A Volta a Portugal da Solidariedade subiu no mapa e foi a Trás-os-Montes conhecer um pouco mais a realidade das instituições no distrito de Vila Real, onde há 93 IPSS, sendo 73 associadas da UDIPSS local. Apesar das dificuldades, as instituições do distrito vão assegurando alguma sustentabilidade financeira, segundo afirma Manuel Borges Machado, presidente da UDIPSS Vila Real. Decorrem no distrito algumas construções de equipamentos, mas, essencialmente, na área da deficiência, as carências persistem. Relativamente aos lares de idosos, o dirigente teme que, dentro de alguns anos, acontece às ERPI o que aconteceu às escolas primárias espalhadas pelo território, devido à falta de pessoas para acolher.
SOLIDARIEDADE - Que retrato é possível traçar das IPSS no distrito?
MANUEL BORGES MACHADO – No presente momento, há falta de equipamentos na área da deficiência, apesar de estarem a ser construídos quatro lares residenciais, em Montalegre, Chaves e dois no Peso da Régua. Isto vem de alguma forma colmatar as grandes lacunas que existem nesta área, mas não chega. Também estão a ser construídos dois CACI, em Poiares e em Vila Pouca de Aguiar. Mesmo assim continuamos com graves lacunas na área da deficiência e isso devia ser alvo da atenção do Estado. A nível da infância, temos falta de creches. Embora estejamos numa zona de interior, onde a população é mais idosa, se queremos recuperar população temos de dar condições às pessoas para aqui estarem, isto é, habitação e condições para que as crianças se possam desenvolver. Neste momento, temos dificuldade em ter vagas em creche para todas as crianças.
Essa realidade já existia ou é algo que surgiu com a creche gratuita?
A creche gratuita, que foi uma das boas medidas que o Estado tomou, veio de alguma forma libertar as mães e os avós, porque este é um território essencialmente rural e, assim, eles podendo deixá-los na creche tanto melhor. A creche gratuita veio seguramente aumentar a procura de creches.
E na área da terceira idade, qual a situação?
Nos idosos, há alguns lares em construção, mas devo dizer que não gostava de ver acontecer aos lares o que aconteceu com as escolas primárias. Agora existe uma carência, mas a médio prazo haverá, seguramente, um excesso de lares para a população necessitada. Porque não vai haver pessoas para acolher. Por outro lado, temos falta de trabalhadores, porque há uma geração que está a deixar o mercado de trabalho e irá precisar de lares, mas é uma geração pequena. Grande parte dessas pessoas emigrou e, se emigrou, não está cá. Ou conseguimos fazer regressar os nossos emigrantes e lhes damos boas condições para eles virem, ou não vamos ter pessoas para os lares. Mesmo assim a procura não é tão grande como a que gostaríamos… O sector privado está a crescer muito significativamente, estão a ser construídos alguns lares privados, com valores muito elevados de mensalidade, e na zona rural faltam-nos equipamentos para as pessoas humildes. Os lares das instituições não são para os ricos, ou seja, só para quem pode pagar. Não, são para as pessoas que precisam e não podem pagar um privado, mas são necessários acordos de cooperação! A nível das respostas sociais, o PRR, juntamente com o PARES, veio dar um incentivo para aumentar as capacidades, mas ainda não é suficiente. Mas também, Roma e Pavia não se fizeram num dia! Por exemplo, em Valpaços há seguramente mil vagas em ERPI e outros casos mais. Nos próximos cinco anos, penso, teremos o distrito totalmente coberto, mas depois tenderá a diminuir a procura.
E qual a situação das instituições?
Na minha ótica, o problema das instituições do distrito é a dimensão. Se não conseguirmos economia de escala, temos muita dificuldade em garantir a sustentabilidade. Há muitas instituições com um conjunto de utentes dispersos por diferentes aldeias. Por exemplo, o SAD é um serviço que fica muito caro. Por alguma razão está prevista no Compromisso de Cooperação uma discriminação positiva para os territórios de baixa densidade. No entanto, não estamos numa situação crítica. Há casos difíceis, duas ou três já fecharam portas, porque os acordos de cooperação são na ordem dos 15, 18, 20 utentes, o que, por exemplo, no SAD não assegura a sustentabilidade da resposta. Temos, depois, alguns lares pequenos, 14, 18, 20 utentes, o que também não contribui para a sustentabilidade. Têm de crescer, mas isto foi criado pelas próprias comunidades, que investiram nisso. Agora têm estes obstáculos. Estão a surgir novas dinâmicas e são necessárias mais pessoas para trabalhar, para além de que os utentes também chegam mais dependentes. No entanto, as instituições do distrito não estão muito mal em termos de sustentabilidade. Nos dois últimos compromissos houve um aumento da comparticipação dos Estado para alcançar os 50% e esse caminho deve continuar a fazer-se, seja qual for o governo. Por outro lado, da parte dos municípios há uma maior sensibilidade para ajudar este sector.
E qual a grande dificuldade das instituições do distrito para conseguirem cumprir a missão?
Começa a ser uma grande dificuldade recrutar recursos humanos. Este é o ponto chave: não há recursos humanos. Uma auxiliar necessita, primeiro, de formação e não se lhe pode pagar o ordenado mínimo. Já temos falta de mão de obra, se pagamos pouco, estamos condenados. O Sector Social Solidário tem de pagar melhor aos funcionários. Não sei como, não sei onde poderemos ir buscar essa verba, mas temos de pagar mais. Fala-se na redução da TSU, mas não vejo que seja por aí. Devia era haver um complemento na comparticipação do Estado, porque com o aumento do salário mínimo houve uma série de categorias profissionais que foram esmagadas e isso não cria incentivo a ninguém para trabalhar no sector. Já não temos a mão de obra que necessitamos, mas sim a que aparece. E isto causa constrangimentos, porque estamos a dar-lhes formação e um contrato e eles desaparecem de seguida. O grande problema não está nos técnicos, mas sim nas auxiliares de ação direta.
Como é a relação com as associadas e quais as solicitações que elas mais dirigem à União?
O que a União necessita mesmo é de apoio jurídico a sério. Os nossos recursos financeiros vêm das associadas, pelas quotas, mas não chega para termos esse apoio jurídico que necessitamos. Há sempre muita legislação a sair e os dirigentes nem sempre conseguem interpretá-la devidamente. O apoio jurídico é uma necessidade, mas também precisamos de mais formação na área dos diretores técnicos e dos dirigentes. Já houve, mas os dois cursos que se realizaram é muito pouco. Depois, temos uma classe de dirigentes que não é a mais nova, não é a que tem mais conhecimentos de informática e hoje está quase tudo informatizado. Recentemente, foi criada a figura do gestor da qualidade, mas pergunto: uma IPSS com acordo de cooperação para 20 ou 30 utentes vai contratar uma pessoa para o cargo? Claro que não, vai ser uma mesma pessoa a acumular tudo! Considero que o gestor da qualidade já devia ter sido criado há muito tempo, mas tem de ter autonomia. Não pode apenas olhar para a qualidade do utente, também tem de olhar para a da instituição e a sua sustentabilidade. Senão estamos mal, é só pedir, pedir e do lado da instituição deixa de haver capacidade.
E como é a relação da UDIPSS Vila Real com a CNIS?
É uma relação a 100%, digo sempre o que penso, ouvem-me, pertenço ao Conselho Geral. No ano passado começaram com uma reunião por região, mas pararam e não deviam parar. Acho que a CNIS devia falar mais vezes connosco, marcar formação para as Uniões, mesmo que sejamos nós a comparticipar. E é necessário virem cá mais vezes. No mínimo, duas vezes por ano a CNIS devia dar formação aos diretores técnicos e aos dirigentes ou, simplesmente, virem cá para falarmos. Hoje em dia, as instituições precisam de partilhar as experiências para melhor funcionarem neste contexto. Percebo que temos as reuniões centralizadas em Fátima e percebe-se, porque ali consegue-se agregar todo o território mais facilmente. Porém, devia haver mais reuniões descentralizadas. Todos nós gostamos de ver e ouvir o padre Lino Maia e ele, pelo menos, uma vez por ano devia vir ao distrito. Nós precisamos de transpirar o que nos vai na alma. No distrito, precisamos de falar mais com o padre Lino Maia e um encontro, para além das assembleias gerais, era muito importante, porque é ele que nos representa.
Referiu há pouco que há uma série de equipamentos a serem construídos, mas, à semelhança de outros distritos, em Vila Real também houve instituições a desistir de projetos aprovados no âmbito do PRR devido à inflação dos custos de obra?
Notou-se mais na Mobilidade Verde Social. Até surgiu agora um novo Aviso, porque parece-me que houve poucas candidaturas. Este programa dava 25 mil euros, mas a instituição tinha de gastar outros 15 mil euros. Depois, apenas uma viatura elétrica quando a instituição tem uma frota de 10, não é nada! Deveriam fazer uma avaliação mais exata, saber quantas viaturas cada instituição tem e fazer um rácio, para ter no mínimo uma frota. Para além disto, o valor devia subir, na ordem a que a IPSS pagasse apenas 10 ou 5 por cento. As instituições estão paupérrimas, com um pouco mais de 15 mil euros compram um carro que não seja elétrico. E ainda há a questão do tempo de vida das baterias… Já a nível de construções, algumas instituições estão atrasadas e ponderam desistir. Houve uma bonificação, mas há instituições que pensam desistir.
Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)
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