Talvez ainda mais conhecido pela sua designação inicial de “Rendimento Mínimo Garantido”, o RSI (Rendimento Social de Inserção) é um importante mecanismo de combate à pobreza. O seu principal objectivo é assegurar aos cidadãos e aos respectivos agregados familiares alguns recursos que contribuam para a satisfação das suas necessidades mínimas e, paralelamente, favorecer a progressiva inserção social, laboral e comunitária.
O tema foi largamente abordado na última campanha eleitoral (e antes dela): Andarão os trabalhadores a ganhar para os preguiçosos? Serão os verdadeiros necessitados que estão a beneficiar do RSI? Estará ele a desincentivar a opção pelo trabalho e a favorecer o vício?
São algumas das dúvidas que ficaram a pairar no ar. Com razão?
Sendo discutíveis algumas das formas na sua abordagem, foi oportuno trazer o tema para debate público, porque é um assunto que a todos interessa. Sobremaneira, a todos quantos se dedicam às causas da solidariedade social. E, sem qualquer dúvida, há metas por estabelecer e caminhos por andar.
2. Segundo as actuais disposições, podem requerer o RSI as famílias e os indivíduos em situação de grave carência económica, cujo rendimento seja inferior a 100% do valor da Pensão Social (actualmente, 187,18 €). O valor médio atribuído a cada família é de 242 euros por mês (cerca de 89 euros por beneficiário). Presentemente, estão a beneficiar do RSI 3,7% da população portuguesa (cerca de 386.000). Entre estes, há mais de 38 mil pessoas que, mesmo tendo rendimentos de trabalho, precisam daquele benefício, que, não sendo manifestamente suficiente para viver, se tornará forçosamente necessário para subsistir.
Desde 1996, ano em que foi criado, o número de beneficiários do RSI tem vindo a crescer sistematicamente. O aumento poderá encontrar alguma justificação na gradativa consciencialização de direitos sociais e no trabalho de proximidade de, entre outros, Autarquias e Instituições de Solidariedade.
Mas não só.
E o debate sobre este benefício impõe-se porque, apesar deste e de outros apoios, a pobreza persiste e parece que está a alargar-se.
Estarão os apoios, como o RSI, a ser eficazes?
Nas vésperas do “Ano Europeu de Combate à Pobreza e Exclusão Social” (AECPS - 2010) não deixará de ser oportuno reflectir sobre a questão e apostar em medidas que alterem uma situação que carece de mais atenção e de maior determinação.
3. São plurais as causas da pobreza e múltiplas as suas manifestações. Muitas vezes, ela é um estigma que se herda e a única coisa que se lega às gerações vindouras, qual desgraça endémica com expressão perpétua.
O RSI não será um instrumento eficaz para eliminar as causas da pobreza, mas é um meio importante para atenuar os seus efeitos. E se em alguns casos, menos, terá de ser benefício que se perpetue (situações de deficiência ou idade avançada, por exemplo), tendencialmente deverá ser um instrumento temporário usado para a promoção da autonomia das pessoas.
Tal implica que a sua atribuição seja acompanhada de outras medidas e jamais abruptamente cancelada.
Num recente relatório de execução do RSI, referia-se que foram realizadas em Portugal quase quinhentas mil acções de inserção dos beneficiários. Em média, mais do que uma acção por pessoa, sobretudo nas áreas da acção social e saúde (a vacinação de crianças ou o seu acompanhamento nos centros de saúde são exemplos de acções que cabem neste domínio). Aparentemente, muitas e todas necessárias. Porém, a formação profissional, representou apenas 3% das acções realizadas.
O acompanhamento dos beneficiários é indispensável e, desde os seus primórdios, as Instituições Particulares de Solidariedade Social estão a dedicar-lhe especial atenção: como sempre na frente da proximidade e na linha do serviço, nada menos que 217 IPSS vêm acompanhando muitos deles.
Tudo muito importante, sem dúvida. Porém o acompanhamento e as acções de inserção têm-se revelado insuficientes, porquanto muitos beneficiários precisam de um apoio muito prolongado, quase personalizado. Também carecem de outros estímulos e medidas. Se um acto faz uma vida e num “ai” ela se perde, a educação é todo um processo ao longo de toda a vida, processo muito mais imperioso e profundo quando a herança foi fosca e difíceis os seus primeiros tempos. Associações Empresariais, Autarquias, Instituições de Solidariedade e Microcrédito, quando aliados, poderão desempenhar um papel fundamental.
De algumas certezas, contudo, não podemos abstrair: instrumentos, como o RSI, são importantes mas apenas poderão ter alguma eficácia quando forem associados à determinação de combater as causas da pobreza e as suas manifestações, tarefa de que nem o Estado nem a comunidade se poderão alhear. A dependência é a aliada preferencial da pobreza e o seu antídoto é a autonomia. E esta, a autonomia, é um caminho de promoção humana que se percorre melhor quando se é seduzido por afectos, atractivos e envolvimentos. Mais eficazmente do que assistido por benefícios, por muita bondade que eles tenham.
Lino Maia, Presidente da CNIS
Data de introdução: 2009-12-04