MINISTRA DA EDUCAÇÃO EM ENTREVISTA

É preciso recentrar a relação com as IPSS

Tal como tínhamos prometido, o Solidariedade colocou algumas questões, relacionadas com as alterações da valência de ATL, à Ministra da Educação. Maria de Lurdes Rodrigues aceitou responder por escrito a um questionário enviado.
A entrada em vigor do despacho n.º 16 795/2005, que vem alterar o horário de funcionamento das escolas do 1.º ciclo do ensino básico, "que devem estar abertas pelo menos até às 17.30h e no mínimo oito horas diárias, com vista ao desenvolvimento de actividades de enriquecimento curricular", vai provocar em muitas IPSS uma crise de repercussões ainda imprevisíveis
Para ajudar as IPSS a perceberem as implicações que, por enquanto, apenas se adivinham, o Solidariedade tem vindo a publicar publicar textos, trabalhos, reflexões, casos e entrevistas. Hoje a vez é da Ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues.

SOLIDARIEDADE - A entrada em vigor do despacho n.º 16 795/2005 vem alterar o horário de funcionamento dos estabelecimentos de educação pré-escolar e 1.º ciclo, cobrindo um período até agora preenchido pelas IPSS através da prestação da valência de ATL, de acordo com o Estado.
A alteração do quadro legal foi feita tendo em conta o papel que as IPSS desempenharam até agora?
MARIA DE LURDES RODRIGUES
- Antes de mais, quero dizer que apesar do esforço e do trabalho feito no terreno pelas IPSS e demais entidades que prestam o serviço de ATL, que assumiram um papel de cobertura de muitas crianças em substituição da escola, na realidade, apenas 25% das crianças do 1.º ciclo tinham acesso a esta valência. Muitas crianças carenciadas não têm ainda acesso a estas actividades.
O objectivo da medida que tomámos é o de garantir que, no espaço da escola, todos os alunos tenham acesso gratuito a um conjunto de recursos escolares e culturais, curriculares ou extra-curriculares. Necessitamos de uma escola pública instituída como efectiva plataforma de igualdade de oportunidades, acessível a todas as crianças e adaptada aos desafios das sociedades modernas.
Precisamos agora de enquadrar o trabalho realizado por muitas autarquias, associações de pais e IPSS no projecto educativo das escolas. É este esforço de articulação e parceria que temos de fomentar e promover se queremos proporcionar às nossas crianças as melhores condições de ensino e aprendizagem e às famílias o apoio que de necessitam.

SOLIDARIEDADE - É intenção do governo manter com as IPSS os acordos de cooperação em vigor para a valência de ATL até finais de 2006. Não é um período de transição demasiado curto? Que tipo de soluções poderá haver depois, designadamente para as IPSS que estruturaram o modelo de funcionamento na prestação dessa valência?
MARIA DE LURDES RODRIGUES
- Para assegurar a tranquilidade da transição, os ministérios do Trabalho e da Solidariedade Social e da Educação, criaram um grupo de trabalho constituído por elementos dos dois ministérios mas também por representantes da CNIS, da CONFAP, da ANMP da UMP e da União das Mutualidades, no sentido de, até ao final do presente ano lectivo, definirem um novo modelo de articulação entre as instituições que prestam a valência de ATL e os conselhos executivos dos agrupamentos de escolas e elaborar um modelo de protocolo de colaboração.
É minha convicção que o caminho para essa nova forma de articulação se fará recentrando a relação que as IPSS estabelecem actualmente directamente com as famílias para uma nova relação que assente num contacto mais directo com as escolas.
As escolas devem garantir a universalidade no acesso e assegurar que nenhum aluno fique excluído desta valência.
O Ministério da Educação, através das direcções regionais de educação, fez chegar orientações às escolas para que articulem com IPSS e demais entidades, integrando os recursos humanos de que disponham nos formatos existentes.

SOLIDARIEDADE - De que forma está a ser considerada a gestão de uma crise previsível, com dispensa de pessoal, redução de actividade e até encerramento de estabelecimentos no sector das IPSS por causa desta alteração?
MARIA DE LURDES RODRIGUES
- Não me parece que se possa falar em crise. O alargamento do horário de funcionamento das escolas vem aumentar as possibilidades de mais crianças terem acesso a actividades extra-curriculares.
Como é certamente do vosso conhecimento o Governo, através do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, comprometeu-se, a manter com as IPSS, os termos dos acordos de cooperação actualmente em vigor para a valência de ATL até ao final do ano de 2006.
Significa isto que temos um ano para, trabalhando em conjunto, encontrar soluções que permitam adaptar os ATL existentes à nova realidade.

SOLIDARIEDADE - Parece haver uma intenção do governo de transformar a escola no pólo exclusivo da educação e ensino. Os equipamentos escolares estão preparados para terem as crianças lá tanto tempo por dia? Terão os professores competência e disponibilidade para serem animadores de tempos livres?
MARIA DE LURDES RODRIGUES
- Para muitas crianças, aliás, para a maior parte delas, a escola é já, de facto, o pólo exclusivo de educação e ensino.
São crianças para quem, fora da escola não há acesso a recursos educativos e a recursos escolares. Como disse atrás, 75% das crianças do 1.º ciclo não têm acesso a ATL.
O objectivo é criar nas escolas públicas um espaço de educação, ensino e aprendizagem mais alargado e de melhor qualidade.
Não é aceitável, nos dias de hoje, uma escola reduzida ao mínimo, que feche às 15h e se desresponsabilize pelo que se passa com os alunos depois dessa hora.
É às escolas e aos seus órgãos executivos que cabe o papel de pugnar por uma escola a tempo inteiro, universal e gratuita, bem como a responsabilidade pela orientação pedagógica das actividades extra-curriculares que devem ser enquadradas no projecto educativo de cada agrupamento/escola.
Como já disse, todos os recursos que existem, quer humanos quer materiais, que tenham condições e possam ser mobilizados para este projecto, devem sê-lo desde que devidamente enquadrados nos projectos educativos das escolas, sob a sua orientação pedagógica.

SOLIDARIEDADE - Durante as férias escolares a quem ficam confiadas as crianças? À escola? À família? Às IPSS?
MARIA DE LURDES RODRIGUES
- Não existem soluções únicas para essa questão. Não existiam antes nem existem agora. Como sabe, as necessidades das famílias e as disponibilidades das escolas, das IPSS, e outras entidades que promovem ATL. são diversificadas e requerem também, como até aqui, soluções diversificadas.
A concretização da ideia de escola a tempo inteiro passa pelo respeito por soluções de implementação diversificadas e adaptáveis às realidades locais.
A resolução desta questão, como de outras que eventualmente surjam, será certamente uma prioridade para o grupo de trabalho já constituído.

SOLIDARIEDADE - A questão do financiamento total para os estabelecimentos escolares no apoio às actividades extracurriculares. Passar-se-á o mesmo com as IPSS ou terá que ser a família a suportar as despesas?
MARIA DE LURDES RODRIGUES
- O despacho referido pressupõe que, pelo menos até às 17.30h e no mínimo durante oito horas diárias, as actividades lectivas dos alunos, curriculares e não curriculares, sejam gratuitas em todas as escolas que não se enquadrem nas excepções fixadas no mesmo despacho.
Pode haver lugar à comparticipação das famílias em actividades extra-curriculares realizadas no espaço da escola, em parceria com entidades como IPSS, autarquias e associações de pais ou garantidas exclusivamente pelos agrupamentos de escolas e isso deve ser equacionado em cada caso em que tal se justifique.
É também uma das tarefas do grupo de trabalho criado reflectir e propor soluções nessa matéria.

 

Data de introdução: 2005-11-28



















editorial

TRABALHO DIGNO E SALÁRIO JUSTO

O trabalho humano é o centro da questão social. Este assunto é inesgotável… (por Jorge Teixeira da Cunha)  

Não há inqueritos válidos.

opinião

EUGÉNIO FONSECA

IPSS OU EMPRESAS SOCIAIS: uma reflexão que urge fazer
No atual cenário europeu, o conceito de empresa social tem vindo a ganhar relevância, impulsionado por uma crescente preocupação com a sustentabilidade e o impacto social.

opinião

PAULO PEDROSO, SOCIÓLOGO, EX-MINISTRO DO TRABALHO E SOLIDARIEDADE

A inatingível igualdade de género
A Presidente da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE) foi à Assembleia da República no dia 3 de outubro com uma má novidade. A Lusa noticiou[1] que...