Romper o ciclo da pobreza (a pobreza dos pais não pode ser causa da pobreza dos filhos)

Já há muito que todos nos apercebemos que os sistemas económicos e sociais vigentes não vão erradicar a pobreza nem a fome devido ao seu funcionamento cada vez mais desregulado e agravado pela globalização dos negócios e por isso mesmo, centrado cada vez mais na competição entre as empresas em vez de se caminhar para um sistema económico mais colaborativo e centrado no desenvolvimento da sociedade no mundo e por isso direccionado para atingir os objectivos do milénio cujo primeiro objectivo é a erradicação da pobreza e da fome.
Por outro lado, individualmente, embora conscientes da situação de pobreza e de fome, caímos no pensamento fácil de que, alguém devia estar a fazer alguma coisa para resolver esta tragédia, alguém que tem o poder e os meios para o fazer e que nós próprios pouco ou nada podemos ajudar.

Um bom início para que todos nós comecemos por fazer alguma coisa é conhecermos os Objectivos das Nações Unidas para o Desenvolvimento do Milénio que foram estabelecidos na cimeira da ONU em Setembro de 2000 e aprovados pelos 191 países membros contendo metas concretas que deviam ser avaliadas em 2015. De forma resumida indico em seguida esses objectivos:

Objectivo 1: Erradicar a fome e pobreza extremas;
- Reduzir à metade a proporção de pessoas que vivem com menos de um dólar por dia;
- Reduzir à metade a proporção de pessoas que passam fome;

Objectivo 2: Alcançar a educação primária universal;
- Assegurar que todas as crianças completem uma escolaridade primária; plena

Objectivo 3: Promover a igualdade de género e conceder poder às mulheres.
- Eliminar a disparidade de género na educação primária e secundária preferencialmente em 2005, e a todos os níveis em 2015;

Objectivo 4: Reduzir a mortalidade infantil;
- Reduzir em dois terços a taxa de mortalidade infantil entre crianças com menos de cinco anos;

Objectivo 5: Melhorar a saúde maternal;
- Reduzir em três quartos o rácio da mortalidade maternal;

Objectivo 6: Combater a SIDA, malária e outras doenças;
- Travar e começar a reverter a disseminação da SIDA;
- Travar e começar a reverter a incidência da malária e outras doenças importantes;

Objectivo 7: Assegurar sustentabilidade ambiental;
- Integrar os princípios de desenvolvimento sustentável em políticas nacionais e programas; inverter a perda de recursos ambientais;
- Reduzir à metade a proporção de pessoas sem acesso sustentável à água potável;
- Alcançar melhoramentos significativos nas vidas de pelo menos 100 milhões de moradores em favelas, em 2020;

Objectivo 8: Desenvolver uma parceria global com países em desenvolvimento,
- Desenvolver e implementar estratégias para trabalho decente e produtivo para a juventude;
- Desenvolver ainda um comércio livre e um sistema financeiro que tenha regras previsíveis e não-discriminatórias, inclui um compromisso para boa governação, desenvolvimento e redução da pobreza – nacional e internacionalmente;
- Nomear as necessidades especiais dos países menos desenvolvidos. Isto inclui tarifas e acesso livre de quotas para as suas exportações; o aumento do alívio da dívida dos países pobres mais endividados; o cancelamento da dívida oficial bilateral; e assistência oficial ao desenvolvimento mais generosa para países comprometidos na redução da pobreza;
- Nomear as necessidades especiais dos países do interior e dos pequenos estados em desenvolvimento insulares;
- Negociar de forma abrangente com os problemas de dívida dos países em desenvolvimento através de medidas nacionais e internacionais para tornar a dívida sustentável a longo prazo;
- Em cooperação com os países em desenvolvimento, desenvolver trabalho decente e produtivo para os jovens;
- Em cooperação com as companhias farmacêuticas, providenciar acesso a medicamentos essenciais baratos nos países em desenvolvimento;
- Em cooperação com o sector privado, disponibilizar os benefícios das novas tecnologias – mormente tecnologias de informação e comunicação;


De facto, perante tais objectivos tão claros, mas ao mesmo tempo tão complexos de atingir, o primeiro pensamento que nos ocorre é que, como indivíduo, nada posso fazer e que cabe aos governos dos países ricos implementarem as acções concretas que conduzam a que aqueles objectivos sejam atingidos, mas a sociedade civil organizada tem responsabilidades e o dever de pugnar para chamar à atenção e exigir que seja envolvida nesta tarefa hercúlea de todos. Principalmente os portugueses, cujo grau de associação é o mais baixo da Europa, em que segundo as estatísticas do Eurostat (2004) apenas 27 em 100, ao contrário dos países nórdicos 80 em 100, participam em organizações da sociedade civil.

Focando-me apenas no Objectivo 1) Erradicar a Fome e a Pobreza Extremas, no caso português 22% da população vive no limiar de pobreza, e referindo-me apenas à infância e juventude, que se vê mergulhada no ambiente de pobreza tendo por causa principal a herança de pobreza dos pais, pergunto: como vamos romper o ciclo da pobreza ?

Todos conhecem o trabalho meritório das nossas instituições de solidariedade que, com o apoio do Estado e a ajuda de milhares de voluntários, vai tentando minimizar o flagelo da pobreza e a fome, mas também ao mesmo tempo, damos conta de que não há avanço, pois as desigualdades continuam a acentuar-se muito mais rapidamente nos tempos que correm, devido à exigência de maiores qualificações técnicas necessárias para conseguir um emprego decente, pois grande parte dos empregos exigem a chamada literacia tecnológica, cujo acesso está totalmente vedado aos pobres por falta de programas específicos e vontade política.
A sociedade tem de ser capaz de romper o seu ciclo gerador, que se inicia por evitar que a nova geração entre nesse ciclo, a começar pela infância, a partir da idade do apoio pré-escolar e seguindo pela instrução primária e até ao fim do ensino secundário.

Como fazer, então ?
A resposta é um plano de acção ao nível da freguesia e de cada concelho, cujo objectivo seria apenas um:. “Todos tem de obrigatoriamente de ter acesso e frequentar o ensino pré-escolar, primário e secundário”.
Estou a referir alguma coisa de transcendente ? Obviamente que não, trata-se apenas e só de vontade em estabelecer e cumprir um único objectivo.

“ Uma parceria envolvendo as Instituições de solidariedade, a Segurança Social, as Câmaras Municipais e o Ministério da Educação é a resposta. Mas, não se trata de ser apenas mais uma parceria, existem tantas que não funcionam, mas sim um projecto com acompanhamento e avaliação independente e permanente Um projecto deste tipo só pode ter sucesso se for aplicado ao nível de freguesia e concelho. É necessário que um Presidente de Câmara, um Presidente de Junta de Freguesia, um Director do Serviço de Segurança Social do concelho, um Presidente ou um Provedor de uma Instituição de Solidariedade, um Presidente do Concelho Directivo das Escolas do Concelho e Organizações de sociedade civil interessadas (ONG), assumam a sua responsabilidade directa, isto é, que o assunto é seu e que só a eles cabe a resposta e a solução adequada.

O projecto tem de ser conduzido com uma mentalidade e serviço diferente do dito ‘funcionalismo público’ por razões também conhecidas de todos.


A sociedade civil organizada, que exclui as organizações partidárias, deve assumir a tarefa de pugnar por este direito e participar no planeamento, implementação e avaliação deste processo.

* Economista. Presidente do Conselho Fiscal do Centro Social Paroquial de Azambuja

 

Data de introdução: 2007-01-07



















editorial

VIVÊNCIAS DA SEXUALIDADE, AFETOS E RELAÇÕES DE INTIMIDADE (O caso das pessoas com deficiência apoiadas pelas IPSS)

Como todas as outras, a pessoa com deficiência deve poder aceder, querendo, a uma expressão e vivência da sexualidade que contribua para a sua saúde física e psicológica e para o seu sentido de realização pessoal. A CNIS...

Não há inqueritos válidos.

opinião

EUGÉNIO FONSECA

Que as IPSS celebrem a sério o Natal
Já as avenidas e ruas das nossas cidades, vilas e aldeias se adornaram com lâmpadas de várias cores que desenham figuras alusivas à época natalícia, tornando as...

opinião

PAULO PEDROSO, SOCIÓLOGO, EX-MINISTRO DO TRABALHO E SOLIDARIEDADE

Adolf Ratzka, a poliomielite e a vida independente
Os mais novos não conhecerão, e por isso não temerão, a poliomelite, mas os da minha geração conhecem-na. Tivemos vizinhos, conhecidos e amigos que viveram toda a...