A CNIS, representada pelo presidente Lino Maia e pelo Presidente-adjunto e Presidente da Caritas, Eugénio Fonseca, esteve num encontro com Bento XVI. Foi no encontro com as organizações da pastoral social, realizado no dia 13 de Maio, na Igreja da Santíssima Trindade, em Fátima. O Solidariedade partilha com os leitores a emoção e o significado que Lino Maia e Eugénio Fonseca atribuem a esse distinto contacto com o Papa.
Lino Maia, Presidente da CNIS:
Muito embora a CNIS não seja uma organização da Igreja Católica, desde os seus alvores, nela estão filiadas muitas Instituições da Igreja (cerca de 41%). A congregação de todas e a comunhão entre todas as Instituições, da Igreja e laicas, numa organização que a todas representa e a todas apoia dá mais força à solidariedade e dá mais solidariedade à força. Da harmoniosa “convivência” todas saem a lucrar.
Foi o reconhecimento disso mesmo que fez com que a organização da Visita do Santo Padre a Portugal convidasse a CNIS, na pessoa do seu presidente, a ser umas das 15 pessoas a cumprimentar Bento XVI na tarde do dia 13 de Maio, no final do encontro com as Organizações da Pastoral Social.
Depois da Senhora Ministra da Saúde e do Presidente da Cáritas, lá subi eu os degraus ao encontro do Papa e diante de uma multidão de mais de 7.000 pessoas de organizações da Pastoral Social.
Enquanto subia, pensava no reconhecimento da CNIS e na responsabilidade de uma organização como a CNIS.
Sentia-me confuso.
E mais confuso fiquei quando, na apresentação de D. Carlos Azevedo, ele confidenciou ao Santo Padre que eu era o tal Padre que presidia a uma organização com cerca de 3.000 Instituições filiadas, muitas das quais eram da Igreja Católica. O Santo Padre deu sinais afectuosos e disse palavras de um misto de gratidão, apreço e de encorajamento. E eu senti que aquela gratidão, aquele apreço e aquele encorajamento, carregados de visível afecto, se destinavam a todos quantos fazem da solidariedade causa e construção de uma vida feliz. Crentes e não crentes.
Eugénio Fonseca, Presidente da Caritas:
Na sua primeira viagem apostólica a Portugal Bento XVI fez questão de se encontrar com as organizações da Pastoral Social. Nunca tal tinha acontecido, nas visitas de Paulo VI e João Paulo II. Com esta decisão, o Papa quis reafirmar a centralidade da caridade na razão de ser da Igreja, traduzida numa acção social devidamente organizada.
A prática da solidariedade não se esgota nas iniciativas da Igreja Católica. O Santo Padre reconheceu isso e demonstrou interesse que estivessem também, neste encontro, organizações não eclesiais. A participação destas organizações deu um significado maior a esta iniciativa e demonstrou a importância que Bento XVI atribui ao partenariado, tendo, no discurso que proferiu, afirmado que [as instituições da Igreja, unidas a todas as organizações não eclesiais, melhorem as suas capacidades de conhecimento e orientações para uma nova e grandiosa dinâmica que conduza para aquela civilização do amor, cuja semente Deus colocou em todo o povo e cultura] (Caritas in veritate,33).
Os cerca de 7.000 participantes vieram de todo o país e irmanaram-se, em franca convivialidade, para estar com o Papa. Fizeram-no em ambiente de festa, indicando, assim, como vivem, no quotidiano, a «prática da compaixão». É que ser solidário não é um fardo, mas dar largas ao «coração de bom samaritano» que deve habitar em cada promotor/a social. À medida que se aproximava a hora do Chefe da Igreja Católica chegar, a alegria ia crescendo, impulsionada pela apresentação das organizações presentes e pela melodia do grupo musical “Figo Maduro”. Penso que a presença deste grupo não acontece por acaso. Trata-se de uma família que se coloca, através dos dotes que possui, ao serviço dos outros. Como o mundo seria diferente se todas as famílias fizessem o mesmo. Como esta, que encontrou na solidariedade, pela música, a forma de enfrentar dificuldades e tornar-se mais coesa, ganhariam as famílias e, pelo menos, os seus vizinhos.
Quando os sinos da Basílica de Fátima davam contam que eram cinco horas da tarde, o Papa surgiu na porta principal da igreja da Santíssima Trindade. Nas ombreiras de uma porta magnificente aparece uma figura, aparentemente muito frágil, vestida de alvura. A grandeza do templo e o som estridente das vozes que, em uníssono, saúdam o ilustre visitante, reforçam ainda mais essa fragilidade, parecendo mesmo que o vão esmagar. Por vezes, a solidariedade também parece ser assim: muito frágil perante a grandiosidade e complexidade dos problemas do mundo. O Papa reconhece isso ao dirigir-se aos presentes, em particular aos pertencentes às organizações católicas mas que se poderá aplicar a todas as outras, ao afirmar: «Cientes, como Igreja, de não poderdes dar soluções práticas a todos os problemas concretos, mas despojados de qualquer tipo de poder, determinados ao serviço do bem comum, estais prontos a ajudar e a oferecer os meios de salvação a todos».
Num meio de um ambiente multicolor e num contexto de acção social, o surgimento de alguém vestido de branco suscitou a ideia de como deve ser linear e transparente a prática dos e das que se dedicam a não tornar a solidariedade e a justiça palavras vãs. Identidade e autonomia foram dois requisitos apontados por Bento XVI para que a Igreja exerça, convenientemente, a sua acção social. São duas orientações que devem aplicar-se também a outras organizações de solidariedade social. Disse, na ocasião, o Papa: «Importa que seja clara a sua orientação de modo a assumirem uma identidade bem patente: na inspiração dos seus objectivos, na escolha dos seus recursos humanos, nos métodos de actuação, na qualidade dos seus serviços, na gestão seria e eficaz dos meios. A firmeza da identidade das instituições e um serviço real, com grandes vantagens para os que dele beneficiam. Passo fundamental, além da identidade e unido a ela, é conceder à actividade caritativa cristã autonomia e independência da política e das ideologias (cf. Bento XVI, Enc. Deus caritas est, 31 b), ainda que em cooperação com organismos do Estado para atingir fins
comuns».
Fui um dos que teve o privilégio, no fim do encontro, de cumprimentar o Papa. Fi-lo como representante da Cáritas. A fazê-lo, em nome da CNIS esteve - e bem - o seu presidente. Foi um momento particular. Senti a responsabilidade da missão que a Igreja me está a confiar. Ser cristão católico não acrescenta privilégios à minha condição de cidadão, mas qualifica-a e dá-lhe maiores exigências. Agradeci ao Papa o contributo que tem dado, nomeadamente através da publicação das suas Cartas Encíclicas, para que os católicos possam dar o contributo para que o Reino no Amor e da Justiça se instale, desde já. Neste mundo, como prenúncio da sua plenitude que nos está garantida pela vitória de Cristo sobre a morte.
Oxalá, que este encontro com o Bento XVI não se fique pelo agradável convívio que tivemos a oportunidade de viver, mas nos impulsione a criar na da sociedade em que vivemos uma dinâmica de ser-com-os-outros e para os outros, ou seja, converter as nossas vidas «em amor entregue gratuita e generosamente, através da justiça e da caridade, para vivermos com um coração de bom samaritano».
O desafio está lançado. Estará ao alcance dos que ousarem acreditar que um outro mundo é possível.
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