A Coordenação Nacional das Capelanias Hospitalares considera inaceitável a última proposta de regulamentação da assistência espiritual e religiosa hospitalar, apresentada pelo Ministério da Saúde. No passado mês, a Coordenação esteve reunida em Fátima para analisar as dificuldades surgidas e as críticas ao documento ganharam dimensão nacional.
O coordenador nacional das capelanias hospitalares, padre José Nuno Ferreira da Silva, explica que, por várias razões, a segunda proposta do governo não é aceitável: “Antes de mais, é a negação pura e simples do Princípio da Cooperação entre o Estado e as Igrejas, consagrado quer na Concordata, quer na Lei da Liberdade Religiosa. Depois, facilita o acesso de todas as religiões e «realidades afins» aos Hospitais, mas não integra os agentes, nem nas Instituições, nem nas Equipas de Saúde. Depois, exclui por completo a dimensão espiritual e religiosa do conceito e da prática de Cuidados de Saúde. Depois, fere princípios tão essenciais como o da intocabilidade da relação médico-doente. Em suma, vulnerabiliza a situação dos mais vulneráveis.”
Na reunião, em que participou também o presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social, D. José Alves, e o coordenador nacional da Pastoral da Saúde, monsenhor Vítor Feytor Pinho, os capelães católicos analisaram as consequências que resultariam para os doentes e para as instituições de saúde se a proposta ministerial fosse aprovada na sua redacção actual.
Entretanto, o porta-voz da Conferência Episcopal Portuguesa, D. Carlos Azevedo, criticou o governo por esta proposta de regulamento da assistência religiosa e espiritual nos hospitais, considerando-a também "inaceitável" para o trabalho dos capelães hospitalares. A Igreja Católica critica o facto de o novo diploma obrigar a que a assistência tenha de ser pedida pelos doentes por escrito e assinada, uma situação que em muitos casos é difícil de obter devido aos seus problemas de saúde.
A Conferência Episcopal contesta também que o Ministério da Saúde queira proibir os médicos de recomendar assistência religiosa e espiritual aos doentes que manifestem sinais de precisar dela, alegadamente por isso poder ser considerado proselitismo ou favorecimento de um credo em particular.
O padre José Nuno nega que esteja em curso um conflito entre a Igreja e o Estado. “Senti-me, isso sim, a defender o próprio Serviço Nacional de Saúde de si próprio, isto é, daquela minoria que dentro dele, a partir de uma antropologia redutora, de um falseado conceito de Pessoa Humana, concebe e quer impor cuidados de saúde desumanizados e que ferem a pessoa no mais sagrado dos seus direitos: o direito de liberdade de consciência, religiosa e de culto. Senti-me muito particularmente a defender os direitos dos mais débeis e vulneráveis, o direito dos doentes, qualquer que seja o seu credo ou opção espiritual, a encontrar no SNS interlocutores no domínio da religião e da espiritualidade, competentes, credenciados e nos quais possam reconhecer-se e encontrar companheiros para a difícil viagem que é a doença.”
Reunida em Fátima em 26 de Setembro de 2007, na sua reunião ordinária de início de ano pastoral, a Coordenação Nacional das Capelanias Hospitalares manifestou a surpresa pela segunda formulação do regulamento de assistência espiritual e religiosa apresentada pelo Ministério da Saúde, que não tem em conta “a generalidade das insuficiências diagnosticadas pelo PNS nem considera as orientações estratégicas que o mesmo documento preconiza”.
O documento não tem em consideração a experiência hospitalar; não integra nas instituições nem nas equipas de saúde os agentes dos diversos credos, apesar de permitir o acesso; retira faculdades à Igreja Católica e pode estar ferido de inconstitucionalidade por falta de respeito jurídico à Concordata e à Lei de Liberdade Religiosa.
As reclamações já chegaram aos ouvidos do Primeiro-Ministro José Sócrates que deverá ter um papel decisivo para a resolução deste diferendo. Nos hospitais e na opinião pública cresce um sentimento de solidariedade face à posição dos capelães. O padre José Nuno, coordenador nacional das capelanias hospitalares sente-se reconfortado com as manifestações de apoio: “Foi altamente consolador para nós, Capelães e Assistentes Espirituais Hospitalares: de norte a sul do país uma onda de solidariedade dentro dos hospitais abateu-se sobre nós. Desde Conselhos de Administração que se prontificaram para tudo fazer para defender os seus Serviços Religiosos, até doentes e profissionais que se propuseram para encabeçar movimentações de protesto e desencadear abaixo-assinados, até ao modo como a própria Comunicação Social reagiu à situação.
Percebemos que os portugueses nos querem, o que é altamente responsabilizante para nós. Aconteça o que acontecer, nada ficará como dantes. Evoluiremos para melhor.”
A regulamentação da assistência espiritual e religiosa nos hospitais é uma determinação da Lei da Liberdade Religiosa, aprovada em 2001, que consagra que "a liberdade de consciência, de religião e de culto é inviolável e garantida a todos".
Data de introdução: 2007-10-11