HENRIQUE RODRIGUES

“AS NAÇÕES TODAS SÃO MISTÉRIOS/CADA UMA É TODO O MUNDO A SÓS” (Fernando Pessoa, Mensagem)

“AS NAÇÕES TODAS SÃO MISTÉRIOS/CADA UMA É TODO O MUNDO A SÓS”

(Fernando Pessoa, Mensagem)

 

1 - Leio no Público de Domingo, 7 de Abril, que “Dezenas de milhares de pessoas protestaram (na véspera) contra o Governo de Viktor Orbán no centro de Budapeste, … alguns deles gritando “não temos medo” e “Orbán demita-se”. Muitos vestiam as cores nacionais, vermelho, branco e verde, ou exibiam a bandeira nacional, símbolos que o partido ultraconservador de Orban (Fidesz) tomou como seus nas últimas décadas.” ”Estas são as cores nacionais da Hungria, não são do Governo  …”

Também na Hungria, Governo e Oposição elegeram como terreiro de luta partidária a utilização dos símbolos de identidade da Pátria, designadamente as cores nacionais e a composição da bandeira, e a apropriação desses símbolos no espaço simbólico da afirmação identitária pelo partido do poder e da implícita confusão entre a Pátria e o Governo de turno.

Como não lembrar, ao ler essa peça do Jornal, o que se tem passado entre nós com o logótipo da República Portuguesa, alterado no ano passado pelo Governo do PS e restaurado agora na sua versão anterior pelo Governo da AD – que pretendeu reforçar o impacto simbólico da restauração ao elevar a revogação desse logótipo a primeira medida do novo Governo, na sequência, aliás, de compromisso eleitoral da AD.

O assunto tem sido obejcto de acalorado debate nas redes sociais, na imprensa escrita e nas televisões.

Trago aqui o exemplo da Hungria apenas para tentar reduzir a dimensão do nosso dissídio, mostrando que não somos originais, nem na alteração, nem na revogação dessa alteração, mas que fazemos o mesmo que os outros Governos, dos outros países, também eles convencidos de que o mundo começou quando tomaram posse e que todas as medidas por si tomadas têm carácter inaugural e lustral.

“Estas são as cores nacionais …, não são do Governo” – como se proclamou na Hungria.

Mas não há dúvida de que o artº 11º da Constituição estipula, no seu nº 1, que “A Bandeira Nacional, símbolo da soberania da República, da independência, unidade e integridade de Portugal, é a adotada pela República instaurada pela Revolução de 5 de Outubro de 1910.”

E, nessa perspectiva, não restam igualmente dúvidas de que o logótipo da versão anterior a 2024 é mais identificável com a bandeira a que se refere a Constituição, a instaurada pela Revolução que instituiu a República, do que o introduzido pelo Governo do PS em 2023.

Claro que se tem dito que se não trata, o logótipo desenhado por Eduardo Aires, de uma reprodução da bandeira nacional, não pretendendo usurpar nenhum símbolo de Portugal, designadamente a sua identidade.

Mas, no contexto do debate que tem acompanhado as vicissitudes do logótipo, tenho visto, por parte dos defensores da versão agora revogada, que essa versão, constituída por dois rectângulos, um verde e outro vermelho, ladeando um círculo amarelo, é mais inclusiva – no sentido da tutela dos direitos das minorias.

Fosse esse o caso, e fosse o novo logótipo capaz de induzir a protecção efectiva de tais direitos, e teria a minha concordância.

Mas sou franco; será défice meu, por regra pouco sensível às manifestações artísticas que colhem hoje em dia os favores da crítica especializada, que descobre obras-primas a um ritmo que ninguém consegue acompanhar - mas, ao olhar para a composição do logótipo revogado, não sinto a emoção, o frémito, que normalmente acompanha a contemplação ou a fruição de uma qualquer obra de arte.

Nem nele vislumbro qualquer sinal que remeta para as políticas de inclusão que alegadamente lhe são atribuídas como fundamento.

Trata-se de uma obra aberta, onde cada qual pode encontrar o que lhe aprouver.

 

2 – A Constituição da República de 1976 foi elaborada e aprovada na sequência e como efeito da revolução do 25 de Abril, constituindo a base da organização política do nosso País.

É a Constituição da Liberdade, que representa com fidelidade os valores de Abril e que marca a ruptura com o fascismo, que nos tolheu durante 48 anos de ditadura.

Como vimos, e não obstante não poder ser mais abissal a distância entre o Antigo Regime e aquele sob o qual felizmente vivemos, a Constituição de 1976 manteve a composição da bandeira, que fora aprovada na sequência da implantação da República.

Isto é, os Constituintes entenderam que, não obstante a ruptura com o passado próximo, os elementos da bandeira remetiam para valores que sobrelevavam a conjuntura, mesmo que esta mudasse, como mudou, e apelavam a valores perenes da Pátria e à sua História  de mais de oito séculos.

Dir-se-á que o logótipo não é a bandeira; mas, na realidade, pretendeu ser uma variação dela, uma versão aggiornata dos seus elementos; ou, como explicava o site do anterior Governo, a bandeira nacional seria o elemento matricial do logótipo.

Por outro lado, não vislumbro que haja divergência de fundo entre PSD e PS quanto aos valores que são imputados ao logótipo.

Nem penso que o PS entenda que a revogação do logótipo anterior pela AD queira dizer que o novo Governo não tem como essencial no seu programa políticas inclusivas.

Encontramo-nos em pleno mês de Abril, em que se festejam os 50 anos de liberdade que nos foi restituída em 1974.

Quer PS, quer PSD, constituíram a base de entendimento para a elaboração, em 1975/1976, em contexto complexo, da Constituição que nos rege.

Quer PS, quer PSD, têm entendimento semelhante quanto aos valores identitários da portugalidade.

Aliás, coube a ambos, cada qual em seus tempos, assegurar o Governo do País pelos XXIV Governos Constitucionais que nos regeram até ao presente – com respeito por tais valores.

E também ninguém duvida da sua obrigação, e da sua vontade, de defender a Constituição e as liberdades.

O tempo é mais para relevar o que é comum aos dois partidos – que é muito mais do que os separa.

E muito mais urgente!

 

Henrique Rodrigues – Presidente do Centro Social de Ermesinde

 

Data de introdução: 2024-04-11



















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