PAULA PIMENTEL, PRESIDENTE DA UNIÃO DAS IPSS DO DISTRITO DE BRAGANÇA

A sustentabilidade das instituições está ameaçada pela escassez de recursos

Bragança é um distrito vasto, composto por 12 concelhos, nos quais existem cerca de uma centena de IPSS, sendo que 83 são associadas da União das IPSS do Distrito de Bragança (UIPSSDB).
Paula Pimentel, que preside à estrutura distrital desde 2015, cumprindo atualmente o seu terceiro mandato, considera que “a sustentabilidade das instituições está ameaçada” e que “as instituições fazem milagres todos os dias”.
Num distrito desertificado e envelhecido, o recrutamento de mão de obra é, como diz o povo, «um bico de obra», porque há poucos candidatos e os que há não têm formação e, muitas das vezes, a sensibilidade necessária para trabalharem num sector como é a solidariedade social.
Por outro lado, a União Distrital tem, desde a pandemia, intensificado os contactos com as IPSS associadas, fruto da herança da pandemia que são as reuniões através das plataformas digitais.
“Geralmente, reunimos duas vezes por mês via online e temos instituições de todos os concelhos. E estes encontros são já uma necessidade por parte das instituições”, revela Paula Pimentel, nesta conversa com o SOLIDARIEDADE.
A Volta a Portugal da Solidariedade chega esta edição a Bragança, distrito que, entre 23 e 27 de setembro recebe a XVII Festa e Chama da Solidariedade [ver páginas centrais], uma organização da CNIS, que conta com a colaboração da UIPSSDB.

SOLIDARIEDADE - Que retrato se pode traçar das IPSS do distrito de Bragança?
PAULA PIMENTEL - As instituições tentam fazer milagres no dia a dia, porque os recursos são cada vez mais escassos. A sustentabilidade está ameaçada, mas nem por isso as instituições deixam de tentar fazer o melhor, quer em meio urbano, quer em meio rural. O Sector Social Solidário está a passar por uma fase muito difícil, porque as exigências são enormes e diferentes e cada vez mais há dificuldade em recrutar recursos humanos, o que em meio rural começa a ser mesmo ameaçador. Começamos a pôr em causa a manutenção dos serviços! Depois, é um sector que exige muito esforço físico e mental, o que se traduz em muitas baixas médicas entre o pessoal. Em alguns meios é difícil substituir estas baixas e quem está tem de estar a 100% sempre. Em termos de retrato, o que posso dizer é que começa a ficar difícil fazer face às necessidades da população com as condições que temos.

E qual é a realidade das IPSS do distrito, em termos de dimensão, sabendo-se que esta está intimamente ligada à sustentabilidade?
Independentemente do número de utentes ou de respostas sociais que cada instituição tenha, as exigências acabam por ser as mesmas. E uma instituição de menor dimensão acaba por ter de responder às exigências todas tal qual outra com outra capacidade. Temos instituições em meio rural que funcionam 24 horas por dia, o que implica gastar muita energia no inverno, as deslocações dos próprios fornecedores acabam por encarecer os preços dos produtos... Penso que dirigentes e trabalhadores acabam por fazer milagres todos os dias. E o suporte que estas instituições têm são o voluntariado, não só dos dirigentes, como da própria comunidade que ajuda bastante, sobretudo a nível alimentar. Tenho, inclusive, conhecimento de uma instituição que está a pensar fechar portas. É uma instituição que está em meio rural, com as valências de Serviço de Apoio Domiciliário e Centro de Dia, duas respostas que não são minimamente sustentáveis, e que viu a sua sustentabilidade ameaçada de há uns tempos a esta parte. Depois, alguém dizia que as exigências da Segurança Social em termos de rácios de pessoal são muito grandes, e são, mas atendendo à realidade da população que temos de apoiar e acolher, se calhar não são suficientes. Aliás, nós temos de ter mais do que aquilo que nos é exigido neste momento para podermos prestar um serviço condigno. A maior parte das nossas instituições funcionam 24 horas por dia, 365 dias por ano, o que implica que haja o pagamento do salário, mas também todos os subsídios associados e isto é muito difícil de conseguir.

E qual a grande lacuna em termos de respostas sociais no distrito?
Sinceramente, não tenho dados para poder dizer, mas continuo a achar que a nível de acolhimento, de Estruturas Residenciais Para Idosos, continua a haver muita dificuldade em encontrar vagas. Não só de idosos, mas de pessoas que necessitam de apoio 24 horas por dia. Não é uma grande dificuldade, mas continua a ser uma dificuldade.

E quais os grandes obstáculos que as IPSS do distrito enfrentam para melhor cumprirem a sua missão, sendo que já falou no recrutamento de pessoal?
Para além das comparticipações da Segurança Social, apesar de ter vindo a ser feito um esforço grande para serem aumentadas, ainda não é suficiente, tendo em conta o aumento do salário mínimo, mais do que justo. Por outro lado, a falta de mão de obra e o tempo que as instituições gastam em termos de formação. Para além de haver falta de candidatos, há falta de candidatos com formação. Por mais que estejamos todos articulados com as escolas, o nosso sector ainda é pouco atrativo e, muitas vezes, só é reconhecido por quem precisa. Por isso, acabamos por ter de investir muito para formar profissionais para trabalhar na nossa área. Temos tantas funções e tantas exigências que, no dia a dia, é difícil. E este é outro obstáculo, dar resposta às exigências legais e, por outro lado, dar o devido acompanhamento às pessoas que nos procuram.

Como é a relação com as IPSS associadas e quais as solicitações mais frequentes?
A relação é boa e tem aumentado de ano para ano. As instituições sentem apoio e confiança na União. No dia a dia, temos muitos pedidos de apoio e, a maior parte, tem que ver com questões de índole jurídica, questões de direito laboral, sobre recursos humanos. Todos somos conhecedores de tudo, mas as especificidades requerem outro olhar e atenção e grande parte das instituições comungam do mesmo problema: dificuldades na gestão dos recursos humanos. A União tem um serviço de assessoria jurídica que promove muita formação na área do direito laboral, mas, no dia a dia, continuam a persistir dúvidas dessa natureza.

A componente da formação é aposta da União?
Sim, a União tem tido essa preocupação. E desde que ganhámos uma nova competência ainda mais. Durante a pandemia, a União reuniu diariamente com a Proteção Civil, forças de segurança, Saúde e demais entidades e, com isto, criou-se uma maior proximidade e uma maior necessidade de integrar a União nas várias iniciativas. Por isso, a União já tem muito investimento em termos de representação daquilo que é o sector em outras áreas. A União já tem bastante visibilidade e é frequentemente chamada para diversas iniciativas. Com a pandemia acabámos por nos organizar até melhor, porque estamos juntos mais vezes e em maior número com a herança que herdámos da pandemia, ou seja, as reuniões através das plataformas digitais. Acabamos por estar sempre em grande número. Isto é bom, porque estamos num distrito grande, são 12 concelhos, distribuídos geograficamente de tal forma que exige percorrer muitos quilómetros para nos juntarmos. Esta parte foi a parte positiva da pandemia. Geralmente, reunimos duas vezes por mês via online e temos instituições de todos os concelhos. E estes encontros são já uma necessidade por parte das instituições. Isto é também uma mais-valia, tendo em conta as características do nosso distrito.

E como é a relação com a CNIS?
Sempre houve uma relação próxima e a União procura, sempre que necessário, o apoio técnico da CNIS. Tem sido uma relação de colaboração e de proximidade.

Como pensa que a CNIS podia estar mais próxima das Uniões e das IPSS?
Sempre que fizemos algum pedido, a CNIS nunca recusou e sempre a sentimos próxima e presente. Agora, há muito mais a fazer, mas compreendo que, atendendo às exigências do dia a dia e atendendo a que na União não temos recursos humanos e tentamos dar o nosso melhor, na CNIS também será assim. O ideal era termos a CNIS mais presente no nosso dia a dia, mas acaba por estar presente quando a União não tem capacidade de resposta.

E o PRR chegou às IPSS de Bragança?
Não tanto como gostaríamos, e não foi por falta de candidaturas. As recusas, em alguns casos, foi por falta de enquadramento e, noutros, por exigências burocráticas ou dificuldade no cumprimento de prazos. Depois, a nível de candidaturas, e falando não apenas do PRR, o que as instituições sentem é que as exigências são muito grandes e o processo de elaboração de uma candidatura é muito exigente. E nem sempre as instituições têm pessoas capazes de elaborar essas candidaturas. Por outro lado, recorrendo a alguém externo, há que assumir o pagamento, que geralmente é um serviço caro.

No entanto, das candidaturas aprovadas, que balanço se pode fazer, pois em alguns distritos houve IPSS a desistir devido ao escalar dos preços ou os concursos ficaram desertos?
Sim, também temos essa dificuldade em encontrar empresas que possam responder. No entanto, conheço três grandes projetos que estão em fase de construção.

Como é presidir a uma União que não tem sede, nem recursos humanos?
É um grande desafio. Bem, sede tem, neste momento, é a Fundação Betânia. Desde 2015, com a alteração dos estatutos, a sede da União é a instituição a que está associado o presidente. Isto porque temos as nossas responsabilidades e termos que nos deslocar para outro espaço, não era muito prático. Isto também porque a Fundação Betânia também se disponibilizou. E sempre que é necessário recorrer a recursos humanos, a Fundação disponibiliza. Vejo esta situação como um desafio permanente e a grande dificuldade que sinto é não poder dar uma resposta imediata, porque é quase impossível. Ainda assim, temos conseguido sempre responder às solicitações que nos chegam.

Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)

 

Data de introdução: 2024-09-13



















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