PADRE LINO MAIA - PRESIDENTE DA CNIS

CNIS não será força de bloqueio nem mandatária do governo

Esta é a primeira grande entrevista com o presidente da CNIS eleito no II Congresso, realizado em 27 e 28 de Janeiro, em Fátima. O Padre Lino Maia tem 58 anos, integrava o Conselho Directivo Nacional, sendo presidente da UDIPSS-Porto desde a fundação, em Abril de 2002. É ainda Presidente do Secretariado Diocesano de Pastoral Social e Caritativa do Porto e Capelão do Hospital (psiquiátrico) Magalhães Lemos. É pároco de Aldoar, freguesia da cidade Invicta e antes esteve em S. Romão de Coronado, Covelas e no Seminário do Bom Pastor onde foi superior.
No rescaldo do Congresso o padre Lino Maia traça ao Solidariedade as orientações estratégicas para três anos de mandato.

SOLIDARIEDADE - Padre Lino Maia, acabou de vencer um Congresso da CNIS que, até há bem pouco tempo, nem sequer pensava disputar. Já tem a noção da missão difícil que vai protagonizar?
PADRE LINO MAIA -
É difícil mas é um desafio muito interessante. Eu acredito vivamente na CNIS, sobretudo nos dirigentes das IPSS. Temos dirigentes com uma capacidade fabulosa, que acreditam, querem e sabem implementar respostas sociais. Por isso, estou confiante porque a equipa é muito boa, é gente que construiu a CNIS, são o seu suporte, são a sua memória. Acredito nesta equipa, acredito na CNIS, acredito que vamos conseguir fazer coisas muito interessantes. 

SOLIDARIEDADE - O congresso acabou por ser a confirmação de uma divisão no seio do anterior Conselho Directivo Nacional. O Padre Lino Maia liderou uma lista institucional e a lista de "oposição", por assim dizer, era liderada pelo presidente da CNIS. Uma situação muito confusa para as IPSS. Considera haver condições para ultrapassar essa cisão?
PADRE LINO MAIA -
Há condições e tem que ser ultrapassada. É um desafio para mim e para a equipa da qual faço parte. Não nos vamos apresentar como triunfadores. Na CNIS não há dirigentes vencidos; tem que haver é situações vencidas: a exclusão, os desafios sem resposta, isso é que tem que ser ultrapassado. Nós acreditamos que é possível dar as mãos. Mas temos que dar as mãos a pessoas e espero, de todos os que faziam parte da outra lista, abertura, amizade e compreensão. Comigo, a relação de vencedores para vencidos nunca existirá. Somos companheiros de jornada. 

SOLIDARIEDADE - Como costuma dizer-se, quer ser o presidente de todas as IPSS…
PADRE LINO MAIA -
Queria que todas as IPSS se revissem nesta equipa de que faço parte. Não haverá qualquer atitude de revanchismo, de superioridade. Seremos uma equipa de todas as instituições, de todos os desafios, para todos os momentos, bons e difíceis, que temos pela frente. 

SOLIDARIEDADE - É um mandato de três anos. Quais são as linhas orientadoras e os grandes projectos que pretende pôr em prática?
PADRE LINO MAIA -
Há quatro ideias-força que eu gostaria que estivessem presentes na nossa actuação. Primeiro, penso que é muito importante que o público conheça melhor este sector e quem se dedica a este sector social, os dirigentes e as respostas. Queria também que houvesse uma aposta clara na melhoria da qualidade das respostas sociais; quero ainda que haja um melhor enquadramento legal, nós não somos legisladores, mas temos um grande contributo a dar. E queremos melhorar a relação entre o governo e as instituições não lucrativas, fazendo com que haja um ambiente de parceria, cooperação e nunca de subserviência. Depois há necessidade de fazer uma revisão estatutária e vamos começar já a fazê-la. Precisamos de abrir janelas à inovação. Precisamos e vamos criar um centro de estudos sociais, um observatório social, um instituto para qualidade e formação. Queremos dar maior consistência aos princípios de proximidade e subsidariedade no Estado solidário. Queremos que todas as instituições se revejam na CNIS e, por isso, mandaremos sinais no sentido de todas as IPSS se filiarem nas Uniões Distritais e, através delas, na CNIS. Vamos apostar na presença na comunicação social e, nesse sentido, vamos procurar ser sempre causa de boa notícia neste país. 

SOLIDARIEDADE - Ter uma presença no debate das grandes temáticas nacionais?
PADRE LINO MAIA -
Por isso é que vamos criar o centro de estudos sociais. Queremos marcar o debate, o pensamento, o estudo e a reflexão nesta área da solidariedade social. Vejo a CNIS na componente de representação das IPSS, isso mantém-se e até vai ser aprofundado, mas queremos que a CNIS seja uma espécie de movimento social. Temos que acompanhar e antecipar as respostas às novas problemáticas sociais. Não podemos apenas reagir, mas temos que liderar todo o processo. 

SOLIDARIEDADE - Há uma série de dossiês que herda da anterior direcção, muitos deles dizendo respeito a negociações com o Governo. Vai respeitar os compromissos assumidos e dar sequência a esses processos?
PADRE LINO MAIA -
Sem qualquer tipo de crítica, eu penso que nos últimos meses da CNIS houve aquilo a que eu chamei, algumas vezes, uma espécie de "agitação paralisante". Havia muita movimentação mas algo precipitada. Nós temos que rever alguns dossiês, concretamente o Contrato Colectivo de Trabalho. Julgo que foi assinado um pouco à pressa. Não vamos dizer que tudo o que foi feito foi mau. É provável que tenha sido bem feito, pelo menos foi feito com boa vontade. Agora há uma equipa nova e nós temos que responder por aquilo que vai ser implementado. Nós vamos assumir os dossiês, vamos estudá-los e vamos dar os nossos passos. 

SOLIDARIEDADE - No relacionamento com o governo haverá mudança de atitude?
PADRE LINO MAIA -
Há claramente um bom ambiente. Eu tenho a certeza absoluta de que vai haver muito boa relação. Constatei isso nos encontros que tive, quer com o Ministro do Trabalho e Solidariedade quer com a Ministra da Educação, e da nossa parte será feito todo o esforço para haver uma boa relação. Não seremos nem força de bloqueio ou oposição nem mandatários do governo. Seremos parceiros, dialogantes, cooperantes porque, no fundo, com missões bem definidas, o que queremos é o bem do povo português. 

SOLIDARIEDADE - Tem havido algumas abordagens quanto à reconceptualização de algumas temáticas sociais que podem ter repercussões nas formas de financiamento…
PADRE LINO MAIA -
Eu estou reticente quanto a algumas coisas que tenho ouvido. Já o fiz sentir e continuarei a bater-me por outras filosofias de intervenção. Por exemplo, não estou muito disponível para apoiar uma política nesta área que ponha em situação de igualdade empresas lucrativas e sector não-lucrativo. Já o disse a quem de direito que não vejo o Ministério da Solidariedade Social como o ministério das actividades económicas. Penso também que não é bom que este sector esteja dependente de jogos de fortuna e azar. É preciso que o Estado seja solidário, não um Estado providência nem um Estado liberal e, por isso, temos de privilegiar as pessoas ou as instituições que, desafiadas pelos problemas, implementam respostas, sem fins lucrativos, mas apenas movidas por um exercício da cidadania, da proximidade, da vontade de ver este país com mais inclusão e menos exclusão. 

SOLIDARIEDADE - Há algumas temáticas sociais que vão ser prioritárias na sua intervenção?
PADRE LINO MAIA -
Há duas áreas. Foi feito um diagnóstico sobre a situação social económica e cultural das freguesias do país e esse é um instrumento muito importante para a definição do mapa de respostas. Em muitas situações as IPSS podem ser uma espécie de agências locais de desenvolvimento social, apostando no apoio à família, na inclusão social das várias freguesias. A outra área em que temos de apostar é em respostas de apoio à terceira idade. É a população mais fragilizada e a população portuguesa apresenta índices de envelhecimento preocupantes. Nós temos que, com o governo ou o governo connosco, ajudar a resolver o problema. 

SOLIDARIEDADE - E com os sindicatos, algo vai mudar?
PADRE LINO MAIA -
Vamos privilegiar o diálogo e tenho a certeza de que nos vamos entender muito bem. Tenho a colaboração, no centro de estudos sociais que vamos criar, de destacados dirigentes sindicais e eu próprio tenho mantido contacto com alguns sindicatos. Eles têm a função de defender os trabalhadores e nós também. Os nossos trabalhadores fazem coisas fabulosas nas instituições. O êxito das IPSS não está apenas nos dirigentes, mas também na qualidade dos trabalhadores que, por vezes com remunerações inferiores fazem trabalhos superiores, em tempo, dedicação e qualidade. Nós temos dificuldades financeiras, sabemos de que é que vivemos, as fontes de financiamento são conhecidas e os acordos são públicos e sabemos que não podemos pagar aos trabalhadores o que gostaríamos, mas vamos procurar apostar na convergência salarial e equacionar outras condições que teremos presentes na nossa actuação. 

SOLIDARIEDADE - Uma outra referência na acção social é a Igreja. Recordo até que no Congresso chegou a haver alusões ao apoio de bispos. O facto de ser padre favorece a ligação institucional com a Igreja?
PADRE LINO MAIA -
De facto, uma boa parte das IPSS são de erecção canónica ou de inspiração cristã. Houve uma lista que procurou reivindicar o apoio dos bispos portugueses e eu penso que não o deveria ter feito. A Conferência Episcopal não apoiou nenhuma lista. Evidentemente que haveria bispos que tinham opções e, nessa contabilidade, eu nem sequer ficaria a perder. Permita-me até que, com alguma graça, lhe diga que houve um momento no Congresso em que eu cheguei a pensar que o grande apoio da outra lista era o Papa, tantas vezes foi citado. A CNIS não deve reivindicar apoios da Igreja, deve colaborar com ela. Tenho a certeza absoluta que a Conferência Episcopal vai sentir orgulho na actuação da CNIS no futuro. 

SOLIDARIEDADE - E com as IPSS haverá alterações de actuação por parte da CNIS?
PADRE LINO MAIA -
O meu figurino da CNIS poderia levar a uma opção de privilegiar a relação com as estruturas intermédias. Dos contactos, e foram muitos, que fiz por esse país fora, percebi algo que para mim já era uma intuição clara: A CNIS não pode distanciar-se das instituições de base, antes pelo contrário. Eu ouvi muitas queixas das IPSS, de que nada lhes era informado. Nós vamos manter um contacto muito próximo com as instituições. Não ficarei satisfeito se, durante os três anos, não percorrer, com toda a equipa, pelo menos duas vezes o território nacional, juntando-
-me com as instituições de base, para as ouvir e para as sensibilizar, para com elas encontrar novos caminhos. Falamos muito de proximidade que é a grande virtude que ressalta da nossa actuação. Temos que a praticar com as nossas associadas, não podemos ser apenas uma estrutura de cúpula. 

SOLIDARIEDADE - O diálogo com os restantes interlocutores sociais, as Mutualidades e as Misericórdias, é para estimular?
PADRE LINO MAIA -
Não podemos precipitar-nos. Há uma história e há passados a respeitar. Imagino que no futuro vamos ter uma confederação na qual todas as uniões se vão sentir bem. As uniões de IPPS, distritais, federações, uniões de Misericórdias e uniões das Mutualidades. Mas não podemos precipitar os acontecimentos. Neste momento o que importa é o diálogo, concertar acções, debater desafios, caminhos a percorrer e depois se verá. 

SOLIDARIEDADE - Quanto ao seu problema caseiro: vai deixar de ser Presidente da União Distrital do Porto das IPSS…
PADRE LINO MAIA -
Serão as instituições a resolver. Eu não gosto de nomear herdeiros. No Porto há muitas instituições com uma vida intensa. Estou convencido que vai surgir uma equipa muito boa, que se vai dedicar com o mesmo entusiasmo, com a mesma capacidade, num contexto histórico diferente. Estou confiante no êxito da equipa que vai surgir no dia 11 de Março.

 

Data de introdução: 2006-02-26



















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