INTERVENÇÃO DO PRESIDENTE DA DIRECÇÃO DA UIPSS/MADEIRA

É preciso estar atento à condição humana

Depois da alteração estatutária levada a efeito na União das IPSS’s e após a constituição legal da União das Instituições Particulares de Solidariedade Social da Madeira, reunimo-nos pela primeira vez em Congresso.
Este encontro de reflexão insere-se num contexto social e cultural peculiar.
Neste mundo e no contexto universal, nacional e regional, intercruzam-se simultaneamente factores de fundada esperança e de alguma manifesta apreensão quanto ao nosso futuro. 

Observamos um mundo marcado por uma economia vista pelo prisma da dimensão lucrativa, em que os recursos financeiros são muitas vezes desigual e injustamente distribuídos, verificando-se cada vez mais a concentração da riqueza nas mãos de uma menor número de pessoas;
Verificamos igualmente uma sociedade marcada pelo individualismo, pelo imediatismo, e, porventura, pela falta de uma verdadeira cidadania activa e participativa;
num tempo que se faz a experiência da diminuição ou mesmo do esgotamento de recursos a todos os níveis; 

É neste tempo, nesta sociedade, neste mundo e nesta terra, que é urgente descobrir, redescobrir e reinventar o sentido da partilha desinteressada dos bens e dos saberes, das experiências positivas e das boas práticas que se concretizam no dia a dia. Importa e urge igualmente, tendo em conta a realidade com que nos deparámos quotidianamente, lançar um olhar prospectivo e arrepiar caminho, encontrando respostas inovadoras para problemáticas sempre novas.
Pretendemos com esta magna reunião reflectir, cruzando saberes e experiências, sobre o papel, a natureza e o ser das IPSS’s na sociedade contemporânea, no âmbito regional e nacional. Fazêmo-Io de forma criticamente responsável e assumidamente propositiva.
Partindo de algumas premissas, que expressam convicções, colocarei com simplicidade, porventura sem o sentido da diplomacia, algumas interrogações e inquietações que se fazem no nosso espírito.

1.º - As IPSS, nascidas da convergência de vontades que se institucionalizaram em virtude da consciência de valores de sociabilidade, de solidariedade e do bem comum, contribuíram decisivamente para a consolidação de um novo tipo de sociedade, mais justa e mais humana; no fundo, foram arautos e promotores de um autêntico e genuíno sentido da solidariedade e da promoção do bem de todas as pessoas. 

As Instituições Particulares de Solidariedade Social, como expressões organizadas da sociedade civil, tentam na medida dos seus recursos humanos, técnicos e financeiros dar respostas às questões de índole social e humana de modo a que esse bem-estar também chamada qualidade de vida, seja extensível a todos os cidadãos, de maneira especial àqueles que mais necessitam, como sejam as crianças, os jovens em situação de delinquência, as famílias desagregadas, os doentes, os idosos, os sós e todo os novos pobres que a nossa sociedade vai gerando;
Será que as nossas instituições aqui na Madeira, têm estado atentas às novas questões e problemáticas que se levantam no meio onde estão inseridas? 

2.° - Para desempenhar o seu papel de promoção social e solidariedade efectiva e organizada, as instituições deverão estar munidas dos meios humanos, técnicos e financeiros necessários. Sabemos que estas organizações são ricas de ideais, mas, na maior parte dos casos, pobres de recursos. Na sua relação com o Estado, as IPSS’s assentam a sua actuação sobre o binómio autonomia/cooperação. Autonomia porque estas instituições são particulares e não públicas, assumindo autonomamente a sua gestão, funcionamento e sobretudo as suas grandes linhas de actuação e projectos de intervenção; com o Estado ou entidades governamentais cooperam e colaboram na tentativa de encontrar respostas válidas e eficazes para os problemas sociais por um lado e, por outro, no desenvolvimento da pessoa e na promoção do bem comum.
Será que tem havido um correcto, franco e respeitador relacionamento entre o sector privado e o sector público? 

Será que se tem velado para que haja uma sã cooperação e uma justa autonomia de cada uma das partes? Será que às IPSS’s são dados todos os recursos para que elas desenvolvam a sua acção?

3.° - Na sua filosofia de actuação, as IPSS’s orientam-se por princípios personalistas e humanitários, isto é, entende-se a pessoa humana na sua dimensão relacional e individual e o desenvolvimento humano como necessariamente global e total.
A doutrina social da igreja na sua rica e dinâmica tradição e na sua atenção aos sinais dos tempos é inspiradora da orientação de muitas das nossas instituições. Estamos convictos, à luz da ética social e da doutrina social da igreja que, para que o desenvolvimento e o crescimento humano sejam consolidados, deve-se atender a todos os homens e ao homem todo. 

Será que as nossas instituições estão permanentemente abertas a pensar e a agir de forma a participar num desenvolvimento integral e total das pessoas concretas que as frequentam e de todas as pessoas das comunidades onde estamos inseridos, com atenção especial e preferencial pelos mais desfavorecidos? Será que todas as IPSS’s serão capazes de dar atenção às situações de miséria que existem e às novas pobrezas que surgem nesta sociedade contemporânea?

4.° - Estas instituições não são corporativas, mas interclassistas, abertas a todas as classes e níveis sócioprofissionais, a todos os estratos socio-económicos.
Não será gue assistimos ao surgimento de IPSS’s, com uma matriz e natureza pouco solidária e pouco aberta às situações diversificadas? Queremos IPSS’s com matriz corporativa e classista?

5.° - As IPSS’s, conforme o Decreto-Lei n.º 119/83, são instituições sem fins lucrativos, com o propósito de dar expressão organizada ao imperativo de solidariedade.
Não haverá instituições com o nome e com o titulo jurídico de Instituições Particulares de Solidariedade Social, se calhar com muito de particular, visando às vezes ou apenas duvidosas engenhariasfinanceiras e fiscais?

Minhas senhoras e meus senhores,
É um desafio permanente e uma inquietação constante o estar atento à condição humana e aos sinais dos tempos neste momento da história, no sentido de construirmos uma sociedade cada vez mais humanizada e uma civilização que se possa reger por princípios de solidariedade e de justiça social, onde a pessoa humana seja o centro giratório da construção social. É a este desafio, é a esta inquietação, é a esta finalidade que as Instituições Particulares de Solidariedade Social, enquanto expressões organizadas da comunidade, tentam dar uma resposta.
Vamos ao longo destes dois dias olhar para aquilo que já fazemos e para as diversas intervenções que realizamos concreta e quotidianamente. Teremos uma atitude crítica a respeito daquilo que já realizamos. Saberemos, concerteza, aproveitar o que de bom existe em muitíssimas e maravilhosas acções e iniciativas no terreno.
Contudo, seria interessante, mais, será absolutamente necessário, desenvolver uma atitude prospectiva a fim de aperfeiçoarmos as nossas intervenções e as nossas práticas sociais. Estaremos à escuta das novas realidades e dos sinais que nos apresenta a sociedade contemporânea e o meio onde vivemos para que possamos responder com criativos e renovados projectos.

Caros amigos e amigas, vós que viestes de todas as partes da nossa terra e algumas pessoas do continente português uma vez mais bem-vindas e hem-vindos, e votos que os trabalhos destes dois dias sejam do vosso agrado. Estamos convictos que poderemos tirar frutos abundantes para cada um de nós, para as comunidades e as pessoas concretas a que nos dedicamos.

 

Data de introdução: 2005-11-20



















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