricardo Mestre, secretário de Estado da Saúde, relevou a importância do tema em discussão, especialmente, “porque estamos num momento de renovação que passa por reforçar a relação com a Ação Social”.
“A sociedade exige uma organização diferente do passado, porque hoje é mais centrada na pessoa e para essa mudança contamos com os parceiros, em que se inclui a CNIS”, sustentou o governante, revelando os quatro pontos em que assentará a “nova rede de cuidados a criar”: “Mais focada no domicílio; completar as vagas de internamento; aproximar as respostas entre si; e melhorar o funcionamento da rede, que passará por mais financiamento”.
A jornada de trabalho, arrancou com o anfitrião Álvaro Garrido, diretor da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, a dar as boas-vindas a todos os presentes, e ainda Gil Tavares, presidente da UIPSS Coimbra, que lembrou “as adversidades que as instituições estão a viver”, aproveitando a ocasião para assinalar a passagem do 20º aniversário da união distrital que lidera.
Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)
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