Com o título
Estado devolveu 85,7 milhões em IVA à Igreja Católica entre 2005-09, o Público noticiou na sexta-feira, 18/03/11, que um deputado socialista afirmou “que actual sistema é para fugir às regras da UE e defende fim do beneficio fiscal, trocando-o por donativo no IRS”.
Quem só leu as letras gordas, e a afirmação do deputado, com chamada na última página, fica com a ideia da Igreja estar a explorar o Estado por benefícios menos legítimos, através de um esquema para ludibriar a UE.
No texto verificava-se que estes milhões se referem maioritariamente a devolução de IVA pago por mais de um milhar de instituições sem fins lucrativos ligados á Igreja Católica, como são as Misericórdias e os Centros Sociais e Paroquiais.
As IPSS, Instituições Privadas de Solidariedade Social, sem fins lucrativos, sejam ou não ligadas à Igreja, realizam imensos investimentos em equipamentos sociais (creches, infantários, lares para crianças, jovens, deficientes, doentes, idosos, centros de dia….) destinados a responder a múltiplas carências da população.
Durante as construções as IPSS têm de pagar IVA e, no final, como acontece com qualquer empresa do sector lucrativo, têm direito à devolução dentro de certos limites.
Há uma ideia errada, instalada em muitos responsáveis deficientemente informados, que as IPSS estão isentas de pagamento de IVA. Não é verdade. As IPSS pagam sempre o IVA.
O que acontece é que há serviços sociais onde os clientes estão isentos de pagamento.
As pessoas pagam IVA em quase tudo o que adquirem, ao abastecer o automóvel, no restaurante ou no cinema, incluindo a compra de géneros alimentares essenciais… Nos serviços sociais prestados pelas IPSS, sejam laicas ou ligadas à Igreja, as pessoas estão isentas do pagamento de IVA.
Numa qualquer empresa com fins lucrativos, que vende produtos ou serviços taxados com IVA, os seus clientes pagam o imposto e a empresa limita-se a entregar o imposto ao Estado.
As empresas não são simples tesourarias ao serviço do Estado pois beneficiam de um esquema de acerto de contas entre o IVA que recebem dos clientes e o IVA que pagam nas suas compras.
É este acerto de contas que tem permitido fraudes, como na Operação Furacão, envolvendo grandes empresas “respeitáveis”. Algumas empresas recorrem a métodos fraudulentos, através de vários processos como a facturação falsa, inexistente, para irem sacar (roubar) ilegitimamente milhões aos cofres do Estado.
As empresas quando fazem uma qualquer despesa só aparentemente pagam IVA como as pessoas individuais; aparentemente porque descontam este pagamento no IVA que cobram aos clientes.
As empresas só entregam ao Estado a diferença entre o IVA que cobram aos clientes e o IVA que pagam aos fornecedores. Quando pagam mais IVA do que recebem, o Estado devolve-lhes o diferencial.
De facto, as empresas lucrativas dos diversos sectores, sujeitos a IVA, estão isentas de pagamento de imposto ao contrário das IPSS que pagam IVA.
Por seu turno, as organizações sem fins lucrativos, cujos serviços não estão taxados com IVA, não só pagam IVA com não têm direito a devolução pelo Estado nas suas despesas correntes.
As IPSS acabam por este facto por ser grandes contribuintes líquidos.
Que não se queira, com notícias fabricadas, que distorcem a realidade, limitar o direito de as pessoas consignarem parte do seu IRS a instituições de solidariedade social, como parece ser a vontade do deputado socialista.
Estão isentas de IRC porque visam fins de interesse público e não distribuem dividendos. Os seus saldos não são distribuídos pelos sócios nem são incorporados em contas particulares sendo investidos na melhoria dos seus fins sociais.
Embora isentas de IRC as IPSS, pertencendo à orbita de qualquer Igreja ou sendo laicas, pagam mais impostos que as empresas com fins lucrativos devido ao facto de serem consumidores finais no IVA, sem direito a devolução do imposto pago nas despesas correntes, absolutamente necessárias à realização dos seus fins sociais.
As empresas lucrativas só pagam IRS nos lucros, a diferença entre a receita e as despesas. As IPSS pagam imposto, IVA, no total da despesa que realizam, valor muito superior ao eventual IRS.
Para o mesmo volume de serviços prestados as IPSS podem pagar muito mais impostos que as empresas lucrativas, incluindo a banca.
A Igreja e as IPSS, não só não beneficiam de nenhum esquema para fugir às obrigações fiscais, como são contribuintes líquidos sujeitos a uma carga fiscal superior à que onera o sector privado com fins lucrativos.
Jaime Ramos
Presidente da Fundação ADFP, Miranda do Corvo
Data de introdução: 2011-04-07